Folha Online 
Esporte

Em cima da hora

Brasil

Mundo

Dinheiro

Cotidiano

Esporte

Ilustrada

Informática

Ciência

Educação

Galeria

Manchetes

Especiais

Erramos

BUSCA


CANAIS

Ambiente

Bate-papo

Blogs

Equilíbrio

Folhainvest em Ação

FolhaNews

Fovest

Horóscopo

Novelas

Pensata

Turismo

SERVIÇOS

Arquivos Folha

Assine Folha

Classificados

Fale com a gente

FolhaShop

Loterias

Sobre o site

Tempo

JORNAIS E REVISTAS

Folha de S.Paulo

Revista da Folha

Guia da Folha

Agora SP

Alô Negócios

Pan-Americano 2003

Entrevistas

Lelé fala da conquista do ouro nas duplas do tênis em 63

Rogério Cassimiro/F. Imagem
RODOLFO LUCENA
Editor de Informática da Folha de S.Paulo

Carlos Alberto Fernandes, o Lelé, talvez seja o mais aventureiro dos brasileiros que conquistaram o ouro no Pan-Americano de 1963. Filho de imigrantes portugueses, já aos 13 anos saiu de casa para dar aulas de tênis.

Viajou pelo mundo, muitas vezes sem dinheiro, seguindo a rota dos torneios, tendo de vencer para conseguir recursos.

No Pan, caiu na semifinal de simples, mas chegou ao ouro nas duplas, com Ronald Barnes (que morreu no final de 2002). Hoje, vive de dar aulas de tênis no clube Paulistano, em São Paulo, onde concedeu esta entrevista em 17 de setembro passado.

Folha: o senhor é mais conhecido, entre os tenistas, como Lelé. Qual a razão do apelido?
Fernandes: Muitos me perguntam e eu não sei responder. Dizem que é por causa de um jogador de futebol, Leleco, que jogava muito bem e era muito conhecido na minha época. Eles achavam que ele era o Lelé do futebol, eu era o Lelé do tênis.

Folha: E o senhor nasceu onde?
Fernandes: Eu nasci em São Paulo em 6 de fevereiro de 1938, filho de pais portugueses.

Folha: O senhor é da primeira geração de sua família nascida no Brasil?
Fernandes: É a primeira geração nascida no Brasil. E o tênis, eu estou aqui no Paulistano desde criança, eu comecei a tomar gosto. Meus irmãos já jogavam.

Folha: O senhor tem quantos irmãos?
Fernandes: Nós éramos em..., eu conheci eu e mais 13.

Folha: Os outros também eram esportistas?
Fernandes: Não, o Maneco, o Maneco foi um dos maiores jogadores do Brasil, um dos maiores jogadores de tênis da América do Sul, meu irmão. O outro também, o Waldemar...

Folha: O Maneco é Manuel?
Fernandes: Manuel Fernandes, o Waldemar também jogava muito bem, o Paulo e eu, os quatro irmãos. De seis, só nós quatro que jogávamos.

Folha: Seis homens e oito mulheres?
Fernandes: Seis homens e oito mulheres.

Folha: Eles que lhe trouxeram para o Clube Paulistano?
Fernandes: Ah, eu frequentava o Paulistano desde cedo, desde criança. Meus pais eram funcionários daqui, me traziam aqui e eu comecei a jogar. Eu até peguei bola um pouquinho até meus 12 anos. Depois, fui para Taubaté, com 13 anos, trabalhar. Fui para lá como professor de tênis.

Folha: Professor de tênis com 13 anos?
Fernandes: É, hoje eu olho: 13 anos, professor de tênis. Na realidade, eu não sabia nada. Hoje tenho muito que aprender, você imagine então com 13 anos. Eu batia bola, era um bom jogador em Taubaté e fiquei lá quase dois anos.

Folha: Lá era um clube?
Fernandes: Sim, o Country Club de Taubaté. Aí eu comecei a participar em campeonatos, e o meu primeiro campeonato foi o Brasileiro juvenil, que eu ganhei.

