02/04/2005
Igreja tem o desafio de manter os fiéis sem perder a identidade
da
Folha Online
Perdendo espaço sistematicamente para as religiões híbridas, o maior desafio da Igreja Católica neste milênio será manter os fiéis sem perder a sua identidade em meio ao pluralismo religioso.
De acordo com o Anuário Estatístico publicado em 2003 pela Secretaria de Estado do Vaticano, a influência dos católicos em nível mundial diminuiu nos últimos 25 anos. Passou de 17,75% em 1978 (início do pontificado de João Paulo 2º) para 17,3% em 2001. Existem hoje cerca de 1 bilhão de católicos apostólicos romanos no mundo.
A institucionalização democrática e o avanço da liberdade religiosa no espaço público são apontados por estudiosos como as principais razões para o crescimento de outras religiões.
No Brasil, a proporção evangélica foi a que mais cresceu na última década. De acordo com os dados do Censo, essa população subiu de 9,05% em 1991 para 15,45% em 2000 --um aumento de 70,7%. Mesmo perdendo fiéis, os católicos continuam sendo a maioria: somam quase 125 milhões de brasileiros e representam 73,8% da população. Em 1991, os católicos eram 121, 8 milhões de pessoas e representavam 83,76% dos brasileiros, o que significa que a proporção no total da população caiu 11,9%.
Existem várias razões para o crescimento desse segmento, porém as mais defendidas entre especialistas são que os evangélicos têm um acolhimento melhor em seus templos e avançam entre as camadas mais pobres da população --em toda a história a hierarquia católica sempre teve uma relação mais íntima com as classes dominantes.
A própria igreja admite que está em campo minado. "As missas são anônimas. A Igreja Católica tem que enfrentar mais esse problema de atendimento personalizado. Os evangélicos fazem isso muito bem, a igreja pode até aprender com eles", disse em entrevista à Folha o sociólogo Luiz Alberto de Souza, diretor-executivo do Ceris (Centro de Estatística Religiosa e Investigações Sociais), um dos principais organismos de assessoria da Igreja Católica no Brasil, ligado à CNBB (Confederação Nacional dos Bispos do Brasil).
Na avaliação de pesquisadores, duas reações opostas da Igreja Católica fizeram com que o crescimento dos evangélicos não fosse maior: a Teologia da Libertação, com sua atuação política e a criação das Comunidades Eclesias de Base, e o Movimento de Renovação Carismática, que apresenta traços pentecostais.
Papa
A principal meta pessoal de João Paulo 2º foi manter a grande disciplina e o consenso diretivo de toda a instituição eclesiástica. Por uma igreja forte e coesa diante da cultura fragmentada e neo-liberal, não permitia o dissenso teológico e exigiu cuidado redobrado quanto às liturgias inculturadas e sincréticas.
Em todo o mundo, as principais dioceses passaram a ser orientados por conservadores. Chegou a polemizar ao apoiar grupos de extrema direita, como a Opus Dei. No Brasil, por exemplo, reprimiu a Teologia da Libertação e tirou o vigor das CEBs (Comunidades Eclesiásticas de Base).
Como resultado, o papa assistiu à queda do número de casamentos civis e religiosos, à fuga de fiéis para religiões híbridas e ao afastamento da juventude e dos acadêmicos universitários, que se aproximaram do secularismo, do ateísmo pragmático ou do neo-paganismo emergentes.
Para o professor de Teologia da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica) Rafael Rodrigues da Silva, adotar a linha de estratégia dos evangélicos para conter a "fuga" dos fiéis é um retrocesso na história da Igreja Católica. "Movimentos sectários como a Renovação Carismática e o Opus Dei não se envolvem com os problemas sociais, políticos e econômicos da sociedade. Eles se fecham em suas comunidades e perdem a noção do todo. Isso seria um retrocesso", afirma.
Opus Dei
O Opus Dei foi fundado em 1928 pelo sacerdote espanhol Josemaría Escrivá de Balaguer, canonizado pelo papa João Paulo 2º. Escrivá morreu em 1975 e foi beatificado em 1992, um tempo recorde --apenas 17 anos após a sua morte. Críticos disseram que essa rapidez comprova o poder do Opus Dei no Vaticano.
A ordem conta com cerca de 80 mil membros, está presente nos cinco continentes, em particular na América Latina, onde conta com 30 mil adeptos.
A chamada "máfia santa" ou "exército do papa", como foi definida por detratores e admiradores, controla e influencia, sem jamais aparecer juridicamente como proprietária em muitos países de escolas, universidades, centros de capacitação e meios de comunicação.
A missão do Opus Dei é a de promover o papel dos laicos dentro da igreja.
O papa João Paulo 2º lhe conferiu em 1982 o estatuto especial de "prelatura pessoal", concedendo poderes de uma diocese à parte, mas sem território, pelo que é regida pelo direito canônico e por seus próprios estatutos.
A "obra" depende diretamente do papa e da Congregação para os Bispos. Seu líder, o prelado, deve ser um eclesiástico e sua designação é vitalícia.
Seu atual prelado, o terceiro na história da ordem, monsenhor Xavier Echevarría, nascido em Madri, em 14 de junho de 1932, foi secretário de seu fundador, o espanhol José María Escrivá de Balaguer, canonizado em outubro de 2002.
Renovação Carismática
A Renovação Carismática Católica surgiu na igreja na segunda metade da década de 60. Quando terminado o concílio do Vaticano II, iniciou-se um processo de renovação da espiritualidade, liturgia, catequese e propostas sociais no catolicismo.
Oriunda da experiência de jovens universitários norte-americanos durante um retiro de fim de semana na universidade de Duquesne em 1967, a Renovação Carismática rapidamente se espalhou por todo o mundo.
O objetivo do movimento é evangelizar, enfatizando as redescobertas das emoções na relação com o sagrado. Os cultos são fervorosos, animados por cantos e danças, em louvor ao Espírito Santo.
Nas reuniões dos carismáticos, valoriza-se os dons do Espírito Santo, a cura e a capacidade de orar em línguas desconhecidas. Com os carismáticos, ganhou força nos meios de comunicação o fenômeno dos padres cantores, como Marcelo Rossi no Brasil.
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