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27/08/2004
-
06h09
CÍNTIA CARDOSO
da Folha de S.Paulo
Autoproclamada uma antieconomista, a americana Hazel Henderson defende uma reformulação no cálculo do PIB (Produto Interno Bruto) das economias mundiais.
Segundo a ativista e consultora em desenvolvimento social, a "economia do amor" deveria ser um dos pilares das fórmulas das contas nacionais. O termo utilizado por Henderson trata da movimentação econômica decorrente do trabalho não-remunerado, como o feito por voluntários, donas-de-casa e práticas de "escambo" entre produtores rurais. Longe de ter apenas um caráter humanitário, Henderson afirma que, se contabilizadas, essas atividades gerariam uma renda mundial de US$ 16 trilhões por ano.
Com mais de dez passagens pelo Brasil, a americana defende ainda a criação de um modelo para a tributação do mercado de câmbio internacional. Esses recursos, diz, poderiam ser utilizados para promover o desenvolvimento dos países pobres.
Henderson veio ao Brasil para participar de evento organizado pela Câmara Americana de Comércio de São Paulo. A seguir, a entrevista concedida à Folha.
Folha - Ao longo da sua carreira, a senhora tem defendido a "economia do amor" como um elemento importante para a composição do PIB dos países. Qual é exatamente a definição desse conceito?
Hazel Henderson - A "economia do amor" leva em conta atividades realizadas na vizinhança, na vida comunitária, como cuidar dos idosos e das crianças no ambiente familiar, por exemplo. São atividades vitais, mas que não são remuneradas e tampouco entram no cálculo das contas nacionais. É daí, porém, que virão as novas fontes de emprego. Infelizmente, poucos já têm consciência dessa mudança. Acredito também que estamos no fim da era do dinheiro. Hoje, podemos fazer negócios puramente baseados em informação. A informação é a moeda mundial mais valiosa.
Folha - O que está errado nas fórmulas de cálculo do PIB?
Henderson - Elas são muito baseadas na "economia do dinheiro", que visa a competição. Na minha proposta, são doze os indicadores que devem ser levados em consideração: infra-estrutura, renda, direitos humanos, saúde, ambiente, energia, emprego, educação, habitação, lazer, segurança pública e segurança nacional.
Folha - No caso do Brasil todos esses indicadores poderiam ser aplicados?
Henderson - Cada país tem diferentes aspirações e objetivos, mas acredito que sim. Especialmente na questão de segurança nacional, o Brasil tem um grande capital. Um exemplo é a política de comércio exterior. Fiquei muito impressionada com a liderança do Brasil entre os países em desenvolvimento. A liderança que o Brasil exerce é que chamamos de "liderança suave", que é uma liderança baseada na capacidade de influenciar e na moral.
Folha - Mas como fazer essa nova visão de economia ingressar no pensamento central?
Henderson - Já há um grande debate entre os economistas sobre como contabilizar a "economia do amor". Uma idéia é trazer toda essa economia informal para dentro da economia formal. Outra corrente diz que a "economia do amor" deveria ser reconhecida e honrada, mas nem tudo deveria ser contabilizado e remunerado. Por exemplo, mães que cuidam dos seus filhos, provavelmente, não devem querer ser remuneradas por isso, mas isso poderia ser feito de outra forma. As donas-de-casa poderiam ter algum tipo de auxílio-aposentadoria. A outra corrente diz que os valores da "economia do amor" não devem ser estragados por valores capitalistas e devem apenas ser monitorados. O debate está aberto.
Folha - Qual corrente a senhora defende?
Henderson - Não acho que a "economia do amor" deva ser incluída no cálculo do PIB neste momento. Primeiro, a forma de calcular o PIB no mundo tem de ser revista. Seria melhor que os governos se preocupassem, por enquanto, em conhecer o formato e a dimensão da "economia do amor" nos seus países: as horas trabalhadas, o tipo de serviço prestado. A "economia do amor" deveria ser documentada, mas não necessariamente se fundir com a economia [tradicional] nesse estágio em que estamos.
Folha - Além da "economia do amor", que estratégias o Brasil poderia adotar para impulsionar a economia?
Henderson - O Brasil está redefinindo como o comércio mundial será conduzido. A forma criativa como o ministro [Celso] Amorim tem agido na OMC [Organização Mundial do Comércio] é surpreendente. Antes da formação do G20, os países pobres estavam descrentes com o sistema da organização. Mas, ao criar o grupo, o Brasil mostrou a esses países que é possível jogar --e ganhar-- com as regras da OMC. Mas é importante também ter em mente que o foco do comércio mundial vai mudar dos bens materiais para os serviços. O Brasil, especialmente com "tecnologias verdes" tem grandes chances nesse nicho. Se todas as riquezas naturais, o patrimônio cultural, a criatividade musical do Brasil fossem mensuradas, o PIB do Brasil teria uma dimensão muito maior.