Folha: Isso quando?
Fernandes: Acho que era 58, por aí... Ganhei e, a partir desse momento, não parei mais. Já não voltei mais para Taubaté e só fiquei participando de campeonatos. Todos esses campeonatos hoje que esses jogadores participam, jogam no profissional, eu fiz exatamente igual ao que eles estão fazendo agora. A diferença é que antes era amador e hoje é profissional.

Folha: Sim, era amador, mas o senhor se sustentava como?
Fernandes: É que tinha, era um amador marrom. Por exemplo, quando eu ia para a Europa, ia representar o Brasil na Copa Davis. Então, a Confederação me dava a passagem. Aí eu jogava a Copa Davis e, depois da Davis, aí eu ficava na Europa e participava dos campeonatos internacionais. Eu era convidado, a maioria dos campeonatos pagava a hospedagem e dava, sei lá, eu cheguei a ganhar na época US$ 75, US$ 150, teve um campeonato que me pagou US$ 150 por semana.

Folha: Longe dos US$ 200 mil, US$ 400 mil do Guga?
Fernandes: Hoje é US$ 1 milhão. Então, era isso que me sustentava, dessa forma e por resultado. Hoje em dia, se você for ranqueado, você pode até jogar mal no campeonato e você será convidado, se você está entre o ranking. Se for, por exemplo, o campeonato de 64 melhores. Se você está nesse ranking de 64, eles são obrigados a te pôr, independente se você tem cara feia ou, sei lá, se eles não gostarem de você. Antes, não, antes você era convidado por mérito. Você tinha que fazer resultado. Se você não jogasse bem, eles não te convidavam. Então, era importante você jogar bem.

Folha: Bom, e o senhor, então, era convidado por causa de seus resultados?
Fernandes: Se você não jogasse bem, no ano seguinte eles não te convidariam. Você não podia também chegar à Europa e não ter a sua programação já com antecedência de três, quatro meses, senão você ficava perdido e você teria que voltar. E eu pedia as condições. As minhas condições eram: hotel e, sei lá, a gente já sabia o que o campeonato iria dar. Esse dava US$ 100, aquele US$ 75. Eu acho que o máximo que eu ganhei foi US$ 150.

Folha: Isso pelo primeiro lugar?
Fernandes: Não, já era fixo.

Folha: Era um cachê?
Fernandes: É, um cachê. Mas, na época, US$ 150 ou US$ 100 dava para se virar bem, não é? E foi dessa forma que eu fiquei na Europa. Teve um ano, por exemplo, que eu fiquei na Europa, eu fui para os Estados Unidos, eu joguei o Orange Bowl, que é considerado o Campeonato Mundial juvenil, e eu ganhei o Orange Bowl.


Folha: Isso foi quando?
Fernandes: Foi por volta de 1956 ou antes. Eu fiz o circuito todinho do Caribe. O Caribe começava nos Estados Unidos, aí você pegava a Colômbia, a Venezuela, a Jamaica. Depois eu segui para a Europa. Na Europa, eu fiz o circuito todo. Esse ano eu voltei superesgotado. Aí eu fui para a Austrália, eu não tinha dinheiro na Austrália. Eu tinha ganho quase US$ 900 até setembro, eu fui para a Índia, fiquei três meses para ganhar o tíquete para a Austrália.

Folha: Ficou três meses na Índia jogando? Ou três meses de lazer?
Fernandes: Se eu não jogasse, eu não tinha dinheiro. E, na Austrália, eu não tinha nada. Eu fiz todo o circuito da Austrália, eu não tinha dinheiro para voltar. Eu só tinha a minha passagem. que era de Londres a São Paulo. Mas, da Austrália para a Europa, eu não tinha. Aí eu peguei um convite da Índia, fiquei quatro meses jogando os campeonatos lá para poder ganhar a passagem. Assim mesmo, esse ano eles pagavam tudo e davam em rúpias. Rúpias não tinham valor. Aí você tinha que pegar esse dinheiro e trocar, na Suíça, um por quatro, eles davam um por 15. A inflação era todo dia, então, se era um por dez, eles falavam um por 50, um por 200. Então não tinha valor, o dinheiro deles. Quando eu passei um telegrama que eu estava interessado em participar no circuito deles. Eles aceitaram, mas com uma condição: a passagem de Sydney a Bombaim. Eu não tinha, eu fiquei quatro meses, inclusive, fiz algumas exibições e tal, para ganhar algum dinheirinho para pegar a passagem para chegar à Europa. Mas, tinha um torneio no Egito, era Cairo-Alexandria. Eu me inscrevi, passei um telegrama. Tinha uma pessoa lá que, não é? Ele era mais ou menos conhecido, que eu estava interessado em participar.

