Folha de S.Paulo Moda
* número 17 * ano 4 * sexta-feira, 7 de abril de 2006
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moda / entrevista

Moda em família

Danuza Leão, Pinky e Rita Wainer -avó, filha e neta- conversam sobre moda e estilo



Pinky Wainer, Danuza Leão e Rita Wainer no jardim da Loja do Bispo, de Pinky, em São Paulo

Não são apenas os laços familiares que unem estas três mulheres: Danuza Leão, sua filha Pinky Wainer e sua neta Rita Wainer. A paixão pelas roupas é o outro elo entre elas -e delas com tantas mulheres no mundo. Danuza foi a primeira modelo brasileira a ser contratada por uma maison de alta-costura francesa (Jacques Fath) e chegou a ser fotografada por Richard Avedon. Além disso, é considerada há décadas um modelo de elegância e sofisticação no país -estilo que ela procurou democratizar no livro de etiqueta "Na Sala com Danuza". Seu novo best-seller, "Quase Tudo", dedica inúmeras páginas à sua relação com as roupas e conta, inclusive, sua experiência como dona de badaladas butiques no Rio de Janeiro da década de 70.

A artista plástica Pinky é dona de uma dos recantos mais charmosos de São Paulo, a Loja do Bispo, dedicada a objetos pessoais e de casa. Bem mais crítica que Danuza em relação à moda, ela não esconde, porém, seu fascínio pelas roupas. Rita, por sua vez, é uma das jovens estilistas em evidência em São Paulo e acaba de abrir a primeira filial de sua loja, a Theodora.

Para falar sobre moda e estilo, a Folha reuniu pela primeira vez as três mulheres, na loja de Pinky, nos Jardins.

Folha - Danuza, você teve duas boutiques no Rio, nos anos 70. Como foi essa experiência?

Danuza - Era ótimo. Eu comprava o que gostava, trazia, copiava, vendia as cópias e ficava com os originais.

Folha - A moda era basicamente européia?

Danuza - Sim. Estados Unidos, nem pensar.

Folha - As pessoas do seu círculo social não usavam roupa brasileira?

Danuza - Bem, usavam, mas era uma roupa ruim. Quem tinha dinheiro comprava lá fora. Exceto a alta-costura, que muitas vezes era feita aqui, por grandes costureiros. Depois surgiram algumas butiques em Ipanema, mas vendiam sobretudo roupa de praia.

Folha - Vocês acham que a moda brasileira, hoje em dia, tem melhor conceito?

Pinky - Na minha memória, foi depois da São Paulo Fashion Week que as coisas começaram a mudar e apareceram de fato os primeiros estilistas. Hoje eu uso principalmente roupa brasileira.

Rita - Eu já cresci com a moda brasileira. A gente até gosta de outras coisas, mas não faz muita diferença. Minha geração prefere roupa de brechó, que é incrível e ninguém tem.

Folha - Essa coisa de trazer roupa de fora para copiar já foi superado?

Pinky - Não creio, muita gente ainda faz. Basta dar uma volta na Oscar Freire.

Rita - Na minha turma, isso não acontece.

Folha - Danuza, você conta no seu livro que estudou corte-e-costura. Por quê?

Danuza - Eu era muito garota, tinha uns 12 anos, não tinha dinheiro e não havia butiques no Rio, exceto a Sloper. A gente fazia roupa em costureira, levava o modelo, ou o figurino, como chamavam, e pedia igual. Para eu poder ter mais roupas, resolvi estudar. Aprendi a cortar saia godê, o que é muito difícil, a fazer cava e botar manga.

Folha - Você estudou costura também, Pinky?

Pinky - Não, minha escola foi minha mãe. Ela sempre foi elegante e gostou de roupa. Então, vivi nesse mundo desde que nasci. Não me lembro de ver ela cozinhando, só lidando com roupas. Nunca tive vontade de fazer roupas. Eu gosto é de comprar.

Rita - E eu gosto é de vender [risos]. Mas também aprendi a costurar. A empregada que trabalhava lá em casa me ensinou. Eu tinha uns 16 anos.

Folha - Danuza, você foi a primeira modelo brasileira de repercussão internacional. As modelos eram bem recebidas na alta sociedade?

Danuza - Elas tinham o seu trabalho, mas não apareciam nas festas nem nos salões elegantes. Era apenas uma profissão, como as outras. As modelos faziam um desfile por dia, com aquelas mulheres em cadeiras douradas, que eram as possíveis compradoras, só gente muito rica. Com a massificação e a globalização da moda, é preciso vender muito. E, para isso, tem que ter muita publicidade. Dentro dessa publicidade, entram as modelos ganhando rios de dinheiro e virando popstars.

Pinky - Tenho a impressão de que são ciclos. Houve o ciclo do cinema, quando as atrizes influenciavam tudo. Hoje, estamos na era da moda, e as modelos substituem as estrelas do cinema. As grifes de moda são anunciantes fortíssimos, existe todo um trabalho de assessorias para transformar a modelo numa estrela, com o objetivo de agregar valor à marca. É toda uma coisa muito pensada para vender roupa.

Rita - Eu acho uma chatice esse estrelismo das modelos. Quando eu faço roupa, não penso numa modelo. Penso em deixar linda uma mulher normal. E uma modelo não é uma mulher normal. Acho bonito a pessoa ter estilo e personalidade, não importa o tamanho ou o peso. Claro que se ela for bonita ajuda.

