Revista da Folha

+dinheiro

16/04/2007

Novas oportunidades: ÁLCOOL, combustível (e investimento) do futuro

Por enquanto, o jogo está restrito ao clube dos milionários, mas o pequeno aplicador tem meios para não ficar de fora

por ANDRÉ PALHANO

O entusiasmo mundial com o álcool produzido no Brasil está contagiando o mercado financeiro, mas por enquanto os eventuais ganhos situam-se mais no plano da expectativa do que da realidade imediata. Se o álcool é o combustível do futuro, o investimento em álcool é a renda do futuro. Hoje, apenas os grandes investidores participam desse jogo. São eles que têm disponíveis os muitos milhões de reais necessários para aplicar em participações diretas nas construções de novas usinas ou em fundos de investimento fechados.

Alguns desses fundos têm gestores de renome. É o caso de Roberto Rodrigues, ex-ministro da Agricultura, e de Felipe Reichstul, ex-presidente da Petrobras. O fundo criado por Reichstul, o Brazil Energy — cuja meta é captar US$ 2 bilhões para investir na produção e exportação do etanol brasileiro —, tem a participação de pesos-pesados do mercado financeiro global, como James Wolfenson, ex-presidente do Banco Mundial, e Vinod Khosla, o fundador da Sun Microsystems.

Para quem não tem carteirinha desse clube, resta esperar. Na medida em que os primeiros grandes investimentos gerem resultados e consolidem um modelo de negócios, a possibilidade de o pequeno aplicador participar do jogo será cada vez maior. "Num primeiro momento, é natural que o retorno gerado por esse tipo de negócio, de maior risco, fique concentrado na mão de poucos agentes. Com a necessidade de aumento da alavancagem (busca por novos recursos), no entanto, isso tende a ficar mais pulverizado. Nesse segundo momento, surgem os produtos de varejo, como os fundos de investimento", avalia Alfredo Neves Penteado Moraes, presidente da Associação Nacional das Instituições do Mercado Financeiro (Andima).

Consolidação

Quanto tempo o pequeno investidor terá de esperar? Alguns anos, dizem os especialistas. Hoje, o setor passa por uma fase de consolidação. Os recursos, empregados em novos projetos ou na aquisição de empresas tradicionais, vêm de fundos de investimento de maior risco,

A necessidade de novos recursos para alavancar os investimentos abre as portas para os fundos de varejo

como os de venture capital ou de private equity.

Roberto Assunção/Folha Imagem
A demanda interna de álcool ganhou força com os carros bicombustíveis
A demanda interna de álcool ganhou força com os carros bicombustíveis

"A chance para esse investidor de menor porte estará sobretudo nas emissões de ações em Bolsa de empresas com relação direta ou indireta do setor sucroalcooleiro, que ainda são poucas, mas que tendem a crescer nos próximos anos", afirma Marcus Regueira, presidente da Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital.

Entre as primeiras a abrir o capital estão a Cosan e a Usina São Martinho. Foi com ações desta última que a professora Margarida Chioquette Alves, de Piracicaba, interior de São Paulo fez um pequeno investimento. Ela comprou os papéis no lançamento das ações, na Bovespa, em fevereiro. Apesar de a empresa ser desconhecida até então, as ações chegaram a valorizar de 18% no dia da abertura do capital. Um dia depois, a professora vendeu os seus papéis e embolsou um bom adicional para as contas da casa naquele mês.

Pouco tempo depois, aplicou os recursos que o marido recebeu da empresa onde trabalha para comprar mais ações da usina. "Apesar de ser um valor pequeno, o retorno foi bastante positivo. Sei que esse é um investimento de risco e que ninguém deve comprar ações com dinheiro que pode precisar amanhã, mas esse não era o meu caso e nem é agora também", conta a professora.

Fundos de varejo

Outras alternativas podem ser vistas no horizonte dos pequenos e médios investidores. Para conseguir mais dinheiro, as empresas deverão criar estruturas com recebíveis e emissão de debêntures (títulos de renda fixa garantidos pelo patrimônio da empresa). Além disso, os fundos de varejo dedicados a empresas ambientalmente responsáveis começam a ganhar corpo em outros países e logo devem se tornar realidade no Brasil.

