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09/06/2006

Cenário: França - Cinema, champanhe & glamour

Em Cannes, respira-se o doce perfume das estrelas. E aí começa o dilema para os turistas que se arriscam a visitar a pequena e sofisticada baía na Côte d'Azur, onde o verão europeu parece sempre começar antes do tempo

POR LEON CAKOFF

MJ-Kim/Getty Images
A modelo Victoria Silvstedt é uma das beldades que costuma desfilar nos salões do Palácio do Festival Internacional de Cannes
A modelo Victoria Silvstedt é uma das beldades que costuma desfilar nos salões do Palácio do Festival Internacional de Cannes
Cannes ficou irreconhecível desde a minha primeira visita em 1971. John Lennon e Yoko Ono flertavam com um eterno recomeço na qualidade de dois curta-metragistas experimentais. A Cannes provinciana parecia o cenário ideal para Lennon se despir da tensa idolatria dos Beatles e exibir com a fleuma dos iniciantes os curtas "Aphoteosis" e "The Fly". Solícito, repetia suas poses de amor a Yoko Ono, abrindo quantas vezes se pedisse a sua camisa com o nome dela estampado, para novas fotos exclusivas, enquanto suas calmas respostas eram traduzidas do inglês ao francês. Naquele tempo era chique francês dizer que não falava inglês. Hoje, nos negócios turísticos de Cannes, não tem conversa se não for em inglês.

Minha memória seletiva prefere reter os tempos de uma Cannes provinciana, mais com ares da Ligúria italiana do que dos ranzinzas inóspitos de Paris. O perfume das ervas contagiava os sabores: desde pequenos queijos artesanais a pizzas, mariscos, pescados e cozidos da tradicional cozinha provençal. Prevalecia uma inocente promiscuidade entre a cozinha e o atendimento aos clientes em uma sucessão de pequenos restaurantes. A curiosidade era o que importava. O tempo, não.

A cada mesa posta, o prazer de servir e de conhecer a origem do freguês e, principalmente, o seu gosto cinematográfico. A cada mesa posta, a possibilidade de atender a uma celebridade do cinema, talvez ainda desconhecida ou, na pior das hipóteses, de obter uma opinião nova sobre os filmes exibidos nos dias do festival. Toda essa intimidade permitia boas reprimendas ao se pedir inadvertidamente um Bordeaux, sempre corrigido por sugestões de vinhos locais, como os Côtes de Provence, Domaine Ott L'Estandon, Bandol e mais alguns do restrito leque provençal. Outro conselho que valia a pena acatar era a sugestão dos vinhos rosé regionais, que sempre dizem ser os únicos autênticos de todas as variedades francesas.

Coquetel reservado Nessa memória seletiva, o firmamento ficava mais próximo e a nossa constelação de estrelas era também brindada por pequenas simpatias e facilidades provincianas. Era possível encontrar nas ruas e nos restaurantes de Cannes toda variedade de astros e estrelas sem afetações e sem vínculos com o mais paranóico do status da virada do século 20 para o 21 –o da segurança, dos "bodyguards", a indústria que hoje tem intrínseca ligação com as celebridades do cinema e com o próprio cotidiano do festival.

Sim, eles estão nas sessões de imprensa, nos hotéis de luxo, nas vilas milionárias dos Alpes Marítimos (os morros de Cannes não têm favelas), no mercado onde se vende e se compra filmes, no cassino, no porto disputado por incríveis iates de sonhos. A opulência exibe e também se protege de forma ostensiva.

"Bodyguard" foi a palavra mágica que soube usar para seguir a "troupe" de Quentin Tarantino em disparada para um coquetel reservado, logo após o anúncio da Palma de Ouro para o seu "Pulp Fiction" e a coletiva de imprensa, onde havíamos combinado de nos encontrar, correndo pelos labirintos emergenciais do Palais des Festivals. Era a palavra com mais credibilidade, mesmo Tarantino tendo quase meio metro a mais.

