Revista da Folha

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16/04/2007

Imposto de Renda: Como alimentar o leão sem ser depenado

A declaração deste ano permite novas deduções; confira se você pode se beneficiar delas

por MARCOS CÉZARI

Ao mesmo tempo em que fecha o cerco aos sonegadores, com o uso cada vez mais intensivo do cruzamento de informações computadorizadas, a Receita Federal abre algumas brechas ao contribuinte que quiser levar vantagem ao declarar o Imposto de Renda deste ano.

Ilustração-Orlando Pedroso
Vantagem é maneira de dizer. Afinal, "tributar consiste em retirar todas as penas do ganso, sem matá-lo", como afirma Everardo Maciel com a autoridade de sua longa experiência como o secretário da Receita Federal do governo FHC (1995-2002), quando promoveu o maior salto de eficiência do órgão.

A duas semanas para o encerramento do prazo para declarar, o contribuinte que se propuser a não entregar o indevido de mão beijada para a Receita terá de tentar mapear um território por vezes inóspito ao amador: as savanas de regras do que pode e não pode ser feito diante do leão faminto.

Uma das brechas mais vantajosas pode ser usada pelos contribuintes que pagam e recebem pensão alimentícia. Mas, cuidado: vale apenas para os casos em que há decisão judicial ou acordo homologado judicialmente. Quando, por exemplo, a pensão é paga ao outro cônjuge e a dois filhos, boa parte do rendimento do contribuinte (e da "família") ficará isenta.

Se pagar R$ 1.300 por mês a cada um, R$ 3.900 da renda mensal do contribuinte não serão tributados —se for assalariado, a empresa deduz esse valor e o dinheiro vai para as contas bancárias do cônjuge e dos filhos; se for autônomo, os R$ 3.900 são descontados na hora de calcular a renda mensal para o pagamento do carnê-leão.

Assim, poderão ser feitas três declarações individuais (basta que os filhos também tenham CPF, qualquer que seja a idade) sem o pagamento de imposto, uma vez que a renda anual de R$ 15.600 de cada um estará isenta. No total, R$ 46.800 por ano dessa "família" não poderão ser alcançados pelas garras do leão.

A escolha do modelo certo

Outra opção vantajosa é o uso de modelos diferentes de declaração entre marido e mulher, especialmente se tiverem filhos em idade escolar.

O cônjuge que tem o maior rendimento deve usar o modelo completo e abater todas as despesas permitidas pela legislação.

Despesas de instrução com filhos portadores de deficiência física ou mental valem como despesa médica

O outro cônjuge deve usar o modelo simplificado, pois poderá abater até 20% da renda tributável (limitada a R$ 11.167,20 neste ano) sem comprovação dos gastos. Se for até mais vantajoso, ambos podem usar o simplificado.




Podem salvar algumas penas a mais os casais que tenham uma fonte extra de renda, de um bem comum (aluguel de um imóvel, por exemplo). Para pagar menos, basta que façam declarações individuais e dividam (metade para cada um) o valor recebido em 2006. Podem ainda lançar a renda em uma só declaração, se for mais vantajoso.

Uma das maiores vantagens permitidas pelo fisco abrange um universo menor de contribuintes —aqueles que têm filhos portadores de deficiência física ou mental estudando em escolas especializadas. Nesse caso, as despesas com instrução são lançadas como despesa médica. Assim, o abatimento é integral (e não limitado a R$ 2.373,84 por dependente).

Uma novidade nas declarações deste ano beneficia o contribuinte que tem empregado doméstico. Ele poderá abater a contribuição patronal paga ao INSS, desde que limitada a um empregado por declaração no modelo completo (inclusive quando feita em conjunto) e sobre um salário mínimo. Serão R$ 522 (desde que o empregado não tenha gozado férias em 2006), ou R$ 534 (férias gozadas entre dezembro de 2005 e março de 2006) ou R$ 536 (férias de abril a novembro).

Juca Varella/Folha Imagem
Everardo Maciel, para quem tributar consiste em retirar as penas do ganso, sem matá-lo
Imposto no exterior

Por último, há uma vantagem para o contribuinte que paga imposto no exterior. Esse pagamento (quando são declarados rendimentos obtidos fora do país) pode ser compensado com o imposto devido aqui. Isso é possível nos casos em que o Brasil possui acordo com o outro país (de reciprocidade de tratamento ou para evitar a bitributação).

Lembrete importante: o que enfurece o leão é o desrespeito às regras que ele criou. Nesse caso, a resposta vem rápida: a declaração fica presa na malha fina e o contribuinte é convocado para prestar esclarecimentos. Se não comprovar os valores declarados, terá de acertar as contas depois. Aí o troco vem com juros e multas pesadas. Eis algumas situações em que o leão se sente provocado:
  • omitir uma ou mais fontes de renda ou qualquer rendimento
  • não informar contas bancárias ou a compra ou venda de um bem ou direito (quando exigidas pela legislação)
  • indicar o mesmo dependente ou a mesma despesa (escola, por exemplo) como abatimento em duas declarações
  • deduzir despesas com material, transporte e uniforme escolar, com aulas particulares ou de idiomas, cursinhos e informática
  • deduzir despesas médicas reembolsadas por plano de saúde ou pela empresa
  • deduzir despesa médica sem o correspondente recibo ou por meio de um recibo "frio" (quando não há consulta ou tratamento)
  • deduzir despesas com remédios, com óculos, com lentes de contato e com aparelhos para surdez
  • omitir qualquer pagamento a pessoas físicas (mesmo que não seja dedutível) e a pessoas jurídicas (quando constitui despesa dedutível)
  • deduzir despesa com pensão alimentícia que não tenha respaldo em acordo homologado judicialmente ou em uma decisão judicial.
Albert Einstein, que não via maiores dificuldades em sua Teoria da Relatividade, achava o fisco algo complicado. "A coisa mais difícil de entender no mundo são os impostos", dizia. Embora o físico se referisse mais ao conceito do que às regras, a lista do parágrafo acima não deixa de dar razão a ele. Tê-la em mente, no entanto, pode limitar o estrago no ganso.

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