Especial
Leia o que já foi publicado sobre o PIB (Produto Interno Bruto)
Americana quer "economia do amor" no PIB
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da Folha de S.Paulo
Autoproclamada uma antieconomista, a americana Hazel Henderson defende uma reformulação no cálculo do PIB (Produto Interno Bruto) das economias mundiais.
Segundo a ativista e consultora em desenvolvimento social, a "economia do amor" deveria ser um dos pilares das fórmulas das contas nacionais. O termo utilizado por Henderson trata da movimentação econômica decorrente do trabalho não-remunerado, como o feito por voluntários, donas-de-casa e práticas de "escambo" entre produtores rurais. Longe de ter apenas um caráter humanitário, Henderson afirma que, se contabilizadas, essas atividades gerariam uma renda mundial de US$ 16 trilhões por ano.
Com mais de dez passagens pelo Brasil, a americana defende ainda a criação de um modelo para a tributação do mercado de câmbio internacional. Esses recursos, diz, poderiam ser utilizados para promover o desenvolvimento dos países pobres.
Henderson veio ao Brasil para participar de evento organizado pela Câmara Americana de Comércio de São Paulo. A seguir, a entrevista concedida à Folha.
Folha - Ao longo da sua carreira, a senhora tem defendido a "economia do amor" como um elemento importante para a composição do PIB dos países. Qual é exatamente a definição desse conceito?
Hazel Henderson - A "economia do amor" leva em conta atividades realizadas na vizinhança, na vida comunitária, como cuidar dos idosos e das crianças no ambiente familiar, por exemplo. São atividades vitais, mas que não são remuneradas e tampouco entram no cálculo das contas nacionais. É daí, porém, que virão as novas fontes de emprego. Infelizmente, poucos já têm consciência dessa mudança. Acredito também que estamos no fim da era do dinheiro. Hoje, podemos fazer negócios puramente baseados em informação. A informação é a moeda mundial mais valiosa.
Folha - O que está errado nas fórmulas de cálculo do PIB?
Henderson - Elas são muito baseadas na "economia do dinheiro", que visa a competição. Na minha proposta, são doze os indicadores que devem ser levados em consideração: infra-estrutura, renda, direitos humanos, saúde, ambiente, energia, emprego, educação, habitação, lazer, segurança pública e segurança nacional.
Folha - No caso do Brasil todos esses indicadores poderiam ser aplicados?
Henderson - Cada país tem diferentes aspirações e objetivos, mas acredito que sim. Especialmente na questão de segurança nacional, o Brasil tem um grande capital. Um exemplo é a política de comércio exterior. Fiquei muito impressionada com a liderança do Brasil entre os países em desenvolvimento. A liderança que o Brasil exerce é que chamamos de "liderança suave", que é uma liderança baseada na capacidade de influenciar e na moral.
Folha - Mas como fazer essa nova visão de economia ingressar no pensamento central?
Henderson - Já há um grande debate entre os economistas sobre como contabilizar a "economia do amor". Uma idéia é trazer toda essa economia informal para dentro da economia formal. Outra corrente diz que a "economia do amor" deveria ser reconhecida e honrada, mas nem tudo deveria ser contabilizado e remunerado. Por exemplo, mães que cuidam dos seus filhos, provavelmente, não devem querer ser remuneradas por isso, mas isso poderia ser feito de outra forma. As donas-de-casa poderiam ter algum tipo de auxílio-aposentadoria. A outra corrente diz que os valores da "economia do amor" não devem ser estragados por valores capitalistas e devem apenas ser monitorados. O debate está aberto.
Folha - Qual corrente a senhora defende?
Henderson - Não acho que a "economia do amor" deva ser incluída no cálculo do PIB neste momento. Primeiro, a forma de calcular o PIB no mundo tem de ser revista. Seria melhor que os governos se preocupassem, por enquanto, em conhecer o formato e a dimensão da "economia do amor" nos seus países: as horas trabalhadas, o tipo de serviço prestado. A "economia do amor" deveria ser documentada, mas não necessariamente se fundir com a economia [tradicional] nesse estágio em que estamos.
Folha - Além da "economia do amor", que estratégias o Brasil poderia adotar para impulsionar a economia?
Henderson - O Brasil está redefinindo como o comércio mundial será conduzido. A forma criativa como o ministro [Celso] Amorim tem agido na OMC [Organização Mundial do Comércio] é surpreendente. Antes da formação do G20, os países pobres estavam descrentes com o sistema da organização. Mas, ao criar o grupo, o Brasil mostrou a esses países que é possível jogar --e ganhar-- com as regras da OMC. Mas é importante também ter em mente que o foco do comércio mundial vai mudar dos bens materiais para os serviços. O Brasil, especialmente com "tecnologias verdes" tem grandes chances nesse nicho. Se todas as riquezas naturais, o patrimônio cultural, a criatividade musical do Brasil fossem mensuradas, o PIB do Brasil teria uma dimensão muito maior.
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