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Petróleo é fator-chave na crise iraquiana

PAULO DANIEL FARAH
da Folha de S.Paulo

No momento em que Washington busca uma resolução no Congresso para uma ação militar contra o Iraque, e o Conselho de Segurança da ONU debate uma estrutura jurídica para fiscalizar os arsenais de Bagdá, diversas empresas petrolíferas preparam-se para defender seus interesses.

O Iraque possui a segunda maior reserva de petróleo do planeta (além das áreas inexploradas por causa de anos de conflitos): são 112,5 bilhões de barris, que representam 11% do total mundial. No primeiro semestre deste ano, os EUA importaram em média 10,3 milhões de barris de petróleo por dia, segundo o Conselho de Defesa dos Recursos Naturais. Quase 1 milhão saiu do Iraque.

O presidente George W. Bush e seu vice, Dick Cheney, ambos com fortes laços com o lobby energético, compreendem que o aumento do consumo nos EUA, aliado a uma queda na produção interna, torna o país cada vez mais dependente da importação de petróleo.

Levando em conta que a Arábia Saudita é o principal fornecedor dos EUA e que as relações bilaterais enfrentam uma crise que se agravou com os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001, fica evidente que o petróleo é um fator-chave na crise com Bagdá, que explora o tema amplamente.

Na última quinta, o Iraque disse que o objetivo de uma eventual ação militar americana é o petróleo. Em mensagem lida pelo chanceler Naji Sabri, o ditador Saddam Hussein disse que "os EUA querem destruir o Iraque para controlar o petróleo do Oriente Médio e, por consequência, as políticas econômicas e do petróleo em todo o mundo".

Analistas consultados pela Folha divergem sobre o grau de influência do petróleo na determinação em derrubar Saddam.

"Esse não é o objetivo primordial dos EUA. Fala-se muito na preocupação com as armas de destruição em massa, mas isso é instrumental. O principal é derrubar Saddam Hussein, sobretudo por uma questão pessoal. O governo sabe, porém, que o regime iraquiano está sentado sobre enormes reservas, e o interesse em seu potencial é claro", afirma Ruhi Ramazani, professor de relações internacionais na Universidade de Virgínia, especialista em geopolítica do petróleo e autor de 11 livros sobre o assunto.

Já na opinião do analista político egípcio Ahmad Abd al Halim, "Bush privilegia problemas energéticos em detrimento de soluções políticas". Ele afirma que "a Lei de Política Energética norte-americana permite a desobstrução até militar de rotas de transporte e de acessos aos campos de produção petrolífera".

Washington também tem claro que, com o eventual fim das sanções econômicas impostas após a invasão do Kuait, em 1990, e das zonas de exclusão aérea ao norte e ao sul do país, sem uma mudança de regime em Bagdá, as empresas norte-americanas seriam preteridas na exploração petrolífera.

Do outro lado, a oposição iraquiana promete beneficiar os aliados. "Vamos rever todos os acordos", diz Faissal Qarahuli, especialista em engenharia de petróleo e diretor do escritório europeu do Congresso Nacional Iraquiano (CNI), que reúne grupos oposicionistas apoiados pelos EUA.

Ahmed Chalabi, líder do CNI, vai além e cogita a criação de um consórcio liderado pelos EUA para desenvolver os campos.

O uso do petróleo como argamassa para construir uma coalizão é defendido por James Woolsey, ex-diretor da CIA. "Sejamos diretos. A França e a Rússia [que se mostraram reticentes sobre um eventual ataque" têm empresas de petróleo e interesses no Iraque. Devem saber que, se contribuírem para que o Iraque disponha de um governo decente, vamos fazer o possível para garantir que o novo governo e as empresas americanas trabalhem em conjunto com elas', disse Woolsey ao diário "The Washington Post".

"Por outro lado, se mantiverem o apoio a Saddam, será impossível persuadir o novo regime a trabalhar com elas", afirmou.

A cogitação de uma nova liderança provocou preocupação entre empresas não-americanas.

Desde a Guerra do Golfo (1991), empresas de países como Rússia (Lukoil/Slavneft), França (Total Fina Elf), China (terceiro maior consumidor, depois de EUA e Japão), Índia, Itália, Vietnã e Argélia já firmaram ou buscam acordos para desenvolver os campos iraquianos, restaurar instalações existentes e explorar novas áreas.

Empresas norte-americanas como ExxonMobil e ChevronTexaco sabem que devem ser beneficiadas, mas afirmam evitar o debate em Washington sobre como proceder no Iraque. "Não há por que adotar uma atitude agressiva nesta fase. Haverá tempo no futuro", disse o analista James Lucier, da Prudential Securities.

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