Publicidade
Publicidade
21/11/2001
-
08h07
STEPHEN CECCHETI
Especial para o "Financial Times''
As taxas de juros dos Estados Unidos estão agora em seu patamar mais baixo em 40 anos. Depois de 10 reduções em igual número de meses, a taxa do Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano) para os juros caiu de 6% a 2%.
Com a inflação de preços ao consumidor acima dos 2%, a taxa real de juros provavelmente está abaixo de zero.
Esses cortes de juros sem precedentes, no entanto, fracassaram em conter o declínio acentuado nos investimentos, sugerindo para alguns que a política monetária de certa forma perdeu eficiência. De fato, número crescente de analistas traça paralelos entre o Japão dos anos 80 e os Estados Unidos durante a Grande Depressão.
Karl Marx escreveu que a história se repete, primeiro como tragédia e depois como farsa. O cataclismo mundial dos anos 30 foi evidentemente uma tragédia, e a experiência japonesa dos anos 90 contém elementos de farsa. Mas será que os Estados Unidos estão à beira da deflação? Não acredito.
Não deveria surpreender que o corte na taxa de juros tenha causado impacto direto relativamente modesto nos empréstimos às empresas. Afinal, as decisões de investimento jamais foram muito sensíveis aos juros de curto prazo.
O sistema financeiro dos Estados Unidos é forte e o fato de que o Fed sabe que sua tarefa é mantê-lo assim é exatamente o motivo para que os temores quanto a uma deflação sejam equivocados.
As taxas de juros de curto prazo baixas funcionam como um subsídio aos bancos, oferecendo segurança contra exatamente o tipo de colapso visto no Japão e na era da Grande Depressão.
Garantia de liquidez
Nos anos 30, o Fed simplesmente não compreendia a importância de garantir a liquidez do sistema financeiro e seguia uma política que terminou por conduzir a severas quedas de preços.
A deflação causou inadimplência e falências bancárias, as quais reduziram o volume de dinheiro circulando na economia, o que agravava ainda mais a deflação.
E quanto à experiência mais recente do Japão? Nesse caso, a história envolve o sistema financeiro, e os bancos ocupam o centro da cena. Ao longo dos últimos 15 anos, aproximadamente, eles sustentaram imensos prejuízos com seus empréstimos, o que causou a insolvência de muitos deles.
Como descreveram Takeo Hoshi e Anil Kashyap, a desregulamentação do mercado de bônus permitiu que os clientes empresariais dos bancos encontrassem financiamento mais barato em outros lugares.
Isso forçou os bancos a encontrar novas linhas de negócios, entre as quais mais empréstimos imobiliários especulativos. Tudo isso começou no pior momento possível, no pico da bolha no preço dos imóveis japoneses. Acrescente-se a isso empréstimos a empresas em países asiáticos emergentes e o fato de que os bancos adquiriram ações no pico das Bolsas japonesas.
Depois de uma série de revezes calamitosos nos anos 90 -a crise asiática, o colapso do mercado imobiliário e das Bolsas de Valores-, muitos bancos japoneses perderam tudo. Quase todas as instituições financeiras japonesas têm solvência questionável.
Diante desse panorama, o Banco do Japão vem tentando tudo o que pode para solucionar uma situação desesperada. Por volta de 1995, ele havia reduzido a taxa de juros a 0,5%, e elas caíram a zero em 1998. Mas, mesmo assim, a deflação quis dizer que as taxas reais de juros de curto prazo se mantiveram positivas no Japão.
Há uma imensa controvérsia quanto ao que fazer a esse respeito, e todas as soluções propostas parecem difíceis. Sabemos uma coisa ao certo: até que a intermediação financeira retorne, virtualmente nada pode ajudar.
Tudo isso sugere que a semelhança entre o passado e o presente é mais aparente do que real. Diferentemente do que aconteceu durante a Grande Depressão ou no Japão moderno, o sistema financeiro norte-americano é forte já há algumas décadas. Os preços de alguns produtos estão caindo, o que leva as empresas que os vendem a alegar deflação. Entretanto esse ingrediente crucial para uma catástrofe está ausente.
Bancos saudáveis
Três coisas conspiraram para criar um sistema bancário saudável: supervisão e regulamentação mais fortes, uma década de crescimento econômico, e inovações que cresceram mercados secundários para a maior parte dos ativos bancários. Como resultado, os bancos dos Estados Unidos estão protegidos por níveis elevados de capitalização e níveis de risco relativamente baixos.
O mais importante é que os dirigentes do banco central estão sintonizados com o seu papel na prevenção de crises financeiras. Entre outras coisas, isso significa garantir que os bancos e os mercados tenham liquidez suficiente para continuar operando.
Uma taxa de juros negativa em termos reais torna muito barato a obtenção de fundos pelos bancos, e age como obstáculo natural à tendência dos executivos de cortar operações quando a situação se complica.
Os EUA certamente atravessarão um ou dois anos de dificuldades. Mas desde que seu sistema financeiro se mantenha saudável, o perigo de que siga os passos japoneses rumo à deflação e à depressão vai se manter distante.
Leia mais:
Conheça as armas usadas no ataque
Saiba tudo sobre os ataques ao Afeganistão
Entenda o que é o Taleban
Saiba mais sobre o Paquistão
Veja os reflexos da guerra na economia
Análise: Estados Unidos não passarão por uma deflação
Publicidade
Especial para o "Financial Times''
As taxas de juros dos Estados Unidos estão agora em seu patamar mais baixo em 40 anos. Depois de 10 reduções em igual número de meses, a taxa do Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano) para os juros caiu de 6% a 2%.