Folha: Como é que se comunicava em todos esses países aí?
Fernandes: Em inglês, em espanhol, alguma coisinha eu falava. Sempre quando você chega no tênis sempre você encontra alguém que fala. Um conhecido e tal, aí eu disse que estava interessado e pedi o máximo do tíquete da passagem. Pedi Bombaim e Londres. E, eles me responderam que não dariam, mas sim Bombaim e Roma. Putz, eu endoideci, eu fiquei louco, na mesma hora eu falei, aceito. Eles disseram que tinha passagem até Cairo e Roma. As condições que eles davam, o dinheiro egípcio também não era dinheiro bom. Você não podia, não tinha valor na época, você tinha que trocar por umas coisas absurdas, não é? Aí foi quando eu cheguei à Europa.

Só que, quando eu estava na Índia, tinha uma pessoa, era um norte-americano que adorava tênis e onde tinha torneio ele ia assistir, tinha muito dinheiro e tal. Ele pegou minhas rúpias, era quatro por um. E eu troquei com ele US$ 250, na época, e ele me deu esse dinheiro em Montecarlo. E aí onde eu cheguei não tinha nada. Hoje, quando eu vejo, me dá até pânico, de eu chegar, fazer uma coisa dessas, entende? Mas sabe o que é não ter nada?

Folha: E como o senhor se arranjou?
Fernandes: Nessa época, eu tinha uns 19, 20 anos. Na Europa, joguei o campeonato de Montecarlo, não é? Eu já tinha convite para Montecarlo, para Nice também e outros mais e até, não é? Então, eu fiz esse circuito América do Sul, é, eu fiz Estados Unidos, Caribe, Europa aí eu fui para a Austrália, peguei o circuito da Austrália, os quatro campeonatos deles, os maiores, aí peguei o circuito da Índia, aí peguei outro circuito da Europa. Fiquei quase dois anos, sabe, girando. Eu cheguei aqui, olha eu estava.


Folha: E a família, como eram os contatos com a família?
Fernandes: Ah, a gente, não é?

Folha: Tinha namorada no Brasil, na época?
Fernandes: Não, não.

Folha: Então, as namoradas eram no circuito do tênis?
Fernandes: Namorada eu não tinha, porque você não tinha nem tempo, não dava, não é? Estava aqui uma semana na outra semana noutro lugar. Então, você podia ter namorada.

Folha: Do tênis?
Fernandes: Do tênis.


Folha: Em cada cancha uma namorada?
Fernandes: Em cada canto uma namorada. Mas é verdade, porque antes o tênis era isso, você não ganhava dinheiro. Você não ganhava muito, mas você era recebido assim no aeroporto, te buscavam de automóvel, já te davam, por exemplo, como se diz: o calendário?

Folha: Uma agenda?
Fernandes: Quando você chegava lá, eles já te falavam é esse, já tinha a programação todinha. Hoje tem um coquetel, amanhã tem um jantar. Hoje é isso aqui, depois tem outra coisa. Então, era desse jeito,... era coisa caríssima. Eu, por exemplo, quando eu peguei o Pan-Americano eu vim do Caribe e eu vim mal, mas mal, sabe o que é mal?

Folha: Ia em tudo quanto é festa?
Fernandes: Ia em tudo quanto é festa. Então, eu para pegar as minhas condições, aqui, eu ficava treinando de manhã, à tarde e foi uma semana antes.

Folha: Como o senhor foi convocado para representar o Brasil?
Fernandes: Mas eu era o número um do Brasil.

Folha: E como o senhor chegou ao número um do Brasil?
Fernandes: Jogando em competição.

