31/03/2005
Dois pontos de vista: O elo se fechará nos consumidores
RUBENS NAVES
ESPECIAL PARA A
FOLHA
Desde que, na segunda década do século passado, os Laboratórios Fontoura encomendaram ao escritor Monteiro Lobato uma cartilha para explicar à população como enfrentar as verminoses, tendo como personagem principal o Jeca Tatu e a ainda hoje fantástica tiragem de 1 milhão de exemplares, as ações da iniciativa privada na área da responsabilidade social evoluíram.
Precisamos sair dessa dependência da iniciativa pessoal de empresários conscientes
|
Mas o grande salto nas ações de responsabilidade social desenvolvidas no país só aconteceria no início dos anos 90, com a abertura econômica e política, a privatização de várias estatais e o conseqüente encolhimento do Estado e fortalecimento da sociedade civil.
Nessa época, a iniciativa privada pareceu tirar dos olhos as viseiras que a impediam de perceber que a situação social apontava para um quadro insustentável.
Insustentabilidade econômica gerada pela concentração de renda que impedia o crescimento do mercado interno, insustentabilidade social provocada pelo desemprego e precariedade crescentes nas relações de trabalho, além de mercados externos cada vez mais exigentes em relação às ações das empresas no trato com a força de trabalho e o ambiente, criaram um formidável caldo de cultura no qual fermentou a responsabilidade social.
O sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, declarava, em 1993, haver "uma tremenda força de mudança no ar". De fato, à frente de sua Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida, ele e milhares de representantes da sociedade civil passaram a atrair para suas ações e organizações o empenho, os recursos e as experiências de gestão das empresas.
O Programa Empresa Amiga da Criança, da Fundação Abrinq, surge nessa década do enfrentamento da questão do trabalho infantil. Outras organizações também passaram a se articular com as empresas e seus dirigentes.
Precisamos sair dessa dependência da iniciativa pessoal de empresários conscientes, como o Fontoura da década de 10. É preciso que a responsabilidade social chegue aos consumidores, fazendo com que eles valorizem os socialmente responsáveis. Quando esse elo se fechar no consumidor e na cidadania, não dependeremos da boa ou má consciência de empresários: a responsabilidade será fator de sobrevivência estratégica.
Rubens Naves, 62, advogado e professor licenciado da PUC-SP, é fundador e conselheiro da Transparência Brasil e diretor-presidente da Fundação Abrinq