Com a inflação de preços ao consumidor acima dos 2%, a taxa real de juros provavelmente está abaixo de zero.
Esses cortes de juros sem precedentes, no entanto, fracassaram em conter o declínio acentuado nos investimentos, sugerindo para alguns que a política monetária de certa forma perdeu eficiência. De fato, número crescente de analistas traça paralelos entre o Japão dos anos 80 e os Estados Unidos durante a Grande Depressão.
Karl Marx escreveu que a história se repete, primeiro como tragédia e depois como farsa. O cataclismo mundial dos anos 30 foi evidentemente uma tragédia, e a experiência japonesa dos anos 90 contém elementos de farsa. Mas será que os Estados Unidos estão à beira da deflação? Não acredito.
Não deveria surpreender que o corte na taxa de juros tenha causado impacto direto relativamente modesto nos empréstimos às empresas. Afinal, as decisões de investimento jamais foram muito sensíveis aos juros de curto prazo.
O sistema financeiro dos Estados Unidos é forte e o fato de que o Fed sabe que sua tarefa é mantê-lo assim é exatamente o motivo para que os temores quanto a uma deflação sejam equivocados.
As taxas de juros de curto prazo baixas funcionam como um subsídio aos bancos, oferecendo segurança contra exatamente o tipo de colapso visto no Japão e na era da Grande Depressão.
Garantia de liquidez
Nos anos 30, o Fed simplesmente não compreendia a importância de garantir a liquidez do sistema financeiro e seguia uma política que terminou por conduzir a severas quedas de preços.
A deflação causou inadimplência e falências bancárias, as quais reduziram o volume de dinheiro circulando na economia, o que agravava ainda mais a deflação.
E quanto à experiência mais recente do Japão? Nesse caso, a história envolve o sistema financeiro, e os bancos ocupam o centro da cena. Ao longo dos últimos 15 anos, aproximadamente, eles sustentaram imensos prejuízos com seus empréstimos, o que causou a insolvência de muitos deles.
Como descreveram Takeo Hoshi e Anil Kashyap, a desregulamentação do mercado de bônus permitiu que os clientes empresariais dos bancos encontrassem financiamento mais barato em outros lugares.
Isso forçou os bancos a encontrar novas linhas de negócios, entre as quais mais empréstimos imobiliários especulativos. Tudo isso começou no pior momento possível, no pico da bolha no preço dos imóveis japoneses. Acrescente-se a isso empréstimos a empresas em países asiáticos emergentes e o fato de que os bancos adquiriram ações no pico das Bolsas japonesas.
Depois de uma série de revezes calamitosos nos anos 90 -a crise asiática, o colapso do mercado imobiliário e das Bolsas de Valores-, muitos bancos japoneses perderam tudo. Quase todas as instituições financeiras japonesas têm solvência questionável.
Diante desse panorama, o Banco do Japão vem tentando tudo o que pode para solucionar uma situação desesperada. Por volta de 1995, ele havia reduzido a taxa de juros a 0,5%, e elas caíram a zero em 1998. Mas, mesmo assim, a deflação quis dizer que as taxas reais de juros de curto prazo se mantiveram positivas no Japão.
Há uma imensa controvérsia quanto ao que fazer a esse respeito, e todas as soluções propostas parecem difíceis. Sabemos uma coisa ao certo: até que a intermediação financeira retorne, virtualmente nada pode ajudar.
Tudo isso sugere que a semelhança entre o passado e o presente é mais aparente do que real. Diferentemente do que aconteceu durante a Grande Depressão ou no Japão moderno, o sistema financeiro norte-americano é forte já há algumas décadas. Os preços de alguns produtos estão caindo, o que leva as empresas que os vendem a alegar deflação. Entretanto esse ingrediente crucial para uma catástrofe está ausente.
Bancos saudáveis
Três coisas conspiraram para criar um sistema bancário saudável: supervisão e regulamentação mais fortes, uma década de crescimento econômico, e inovações que cresceram mercados secundários para a maior parte dos ativos bancários. Como resultado, os bancos dos Estados Unidos estão protegidos por níveis elevados de capitalização e níveis de risco relativamente baixos.
O mais importante é que os dirigentes do banco central estão sintonizados com o seu papel na prevenção de crises financeiras. Entre outras coisas, isso significa garantir que os bancos e os mercados tenham liquidez suficiente para continuar operando.
Uma taxa de juros negativa em termos reais torna muito barato a obtenção de fundos pelos bancos, e age como obstáculo natural à tendência dos executivos de cortar operações quando a situação se complica.
Os EUA certamente atravessarão um ou dois anos de dificuldades. Mas desde que seu sistema financeiro se mantenha saudável, o perigo de que siga os passos japoneses rumo à deflação e à depressão vai se manter distante.
Leia mais:
Publicidade
As Últimas que Você não Leu
Publicidade
+ LidasÍndice
- Ministério Público pede bloqueio de R$ 3,8 bi de dono de frigorífico JBS
- Por que empresa proíbe caminhões de virar à esquerda - e economiza milhões
- Megarricos buscam refúgio na Nova Zelândia contra colapso capitalista
- Com 12 suítes e 5 bares, casa mais cara à venda nos EUA custa US$ 250 mi
- Produção industrial só cresceu no Pará em 2016, diz IBGE
+ Comentadas
- Programa vai reduzir tempo gasto para pagar impostos, diz Meirelles
- Ministério Público pede bloqueio de R$ 3,8 bi de dono de frigorífico JBS
+ EnviadasÍndice