Folha: Número um do Brasil já como jogador adulto?
Fernandes: Eu, por exemplo, joguei três campeonatos Sul-Americano juvenil, eu ganhei todos os Sul-Americanos, eu ganhei todos os Brasileiros juvenil. Eu era um dos melhores do Brasil. Então, isso não era porque eu era mais bonito ou, sei lá, qualquer coisa desse gênero. Não. É que era o melhor, eu tinha que ser convocado. A Copa Davis era um e dois e depois tinha o reserva. Não havia privilégio nenhum. Era na base do jogo mesmo.

Folha: Vamos ver como é que foi esse ano de 63, o senhor tinha que idade?
Fernandes: Eu ganhei o Campeonato Brasileiro em 62 e 63. Fui campeão Brasileiro, inclusive, eu ganhei na final do Thomaz Koch. Em 64 ou 65, eu arrebentei o pé. Aí eu parei porque foi no começo, que começou a entrar o profissionalismo e eu não cheguei no profissionalismo. Aí eu machuquei, eu tive de parar. Eu já tinha dois filhos, e a melhor maneira para garantir minha sobrevivência era dar aula, onde eu ganhava mais, e até hoje não me arrependo, estou feliz da vida. O que eu estou fazendo, gosto, e pretendo continuar dessa forma por muito tempo porque eu gosto mesmo de dar aula, gosto dos meus alunos. Então, eu dou aula com amor. E, sou bem remunerado também. Então, não posso me queixar.

Folha: Bom, mas voltando ao campeonato, ao Pan-Americano, quantos jogos teve? Foram jogados onde?
Fernandes: O Pan-Americano foi jogado no Pinheiros. Era inacreditável, porque, na época, não era assim o tênis aquela elite. Eu tinha até vergonha de pegar minha raquete e sair pela rua assim com raquete de tênis.

Folha: Por quê?
Fernandes: Porque a turma achava que era frescura, que eu ia caçar borboleta. Hoje, não. Hoje é bonito você correr na rua, é bonito você fazer ginástica na rua. Antes, não, se eu fosse treinar ao meio-dia, era uma vergonha. "Ô, você está louco, ficar treinando e tal". Hoje, não, hoje é lindo, hoje em dia a turma vai lá, você está no meio da cidade, você está fazendo exercício, é bonito.

Então, o Pan-Americano foi jogado no Pinheiros e no Harmonia. Os primeiros jogos no Pinheiros e as finais no Harmonia. E, na época, eu fiquei impressionado. A quantidade de gente era imensa. Quer dizer, o Harmonia tinha arquibancada dos dois lados, sempre superlotadas, e eles iam lá com interesse. Você via a pessoa chegar lá uma hora antes do jogo. Isso aconteceu no Harmonia. Eu acho que, na época, foi bonito. Mas, quando você está dentro, jogando, você não tem idéia.

Hoje eu tenho idéia o que é um Pan-Americano, o que é uma Olimpíada. Coisa bonita de você chegar lá, você ver que todos os atletas, todos, todos, sem exceção, 99% estão bem, estão bem preparados em qualquer modalidade. É bonito, não é? E, eu não tinha idéia. A medalha, para mim, eu não tinha noção do que era isso. Hoje, eu vejo que é importante uma medalha de ouro nos Jogos Pan-Americanos ou numa Olimpíada, então, coisa linda. E, também para o Brasil, para o país, é bonito.

Eu era bobo. Eu tenho na minha casa umas 300 taças, tenho não sei quantas medalhas, estavam na parede, eu tirei todinhas. Eu tirei tudo, hoje está tudo arquivado, está lá no armário. Mas, na época, eu ganhava uma taça, uma medalha, se vinha uma pessoa e pedia, eu dava. Dava como suvenir. É gozado a gente, não é? Você ganhava os jogos, era uma coisa natural.

Folha: Qual a importância do Pan para o senhor?
Fernandes: Quando eu penso, eu falo: "Puxa vida!". Na época, se tivesse um campeonato que me desse US$ 150, eu deixaria o Pan. Para você ver que era inocência. Hoje, não deixaria nem por US$ 5.000 nem por US$ 50 mil, eu preferiria jogar um Pan-Americano ou uma Olimpíada, mas na época, não. Eu precisava do dinheiro, entende?

