Revista da Folha

+dinheiro

16/04/2007

Previdência: Aposentar em dólar?

É possível, mas um plano complementar no exterior só vale a pena para quem pretende morar fora do país

por EDSON PINTO DE ALMEIDA

A idéia de ganhar em dólar e gastar em real tem potencial para seduzir muito futuro aposentado. Afinal, a longo prazo, que é a perspectiva de quem pensa em aposentadoria, a moeda americana tem, por sua história e por sua característica de reserva mundial, maior chance de se manter forte. O mesmo raciocínio pode ser aplicado ao euro, embora a moeda européia seja mais jovem que a brasileira.

Feblacal/Dreamstime.com
A menos que o poupador pretenda desfrutar da aposentadoria no exterior, no entanto, apostar numa previdência em moeda forte pode não ser uma opção vantajosa. Em primeiro lugar, não se deve perder de vista que o descasamento de moeda entre receita e despesa é um risco, e que o aposentado é, por natureza, avesso ao risco.

De qualquer maneira, mesmo sem levar em conta o aspecto cambial, há uma vantagem surpreendente na escolha de uma previdência privada em real. Surpreendente porque, num país que ostenta uma das maiores cargas fiscais do mundo, está associada ao aspecto tributário. Acredite: a principal vantagem da previdência nacional é a menor tributação. "Com a nova tabela regressiva do Imposto de Renda e a possibilidade de deduzir até 12% das aplicações, o PGBL (Plano Gerador de Benefício Livre) é um produto sem comparação no mercado internacional", afirma Renato Russo, diretor da Associação Nacional da Previdência Privada e Vida (Fenaprevi) e vice-presidente da Sul América Seguros de Vida e Previdência.

Benefício fiscal

A conta que ele faz é relativamente simples: as aplicações feitas num PGBL podem ser abatidas do Imposto de Renda até o limite de 12% da renda bruta. Significa que o dinheiro da dedução, em vez de ir para os cofres da Receita, pode ser reinvestido no plano de previdência e engordar o patrimônio. Uma pessoa que recebe, por exemplo, R$ 5 mil de salário e investe R$ 300 por mês num fundo de investimento, pela regra do PGBL, poderia investir R$ 413,79 no plano de previdência e ficar com o mesmo valor líquido do salário. Além disso, se optar pela tabela regressiva do Imposto de Renda – que vale também para outros investimentos – pagaria na hora de resgatar a aposentadoria apenas 10% para o Fisco, se o período de poupança for igual ou superior a 10 anos.

Ivonne Wierink/Dreamstime.com
A tranqüilidade financeira no futuro depende da escolha do plano de previdência mais adequado; para quem não vai morar fora, o melhor é poupar em real
A tranqüilidade financeira no futuro depende da escolha do plano de previdência mais adequado; para quem não vai morar fora, o melhor é poupar em real
Um plano de previdência privada contratado no exterior não tem esses benefícios fiscais. O valor recebido de aposentadoria ou do resgate efetuado recebe o mesmo tratamento de um aluguel. É preciso recolher o carnê-leão e fazer o ajuste anual na declaração do Imposto de Renda. Segundo a Receita Federal, os ganhos de capital obtidos no exterior são tributados em 15%, depois de convertidos pelo dólar médio. Se houver tributação no exterior, o valor pode ser compensado no Brasil.

Outro ponto importante é o da segurança do investimento. Não há consenso sobre a legislação. Especialistas afirmam que não há nada na lei que impeça a contratação de um plano de previdência no exterior – no caso de pessoa física.

Até executivos que trabalham fora do país permanecem com seus planos de previdência no Brasil para não perder as garantias

Já a Superintendência de Seguros Privados (Susep), autarquia vinculada ao Ministério da Fazenda, responsável pelo controle e fiscalização dos mercados de seguros e previdência privada, nega essa possibilidade, embora reconheça que a legislação (lei 109/2001) seja omissa a esse respeito.

A questão mais importante é a limitação da garantia. Mesmo que a contratação seja legal, o que a Susep afirma é que, se houver qualquer problema com o investimento lá fora, por qualquer motivo, não há nada que ela possa fazer para defender o interesse do investidor. É problema dele para ser resolvido fora do Brasil. A advogada Andrea Nogueira Neves, do escritório Velloza, Girotto e Lindenbojm – especializado no assunto – explica que no caso dos planos de previdência não há regra clara, como existe para os seguros em geral. A lei complementar 126, de janeiro de 2007, diz: só podem ser contratados no exterior seguros para os quais não exista oferta no país ou cuja vigência seja restrita ao período que a pessoa vá passar no exterior.

A interpretação da advogada é que a contratação do plano de previdência privada só não será legal caso haja algum tipo de seguro vinculado ao plano. "De qualquer forma, não parece ser uma boa alternativa, levando-se em conta todas as variáveis", diz. Mesmo executivos brasileiros de multinacionais quando são expatriados permanecem com seus planos de previdência vinculados ao Brasil – para não perder as garantias legais.
Feblacal/Dreamstime.com

Leve em conta antes de investir

Câmbio

O perigo está no período de acumulação. Enquanto há paridade de moedas, tudo bem. Se o Real desvalorizar, a quantia a ser poupada cada mês aumenta

Juros

Mesmo com as taxas em queda, ganha-se mais no Brasil. Um título do Tesouro americano paga no máximo 5% de juros anuais. Um fundo conservador aqui rende pelo menos 8% ao ano

Impostos

A renda em dólar é tributada em 15% como ganho de capital. A previdência privada brasileira permite deduzir as contribuições do Imposto de Renda, no caso do PGBL. E, depois de dez anos, a mordida na renda mensal é de 10%

Segurança

Os planos feitos no exterior não são protegidos por nenhuma lei brasileira de defesa do consumidor. Aqui há regulamentação a respeito e regras definidas

Para Marcelo Teixeira, diretor superintendente do HSBC Seguros, o principal atrativo dos planos de previdência no exterior, sobretudo nos Estados Unidos, é a sua flexibilidade, seja na hora de escolher a forma de receber o benefício, seja na forma de gestão dos recursos no período de acumulação. Aqui no Brasil há mais rigidez, em nome da segurança. Um fundo não pode investir mais do que 49% do patrimônio em ações, por exemplo. "Nosso mercado ainda está amadurecendo e a tendência é evoluir para uma abertura maior", diz o executivo.

Falta regulamentação

Entre os produtos que já existem lá fora e para os quais há estudos visando a sua implantação aqui, destacam-se pelo menos três: um deles permite utilizar o patrimônio acumulado como garantia para financiamento imobiliário; outro adiciona ao plano isenção tributária nos rendimentos para formar poupança direcionada a cobrir despesas médicas e com medicamentos; e o terceiro permite dar garantia a financiamento para despesas com educação.


O lançamento desses produtos depende sobretudo de regulamentação. A principal lei que ainda não foi regulamentada é a da blindagem dos planos. Hoje as cotas dos fundos de previdência ficam em nome das seguradoras, embora separadas de seu patrimônio. O investidor também pode trocar de instituição sem perda de seu patrimônio – é o que o mercado chama de portabilidade. Com a blindagem, as cotas passam para o nome do investidor, o que dá ainda mais segurança ao investimento em caso de quebra ou falência da seguradora. Assim, com a cota nominal à pessoa física, é possível utilizar o recurso como uma espécie de caução para financiamentos.

"A tendência do mercado brasileiro é a diversificação, de acordo com a demanda. O importante é que continuem sendo adotadas medidas que orientem o consumidor e garantam total transparência na gestão dos recursos", diz Renato Russo.

FolhaShop

Digite produto
ou marca