Joel Silva/Folha Imagem
Operário na usina Batatais de Ribeirão Preto prepara-se para dar início ao trabalho de moagem da cana
Operário na usina Batatais de Ribeirão Preto prepara-se para dar início ao trabalho de moagem da cana
Todo entusiasmo que cerca o álcool no Brasil também traz consigo riscos inerentes ao negócio. Basta, por exemplo, que uma nova tecnologia mais barata ou mais eficiente seja descoberta e torne-se viável para o consumidor final. A competição de outros países pela produção do álcool e a busca por fontes alternativas, como o etanol a partir da celulose, também pode trazer reflexos desfavoráveis num futuro próximo. Mais: todo o apelo ambiental do álcool produzido a partir da cana-de-açúcar, mais limpo que o oriundo de outras fontes, pode encontrar problemas diante do impacto gerado pelas vastas áreas de plantação necessárias.

O risco de que se trate de uma bolha, no entanto, é praticamente nulo. Além da demanda interna, que ganhou força com a produção em massa dos carros bicombustíveis, a demanda externa pelo produto é crescente, em decorrência das limitações de ordem ambiental ou econômica

A descoberta de novas tecnologias e a competição de outros países trazem riscos para o álcool brasileiro

em outros países produtores de etanol. "Ao contrário do que ocorreu no passado, quando os preços do petróleo definiam o apoio ao álcool no Brasil, hoje o setor passa por um processo irreversível de consolidação", afirma a vice-presidente de Operações Estruturadas do Banco WestLB, Angélica Wiegand. "Até porque há outros fatores irreversíveis, como a questão ambiental e a estratégia de governos de não dependerem de fontes únicas de combustível", diz.

Gigante global


O que fez o mundo acordar para o etanol brasileiro tem a ver com três fatores, segundo Sérgio Thompson-Flores, presidente da Infinity Bio-Energy, empresa criada há pouco menos de um ano com o objetivo de adquirir, construir e operar usinas de álcool e açúcar com foco no Brasil, onde já investiu US$ 200 milhões em aquisições. Os fatores são os seguintes:
  • o consenso de que a questão ambiental requer medidas maiores e mais urgentes do que as adotadas de fato até aqui
  • a percepção de que o álcool é o meio mais eficaz de redução de emissão do gás carbônico no curto prazo
  • o fato de que o Brasil é o único país que pode aumentar a produção sem gerar desequilíbrios
Não por acaso o álcool teve lugar de destaque na agenda da visita que o presidente americano George W. Bush fez ao Brasil em março. Detentor de um terço do álcool combustível produzido no mundo, o Brasil só fica atrás dos Estados Unidos no ranking de produtores. E conta com importantes vantagens comparativas em relação ao produto americano.

Há, para começar, o fato de ser produzido a partir da cana-de-açúcar, uma fonte mais barata, mais limpa e mais eficiente do que o milho usado nos EUA. Há também toda a tecnologia obtida em três décadas de utilização intensiva do produto no país. E há ainda o potencial de novas áreas de cultivo, algo raro nos países desenvolvidos, além do clima favorável, que dispensa a utilização de irrigação artificial, atualmente um sério problema para grandes produtores como a Índia ou a China.

A simples possibilidade de se tornar um gigante global na produção de energia renovável despertou não somente a atenção de governos vizinhos, mas também a de investidores. Nos últimos meses, bilhões de dólares aportaram no Brasil em busca de novos investimentos no setor de álcool. De acordo com as projeções da Unica, entidade representativa do setor, somente a construção de novas usinas demandará US$ 14,6 bilhões até o final da safra 2012/2013. São 73 unidades já anunciadas, o que dá em média uma nova usina por mês nos próximos seis anos. Se incluídos os projetos que ainda estão em análise, esse número cresce substancialmente.

As perspectivas para o Brasil são boas. "Temos uma oportunidade extraordinária de criar uma nova commodity energética em nível global, da qual seríamos um grande fornecedor em escala global, senão o maior", afirma Flores. Mas ele próprio adverte: "Isso dependerá das políticas em relação ao uso do etanol daqui para frente, tanto no Brasil como em outros países".

Para quem quer investir em álcool, o acompanhamento desse percurso será decisivo para determinar o potencial do ganho.

FolhaShop

Digite produto
ou marca