Folha: Nos Jogos, o senhor participou em dupla masculina e individual. Quantas partidas, por exemplo, primeiro vamos ver a participação individual? Quantas partidas o senhor jogou? O senhor não chegou até à final. Quando caiu?
Fernandes: Na simples, eu ganhei do campeão canadense, ganhei do campeão norte0americano, que era o Allan Fox, ele era o número um, na época, dos Estados Unidos, e eu sei que eu cheguei até à semifinal. E, até chegar na semifinal eu ganhei de mais uma pessoa ou duas, que eu não me lembro mais. E, eu perdi no quinto set na semifinal.

Folha: Quantas horas de partida?
Fernandes: Começou às 14h e terminou pelas 18h passadas. Foi um jogo superdisputado. Também no dia seguinte eu não iria ganhar mesmo, porque eu estava quebrado. Não dava, não dava mesmo. E esse também que jogou comigo também não andou na quadra. Sem tirar o mérito do Barnes (Ronald Barnes, brasileiro que venceu o Pan na disputa de simples), um tremendo jogador, e eu a dupla ganhei com ele. Nós ganhamos dos mexicanos, 3 sets a 0, eu lembro perfeitamente os nomes, eram o Mario Llamas e o Pancho Contreras. Foram três sets sem maiores dificuldades.

Folha: E como foi a chegada até à final? Qual o jogo mais difícil?
Fernandes: Foi contra o Allan Fox, ganhei no quinto set, foi nas quartas-de-final. Contra o canadense, foram três sets, eu tinha ganho em três sets. Eu não sei se eu joguei antes um jogo, depois com o canadense, depois com o norte-americano, depois com o mexicano. daí...

Folha: E nas duplas?
Fernandes: Nas duplas, foi tudo mais fácil. A final foi o jogo mais difícil, não é? Mas nós ganhamos de três sets. Mas foi um jogo disputado.

Folha: O senhor falou que não tinha uma emoção especial a participação ali?
Fernandes: Eu não tinha. Era só para receber uma medalha, era apenas uma medalha. Gozado...

Folha: Agora, do ponto de vista da repercussão entre os seus concorrentes ou entre os organizadores do tênis no Brasil, a medalha teve alguma repercussão na sua carreira?
Fernandes: Hoje sim, hoje você fala no Pan-Americano, você ganhou uma medalha de ouro. Hoje tem. Antes, você não sabia, você não sabe, o playoff, por exemplo, eu era a estrela do campeonato, eu só jogava na quadra número um. Os jornais, era tudo primeira página, "O Estado", a "Folha", a "Gazeta", então, entende? Mas, você não tinha noção, entendeu? Você ia lá e era natural, era como se fosse uma partida. Você está lá, com 18 anos, 19 anos, você quer jogar, não é? Você quer correr, você quer ver a bola, entendeu? Hoje não, o resultado é importante. A semifinal lá eu fiquei no três. São três, é toda a América do Sul e todo o Brasil, se você começar a pensar. A América Latina, os melhores jogadores, entendeu? Então, não deixa de ser resultado. Mas, antes, não, disputar o terceiro lugar não era importante. Hoje eu sei que é importante uma medalha de bronze. Eu sei que, por exemplo, o Brasil ou determinado país ganhou xis medalha de bronze, xis de prata, xis de ouro, coisa bonita, não é? Hoje, eu dou valor. Antes, não.

Folha: Queria era disputar, jogar e ganhar o dinheiro também?
Fernandes: Jogar, pronto, ia embora, acabou-se.

Folha: E daí, então, o senhor falou que o tênis foi disputado na primeira semana do Pan é isso?
Fernandes: É, e depois eu fui embora, eu não curti. Eu fui mais morto do que vivo para a Europa, para a Grécia, participar da Copa Davis.

