31/03/2005
É preciso contextualizar o debate
JORGE EDUARDO DURÃO
ESPECIAL PARA A
FOLHA
O apoio à implementação dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) requer um esforço de contextualização e relativização em relação ao significado desse compromisso assumido pelos governos e que por eles não vem sendo cumprido.
Não podemos ficar nas declarações de intenções, temos de priorizar as ações concretas dos governos e da sociedade civil pelo desenvolvimento, erradicação da pobreza e desigualdades.
Não faz sentido avaliar ações de laboratórios farmacêuticos sem discutir seu papel [no combate à] Aids
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No caso do Brasil, onde as metas de inflação e outras diretrizes macroeconômicas ditam os rumos do governo e da sociedade, o debate sobre os ODM -apesar de eles serem minimalistas e inadequados para a nossa realidade- pode contribuir para a definição de metas sociais.
E o debate sobre a responsabilidade social das empresas não pode ser retirado desse contexto. Não faz sentido reduzi-lo à avaliação de um sem-número de microiniciativas sociais, esquecendo o papel das empresas em relação aos rumos da globalização.
No plano internacional discute-se, por exemplo, o significado do Global Compact -espécie de parceria público-privada incentivada pela ONU e que reúne empresas como Nike e Shell- e o papel das transnacionais em relação aos ODM, já que se conhece a sua atuação voltada para a privatização de recursos públicos.
No Brasil, parece-me extremamente relevante o aprofundamento de uma interlocução entre empresas, movimentos sociais, sociedade civil e Estado tendo como foco a identificação de metas sociais para traduzir os ODM.
No tocante à participação das empresas, esse diálogo requer um conceito ampliado de responsabilidade social. Devemos discutir o papel das empresas hoje na definição de um modelo de desenvolvimento excludente, que, por exemplo, ameaça a Amazônia com a expansão do agronegócio.
Não faz sentido avaliar ações sociais de laboratórios farmacêuticos, ainda que inspiradas no conceito de responsabilidade social, sem discutir o papel desses laboratórios em relação aos pacientes de Aids, obrigando muitas vezes o governo a quedas-de-braço.
É necessário, sobretudo, trazer à discussão o papel dos bancos na brutal concentração de renda na sociedade brasileira e a contribuição que poderiam dar ao resgate da dívida social no Brasil.
Jorge Eduardo Durão, 59, é diretor-geral da Abong (associação de ONGs) e diretor da Fase (Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional)