14/04/2005
Favorito dos liberais, Martini se destaca por posições ousadas
EPAMINONDAS NETO
da
Folha Online
Luca Bruno/AP |
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Carlo Maria Martini: cardeal italiano, de perfil liberal, arcebispo emérito de Milão, uma das maiores arquidioceses do mundo |
O jesuíta Carlo Maria Martini, 78, arcebispo emérito de Milão, era um dos candidatos mais fortes a sucessor de João Paulo 2º até 2002, quando a saúde --e talvez suas posições liberais demais-- o retirou da lista principal dos "papabili".
Defensor da ordenação de mulheres para a Igreja, em oposição frontal à opinião do sumo pontífice, Martini é um intelectual respeitado e foi durante muito tempo a grande esperança das correntes liberais e moderadas da Igreja.
O cardeal emérito de São Paulo, d. Paulo Evaristo Arns, chegou a confessar sua predileção por Martini numa eventual eleição, ao contar a história de que o italiano, ao chegar ao Brasil, preferiu sair direto do aeroporto para uma favela do que se recolher ao hotel.
Os brasileiros podem conhecer Martini por seus livros publicados no Brasil, alguns com uma razoável repercussão na imprensa, a exemplo da obra "Em que Crêem os que Não Crêem?", lançada em 1999.
No livro, o cardeal trava um diálogo epistolar com o escritor italiano Umberto Eco sobre a questão do ateísmo e da fundamentação moral dos não-crentes, ao mesmo tempo em que responde a espinhosas questões sobre o aborto, o homossexualismo e o sacerdócio feminino.
As chances de Martini tornar-se papa sempre esbarraram, porém, na resistência das correntes mais conservadoras da Igreja Católica e na noção de que o próximo sumo pontífice seria alguém de corte ideológico mais próximo de João Paulo 2º.
Por outro lado, os problemas da igreja frente à modernização dos costumes, o avanço da tecnologia e a necessidade de lidar com os meios de comunicação, no entanto, sustentavam o arcebispo de Milão ainda como um forte sucessor do papa polonês.
Mal de Parkinson.
Em 2002, porém, o candidato preferido de liberais e moderados confessou sua "incapacidade" para liderar a igreja ao admitir, em fevereiro daquele ano, que sofria de uma variação da doença que ajudou a minar a saúde de João Paulo 2º, o Mal de Parkinson.
A imprensa italiana chegou a vazar uma conversa de Martini com seus padres, em que ele confessa sofrer de "parkinsonismo". "Muitas pessoas nessa idade [75] não conseguem manter sua mão parada. Às vezes, eu tenho de escondê-la embaixo da mesa, mas, depois de uma certa idade, é inútil esconder os sinais do envelhecimento", disse o cardeal, de acordo com uma conversa distribuída por seu escritório, após reportagens sobre o assunto serem publicadas.
À época, ele anunciou que não se sentia em condição de dirigir uma igreja e que preferia se retirar para uma vida de estudos, preferivelmente em Jerusalém, apresentando sua renúncia ao papa do cargo de arcebispo de Milão.
Sua renúncia abriu espaço para o que é hoje considerado um dos mais fortes "papáveis": o cardeal Dionigi Tettamanzi, atual arcebispo de Milão.