Folha: Foram o senhor e o Barnes?
Fernandes: É, eu e o Barnes. O Mandarino estava como reserva e, se não me engano, o Ivo Ribeiro ou o Thomaz Koch. Eram os cinco sempre, não é? Depois parece que o Ivo não foi. O Barnes e eu era sempre quem jogava a simples e a dupla. Depois eu me retirei, o Barnes se retirou.

Folha: Mas, depois do Pan, o senhor ainda jogou uns dois anos, não foi?
Fernandes: É, eu estava bem, é que eu quebrei o pé na Suíça, numa final de dupla. Então, cheguei ao Brasil, tive que operar e a minha recuperação, um ano ainda, eu não tinha a mesma mobilidade e não daria para eu ficar um ano parado. Aí eu comecei a dar aulas.


Folha: O senhor se sustentava com o tênis, certo?
Fernandes: É, com o jogo. Não tinha patrocínio, não. Isso que eu cheguei a ser um dos melhores do mundo. Pelo que vi, parece que saiu numa revista, eu cheguei a número três em dupla, eu e o Barnes. Quem viu isso foi meu filho, que foi para os Estados Unidos. O meu filho é quem contou, eu mesmo não sabia. Então, eu digo, que eu fui, por essa revista, o 23º em simples e 3º do mundo em duplas pela World Tênis, não é?. Bom, então, eu voltei para cá.


Folha: O senhor tinha se machucado na Suíça?
Fernandes: Eu me machuquei, peguei minha recuperação no Pacaembu. Eu ia ficar lá no Pacaembu me recuperando, inclusive até arrumava a quadra lá, varria a linha, deixei a quadra bonita, porque o Pacaembu tinha duas quadras, uma coberta e uma descoberta. Meu irmão dava aula lá. Eu ia lá dar uma corridinha, fazer minha ginástica e tal e não jogava com ninguém.

Aí eu comecei a arrumar a quadra, de vez em quando eu peguei o Carlos Taulber, o dono da Eletro-Radiobrás na época, e ele me convidou. Ele estava com uma casa no Morumbi, estava construindo uma casa. Então, na casa dele, ele me convidou para eu dar aula de tênis para ele. Eu dava aula de tênis para ele, para a mulher e para as filhas. A menininhas deles tinha 5 anos, 7 anos, eram três, me parece, a outra tinha 10 anos, por aí. E, foi assim, e no Pacaembu comecei a dar umas aulas. Aí preenchi o horário no Pacaembu.

Aí, não sei por quê, o diretor lá do Pacaembu disse que eu já não podia dar mais aula. Eu até hoje eu não soube por quê. Mas, tudo bem. Aí eu comecei a dar aula no Ipê, aqui eu dava aula também. Aí o diretor de tênis me convidou para dar aula aqui no Paulistano, eu dava aula em três casas particulares, no Ipê, no Tênis Clube, aqui e no Santa Paula também. Até de sábado e domingo, eu dava aula, mas era tudo particular. Eu nunca tive vínculo com ninguém, tudo na base de particular mesmo. E foi assim, eu tive que dar aula.

Folha: E até hoje o senhor dá aula?
Fernandes: Até hoje eu dou aula e eu estou feliz da vida.

Folha: O que o tênis lhe deu do ponto de vista pessoa, financeiro?
Fernandes: Bom, eu não me queixo, eu estou legal, o mínimo, eu estou beleza, não tenho problema. Foi com o tênis que eu dei educação para meus filhos, que eu paguei minha casa, onde eu tenho as minhas coisas, entende? É tudo do tênis. E continuo ainda, entende? Feliz, porque eu estou fazendo o que eu gosto. Gosto mesmo, porque eu consigo fazer as minhas coisas com o tênis. Se eu não conseguisse, aí eu procuraria outro ramo, sei lá, procurava criar alguma coisa e deixaria o tênis, mas não. Não pretendo deixar, eu gosto e eu quero morrer trabalhando como professor de tênis. É a minha vida.

E-mail: rlucena@folhasp.com.br

Conheça o site do jornalista Rodolfo Lucena

Assine a Folha

Classificados Folha

CURSOS ON-LINE

Aprenda Inglês

Aprenda Alemão


Copyright Folha de S. Paulo. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress (pesquisa@folhapress.com.br).