A organização do festival acredita que o nome da província de Cannes é o mais escrito e divulgado nome na imprensa mundial. E que o assédio dos jornalistas ao Festival de Cannes só perde para a Olimpíada. Isso faz com que o nome de Cannes seja replicado ao infinito pela imprensa de todo o mundo. E, estranhamente, parece ser essa proximidade de riquezas e famas inalcançáveis que faz da cidade o centro de uma nova modalidade turística. O turismo consoante, reverenciador, agradável, mesmo com as suas frustrações. Não deixa de ser um resumo de ópera. Se a Revolução Francesa fez justiça a uma nova classe de ricos que sustentava a nobreza inoperante e decadente, arrastou consigo uma pequena burguesia que deveria se contentar em apenas bajular e admirar os privilegiados da nova classe ascendente.

Na região em volta de Cannes, há surpresas como os museus impressionistas, a arquitetura medieval, as feiras livres repletas de carnudas cerejas, e a gastronomia provençal, regada a vinhos excelentes
Esse nosso turista consoante é do tipo que deve concordar com tudo, mesmo que as restrições a ele sejam, na maioria das vezes, vergonhosamente impostas. Não pode chegar perto do palácio, nem de carro nem a pé, não pode assistir aos filmes como os privilegiados que vê subindo as escadarias de smoking ou com vestidos e jóias extravagantes, não pode se dar ao luxo de freqüentar as inúmeras festas e recepções aos filmes, não pode sequer freqüentar os bares de preços exorbitantes como os dos grandes hotéis Majestic e Carlton se não ostentar credenciais, ares de produtor ou simplesmente estiver vestido ou vestida para matar. É sempre um mistério, aliás, universal, o acesso irrestrito de prostitutas, igualmente vestidas para matar, a bares como os do Hilton e do Majestic.

Getty Images
O Cadillac Fleetwood desliza na Croisette durante o festival de 2005; ao lado, John Lennon e Yoko Ono posam para as lentes de Leon Cakoff em 1971
O Cadillac Fleetwood desliza na Croisette durante o festival de 2005
Tapete vermelho O Festival de Cannes coincide com o feriado religioso católico da Ascensão, comemorado sempre 40 dias depois da Páscoa. No Brasil, esse feriado não é estabelecido, mas na França é comemorado com ardor. Invariavelmente, ele cai no segundo fim de semana do festival, em maio, e provoca o afluxo de milhares de turistas do próprio país, que, dizem as más línguas, são os que descem as montanhas e se massacram em volta do palácio dos festivais na esperança de ver, seja de binóculos, alguma celebridade do cinema.

Fico com dó das crianças, sempre chorosas e desconfortáveis, carregadas por conta do fetiche de seus pais. Mal dá para andar a pé. Para aumentar o calor do inferno social, esses dias coincidem ainda com o GP de Mônaco.

Ingressos para os filmes são quase impossíveis. Mais factível é arriscar os filmes das paralelas Quinzena dos Realizadores e Semana da Crítica. Os hotéis são restritivos. As reservas para o festival em maio são confirmadas um ano antes e pagas em janeiro. Os restaurantes mais concorridos devem ser reservados com antecedência. Mas o turismo admirador é cheio de atividades. A calma do andar e o scanner do olhar o denunciam. Ele está lá para ver se vê alguém que conhece. Já aprendeu que fora ver a subida do tapete vermelho antes das sessões no palácio a uma distância que reduz as celebridades a uma dimensão centimétrica, a sua chance aumenta quanto mais for madrugada ao longo da orla da baía de Cannes, o boulevard de la Croisette. É quando os notáveis se arriscam a descer ao mundo dos mortais comuns para um pouco de ar fresco e esticada de pernas.

Leon Cakoff
John Lennon e Yoko Ono posam para as lentes de Leon Cakoff em 1971
John Lennon e Yoko Ono posam para as lentes de Leon Cakoff em 1971
Uma das piores lembranças de meus primeiros anos em Cannes vem da mesma Croisette, com suas praias particulares lotadas por restaurantes instalados a pretexto de oferecer serviços, guarda-sóis, chuveiro e refeições. A praia de Cannes é de areia artificial, originalmente de cascalhos. O calor, já na primavera, da África do Norte. O único canto público e gratuito de praia, com areia sempre reposta pela prefeitura, fica no extremo sul da baía, ao lado do bunker do palácio dos festivais. Em 1971, e não lembro quando esse mesquinho hábito foi abandonado, não era possível sentar na "promenade de la Croisette" sem pagar alguns centavos de francos a rabugentas fiscais da orla. Eu sentava-me de propósito só para vê-las se aproximando com o bloquinho municipal de cobrança, falava em português só para encher e as obrigava a fazer mímicas absurdas para me fazer sair.

