Modificações físicas unem
clubbers e índios
RODRIGO
DIONISIO
da Folha Online
France
Presse - 21.jan.00
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Devotos
do hinduísmo caminham com ganchos fincados nas costas em direção
a templo nas cavernas Batu, perto de Kuala Lumpur (Malásia),
durante o festival de Thaipusam |
É difícil
precisar um início para as práticas tribais que originaram o body
piercing. Há descobertas científicas que apontam o uso de apetrechos
perfurando a pele há mais de 2.000 anos e em regiões diferentes do
planeta. Entretanto, do passado remoto à modernidade, é possível ligar
esse tipo de alteração física à necessidade de identificação com um
grupo determinado.
Entenda-se por grupo não uma reunião específica de pessoas, mas um
conjunto de indivíduos que, se conhecendo ou não, expressam uma filosofia
diante da vida. Ou seja, dos índios do alto Xingu aos clubbers paulistanos,
todos pertencem a uma mesma "tribo" que usa modificações físicas e
enfeites no corpo para demonstrar diferenças perante o grosso da sociedade
ou outros grupos.
Uma tribo de piercing
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Shannon
Larratt, 24, editor e criador do site BME (Body Modification
E-zine) durante operação para colocar um implante
de metal em sua cabeça |
No caso
do piercing, a ligação com culturas antigas é mais destacada. Em primeiro
lugar, pode-se citar o uso da dor (as jóias são colocadas sem anestesia)
como ritual de passagem e demonstração de coragem e força. Com a banalização
de certas técnicas, vão surgindo outras cada vez mais complexas (e
dolorosas) de expressão, como fazer desenhos na pele por meio de queimaduras
(branding) ou cortes (cutting). Mas mesmo esse aumento da dor é algo
percebido de maneira positiva, por ser considerado como uma "dor que
faz sentido", tem um objetivo prático.
Na tribo brasileira dos wãiana, por exemplo, a passagem da adolescência
para a vida adulta é marcada por um ritual no qual uma espinha de
peixe é esfregada sobre a pele, provocando cortes profundos (portanto
dor) e marcas que serão carregadas pelo resto da vida. Esse processo
só é suportado e aceito pelo indivíduo por carregar um significado
profundo e real para os integrantes da tribo. O mesmo raciocínio pode
ser diretamente aplicado aos adeptos do piercing.
A
busca da pureza
France
Presse - 12.nov.99
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Participante
do Festival Vegetariano, na Tailândia |
Por outro
lado, seguir práticas primitivas (apesar de toda a evolução dos materiais
e técnicas utilizadas) traz um toque romantizado, denota a busca pela
pureza e espontaneidade de culturas ancestrais.
Dificilmente um adolescente urbano está pensando nos guerreiros de
uma tribo masai e seus rituais quando resolve colocar um alargador
na orelha. Mas muito provavelmente liga a sua atitude a uma idéia
geral dessas manifestações, presentes em culturas anteriores à (e
muitas vezes dizimadas pela) sociedade atual, na qual ele vive e da
qual quer ser diferente.
Obviamente existem exceções, de um lado e do outro. Muita gente faz
piercing por achar bonito e ponto, outros pretendem reconstituir de
forma consciente métodos e práticas culturais específicas e muitas
vezes extintas. Mas novamente os dois grupos se reúnem ao utilizarem
como forma de construção de suas identidades um processo de diferenciação
e controle de corpo voluntário e irreversível (pelo menos no momento
em que a modificação é feita).
Fonte:
Mirela Berger, mestre em antropologia social pela USP (Universidade
de São Paulo) e professora de antropologia e sociologia na Unisa (Universidade
de Santo Amaro)
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