Danuza - Quer dizer, há normal e normal. Claro que você não precisa ser seca feito a Gisele, mas também ter 120 kg é complicado, não é?

Pinky - Acho que a modelo vende um sonho. Assim, quando eu botar uma roupa bacana, vou me sentir bacana também.

Folha - Danuza fala em seu livro sobre a ditadura da moda. A moda chega a oprimir as mulheres?

Danuza - Não, porque hoje cada um inventa a sua moda e o seu estilo. Antigamente, você olhava para uma mulher e a definia assim: a roupa é de Balenciaga, é de Dior... Você sabia tudo! As elegantes só usavam alta-costura. Era uma ditadura mesmo.

Rita - Hoje é mais democrático. Não tem mais essa coisa de ter que vestir tal roupa para ser elegante.

Pinky - Vou discordar. Tenho um amigo que, sempre que o encontro, ele nunca está usando a roupa dele, mas um conjunto de marcas: Prada, Gucci, Calvin Klein... Tudo ao mesmo tempo. Eu acho que existe ditadura da moda hoje, sim, só que diferente do tempo da minha mãe. Você tem padrões que deve seguir, principalmente quando é jovem. Padrões definidos muito pelas marcas. Pensando bem, você vê que neste mundo, as pessoas, sobretudo os jovens, estão vestindo sempre meio igual.

Rita - Você conhece uma turma pelos códigos das roupas que ela veste. Ao ver uma pessoa, eu imagino, por meio da roupa, quem são os amigos dela, como ela pensa...



Rita Wainer na filial recém-inaugurada de sua loja Theodora

Folha - Quando vocês vão comprar uma roupa, em que pensam?

Danuza - A roupa tem que me enlouquecer. Ela me enlouquece, e eu compro. Agora, por exemplo, estou com mania de babados. Tenho loucura por eles. Então, o Guilherme Guimarães está fazendo loucuras de babados para mim...

Pinky - Eu tenho um pensamento fóbico e mentiroso em relação à roupa. Eu olho para uma roupa e falo: essa eu vou comprar porque ela vai durar 15 anos e eu nunca mais vou precisar comprar uma igual, um blazer preto, por exemplo. Aí, toda semana, depois de comprar, eu digo: ah, mas não era esse blaser, era um outro. E continuo comprando. Mas sempre tenho a intenção de montar um guarda-roupa que seja perfeito e eu não precise comprar mais nada.

Rita - Eu compro superpouco, porque enjôo da roupa, passo o dia inteiro com tecido, com costureiras etc. Roupa é meu trabalho e não minha diversão. Eu compro de brechó e ganho muito de herança, graças a Deus, da Danuza e da Pinky, porque sou a única mulher na linha sucessória da família.

Folha - O que faz uma mulher elegante hoje e como vocês definiriam o estilo de cada uma?

Danuza - Olha, não sei. Agora, por exemplo, voltei aos anos 60. Meu ídolo é o Mick Jagger. Quero vestir igualzinho a ele. Então, é jeans e camiseta apertadinha, que eu sempre adorei.

Pinky - Meu estilo é o mesmo de 15 anos atrás: fóbica, minimalista...

Rita - Clássica.

Pinky - Clássica, tentando ficar completamente imperceptível. Quero passar batido, mas com sofisticação. Então quero a melhor saia preta, a melhor camisa, o blaser mais incrível...

Danuza - Mas que ninguém veja...

Pinky - Só eu.

Rita - Acho que a Danuza é exuberante e minha mãe é clássica. Eu penso que sou uma mistura das duas.

Folha - Vocês acham que se arrumar muito é sinônimo de beleza, ou é preferível ficar mais natural?

Danuza - Eu não quero ficar mais natural. Quero ficar linda.

Pinky - Prefiro ficar mais natural.

Rita - Hoje em dia a beleza é você ser diferente. TIROTEIO FASHION

ESTILISTA
Danuza Yves Saint-Laurent
Pinky Chanel
Rita São tantos bons...

JÓIA OU BIJUTERIA INDISPENSÁVEL
Danuza Pulseira. Brinco para mim acabou
Pinky Um brinco de pérola bem pequeno
Rita Muitas pulseiras e grandes

ASSESSÓRIO FUNDAMENTAL
Danuza A bolsa
Pinky Uma camisa branca
Rita Uma calça jeans linda

PEÇA-FETICHE
Danuza É a minha camisa tipo safári do Saint-Laurent
Pinky Uma sapatilha Chanel
Rita A camisa tipo safári da Danuza

QUANDO SE SENTIR FEIA...
Danuza Vá ao cabelereiro
Pinky Lave o cabelo
Rita Faça compras

O QUE EVITAR SEMPRE
Danuza As mulheres podem tudo
Pinky Como Chanel aconselhou, olhe-se no espelho e tire alguma coisa antes de sair
Rita Marquinha de biquíni

DICA PARA FICAR ELEGANTE
Danuza Uma boa calça ou um bom jeans. Uma camiseta. E uma bolsa e um sapato maravilhosos
Pinky Uma mulher elegante é uma mulher assumida
Rita Ela tem que ser coerente e segurar a onda da roupa que está usando, por mais ousada que seja

Loja do Bispo: r. Dr. Melo Alves, 278, tel. (11) 3064-8673; Theodora: r. Tinhorão, 72, tel. (11) 3826-8122

por Alcino Leite Neto e Camila Yahn
fotos Amilcar Packer

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