Colin Sinclair/Keystone
O luxo da Côte d’Azur, onde supostamente nasceu o topless, é misturar-se ao famosos no boulevard de la Croisette
O luxo da Côte d’Azur, onde supostamente nasceu o topless, é misturar-se ao famosos no boulevard de la Croisette
Morangos e abricós Mas e as boas recordações de Cannes? Fora o hábito que dilui o agressivo das diferenças, pequenos rituais fazem esquecer todo esse cerco de tensões. A feira livre matinal, com as provocantes e carnudas primeiras cerejas da estação, os primeiros abricós e os doces e gigantes morangos, por exemplo. Sachés com "herbes de provence" a preços de banana, por exemplo; a subida noturna à cidade histórica, medieval, em busca aleatória de um restaurantezinho simpático; a deliciosa confeitaria Maiffret, com suas exclusivas frutas cristalizadas, chocolates artesanais e a especialidade niçoise "calissons", de pasta de amêndoas com capa de hóstia; uma boa "salade niçoise" com fartas fatias de baguete crepitantes.

Ainda a possibilidade de escapadas por impecáveis auto-estradas, a proximidade romântica da velha Orange, com sua arena impecável e outras lembranças do Império Romano; de Nice (com seu deslumbrante Hotel Negresco), Grasse, com seus perfumes naturais; a cidadela de Saint-Paul-de-Vence, com todos os seus pequenos museus de impressionistas e restaurantes de roteiro gastronômico, com vinho e tudo, muitas vezes mais baratos que os bons restaurantes de São Paulo; os próprios restaurantes de Cannes, os provençais La Mère Besson e La Cave, as pizzas com perfumes inebriantes do simples e agitado La Pizza; a concorrida gastronomia mediterrânea do Félix... Bom, e claro, a fome de cinema, que essa a gente nunca mata.

Leon Cakoff, pseudônimo de Leon Chadarevian, é crítico de cinema, criador e diretor da Mostra Internacional de Cinema em São Paulo que completa 30 anos em outubro.

Hotéis

Majestic Barrière
10, boulevard de la Croisette Tel. (0/xx/33/1) 4662-44-93
Refinamento e conforto de um palácio. É protegido por jardins floridos e tem o luxo de ter uma praia privada. Diárias a partir de US$ 350.
InterContinental Cannes-Carlton
58, boulevard de la Croisette Tel. (0/xx/33/4) 9306-4006
Vista para o mar mediterrâneo. Construído em 1911, é um dos mais prestigiados hotéis do mundo. Diárias a partir de US$ 380.
Hilton Cannes
50, boulevard de la Croisette Tel. (0/xx/33/4) 9299-7000 www.hiltoncannes.com
Tem praia particular, piscina, cassino e teatro. Diárias a partir de US$ 240.

Restaurantes

La Mère Besson
13, rue Frères Pradignac Tel. (0/xx/33/4) 9339-5924
Aberto em 1930, apresenta uma cozinha tradicional com opções provençais como sopa de peixe, risoto de frutos do mar e massas com vegetais. Toda sexta-feira, a casa serve pratos à base de bacalhau.
Félix
63, boulevard de la Croisette Tel. (0/xx/33/4) 9394-0061
São cerca de 200 pratos, para todos os gostos. Tem mesas ao ar livre e um terraço com vista panorâmica, que tornam o lugar um ótimo programa.
Maiffret
31, rue d'Antibes Tel. (0/xx/33/4) 9339-0829
Uma confeitaria para passar a tarde entre xícaras de chá e calissons, a especialidade da casa. Doces de frutas cristalizadas são outro destaque.

Não deixe de ir

Boulevard de la Croisette
Jardins floridos, hotéis luxuosos e a beira-mar mais famosa da riviera
Palácio dos Festivais
Tel. (0/xx/33/4) 9339-0101 www.palaisdesfestivals.com
É onde ocorre o famoso festival de cinema. São 25 mil metros quadrados destinados à exibição e 26 salas de conferência e auditórios.

     

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