Folha de S.Paulo Moda
* número 18 * ano 5 * sexta-feira, 11 de agosto de 2006
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moda / mexericos da candinha

Quando o figurino mandava



por Patricio Bisso

Minhas caras desorientadas:

Gostaria muito de poder lhes dizer que na próxima temporada as saias vão estar uns dez centímetros acima do joelho. Adoraria poder decifrar se, no ano que vem, as cores vão ser berrantes ou pastel. E nada me deixaria mais feliz do que prognosticar se as influências puxam mais para o militar do que para o folclore russo, ou se as lapelas vão ser largas ou estreitas. Mas sinto muito, minhas queridas, desafortunadamente eu não posso.

Nestes últimos anos, para o bem ou para o mal, a moda tem virado um vale-tudo, e até o que era considerado horrível alguns anos atrás pode ser que os estilistas voltem a reciclá-lo.

Aliás, reciclar parece ser o último recurso dos covardes (patriotismo já era). Os anos 70 foram revisitados até o cansaço, agora quero ver o que é que eles vão glorificar como significativo dos 80 (não, aquelas ombreiras horríveis fora de lugar não, por favor!). E, se as coisas continuarem assim, preparem-se para a volta dos 90, com todos aqueles grunges esfarrapados. Ou, então, a volta daquelas estampas Versace, quanto mais barrocas melhor.

Antigamente (sim, já sei que todo tempo passado parece melhor), era delicioso ver como Yves Saint Laurent se inspirava na década de 40 para fazer as suas coleções. Mas, depois, todo mundo fez a mesma coisa, e um chapéuzinho com “voilette” virou uniforme de madrinha em casamento. Fico com pena desses jovens que tentam achar graça nos filmes dos anos 80. Porque agora todos vão querer fazer de novo o “new romantic”, talvez modelinhos “new wave” ou túnicas “new-alguma-coisa”. Tenha a Santa Paciência!

Em Los Angeles o que eu tenho visto nas vitrines é uma versão muito cara e bem feita do bom e velho hippie-chic (maria-mijona dirão alguns; o Telmo Martino apelidou-as de “a turma do poncho-e-conga”, não é perfeito?) Ou, senão, uns vestidos longos tipo sereia dos anos 30, com muito bordado e tecidos estonteantes, mas que só ficam bem no tapete vermelho na noite de entrega do Oscar.

Nas lojas de “vintage”, então, só tem aquelas sainhas rodadas tipo Christian Lacroix ou, senão, na loja que eu mais gostei, apenas camisetas (impecáveis, o que é dificílimo de achar), expostas nesses torsos de alta costura, como se fossem verdadeiras jóias. Só que são aquelas com um par de cerejas (um clássico), a língua dos Rolling Stones em glitter, ou aqueles quatro do Kiss pulando.

E a mais cara é um original do “I love New York”. Claro que com o coração em vermelho!

Nas fotos dos desfiles, das únicas coisas que eu gosto são aqueles vestidões enormes, impossíveis de você entrar com eles num carro comum (me lembro que uma vez fui numa festa usando o meu Balenciaga original e tive que alugar uma kombi para chegar). E dizem que agora as coleções são consideradas “espetáculos”. Tudo bem, mas gostaria de ver alguma coisa que desse para pegar o metrô. No final de “Candide” (lembram da namorada dele, a Cunegonda? Que nome ótimo!), após o protagonista ter passado o diabo, o Voltaire achou melhor tomar conta do seu próprio jardim. Mas como agora quase todas moramos em apartamento...

PATRICIO BISSO, 49, é diletante e futura bicha-do-mato.

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