Revista da Folha

Morar

30/03/2007

Vale a pena?: Janela discreta

Prós e contras dos modelos acústicos, projetados para atenuar a poluição sonora das cidades

por CHANTAL BRISSAC

Caio Esteves/Folha Imagem
Basta falar em lugares barulhentos e o pior cenário que vem à cabeça é a vizinhança de um aeroporto. Não que não seja; só não é o único nem o mais sentido em uma metrópole.

Os bairros próximos a Congonhas, na zona sul, são submetidos a ruídos que alcançam facilmente os 70 decibéis, 20 acima do que a Organização Mundial de Saúde considera organicamente suportável sem seqüelas.

O problema é que o limite da OMS -50 decibéis- é o equivalente a uma rua sem tráfego de veículos, o que, convenhamos, deixa a maior parte dos paulistanos fora do padrão saudável. Sem falar de conversas e gritos festivos durante a madrugada, música alta, buzinas, freadas etc. Ou das manifestações do tal melhor amigo do homem.

Caio Esteves/Folha Imagem
Janela em vidro duplo laminado, com borrachas de vedação em EPDM (material não derivado do petróleo); o modelo promete reduzir 42dB
Janela em vidro duplo laminado, com borrachas de vedação em EPDM (material não derivado do petróleo); o modelo promete reduzir 42dB
"Alguns barulhos, como os latidos de cães, são os piores de eliminar, pelo tipo de freqüência, que varia de 20 a 200 Hz para latidos graves e 200 a 2.000 Hz para latidos médios", explica Paulino Lyrio, proprietário da Acoustic Line. Para se ter uma idéia, uma buzina de carro atinge 125 Hz e um caminhão 1.000 Hz.

Epa!, hertz ou decibéis? Os dois, porque nesta combinação é que mora uma boa solução anti-ruído. O decibel (dB) mede o volume ou a intensidade do barulho. A palavra significa um décimo do bel e foi criada como homenagem a Alexander Graham Bell, o inventor do telefone.

Já o hertz (Hz) é a unidade de medida da freqüência de um som, ou seja, se ele é grave ou agudo. Quanto mais grave, menor a freqüência; quanto mais agudo, maior. Para ele usa-se o frequencímetro. É o som que mais estressa o ouvido humano, quando este é submetido a ele por um longo período, sem interrupções.

"Por uma herança ancestral, fruto de nossa evolução genética, somos mais sensíveis às freqüências médias, como as de latidos de cães e cantos de pássaros", explica o engenheiro e consultor acústico Alexandre Sresnewsky.

O médico otorrino Mário Munhoz, da Unifesp, explica que o homem não é capaz de ouvir todas as freqüências, mas apenas aquelas que estão na faixa sonora que vai dos 10Hz até os 35 Hz. Por isso, recomenda Paulino Lyrio, da Acoustic Line, é preciso escolher empresas especializadas que enviem técnicos para avaliar o nível e o tipo de ruído.

Reduzir o barulho dentro de casa está longe de ser um problema insolúvel, mas esbarra na questão das prioridades na moradia. Se o conforto acústico estivesse no topo da lista dos consumidores, as janelas anti-ruído seriam item fundamental de qualquer projeto desde o início. Bastaria para isso apostar em paredes espessas, lajes bem vedadas e janelas anti-ruído.

"Mas, infelizmente, o fortalecimento da construção é hoje menosprezado, em prol de facilidades questionáveis como churrasqueira e ‘lan house’", afirma Alexandre Sresnewsky.

Ruídos constantes como os de aviões a jato, britadeira, motoserra e tráfego pesado, na faixa dos 120 decibéis, podem causar dor de cabeça, danos ao labirinto e até perda auditiva
Por culpa coletiva, é bom dizer. Para as construtoras, dotar as áreas comuns dos edifícios de equipamentos de lazer é sempre bem mais barato do que investir em melhorias em cada uma das unidades. Além disso, a tecnologia anti-ruído dá sossego aos ouvidos, mas não enche os olhos e encarece o preço final dos apartamentos. Faça uma enquete: quantos abririam mão da piscina ou do salão de festas para ter uma casa mais bem acabada e também silenciosa?

O raciocínio, por incrível que pareça, vale até para os bairros vizinhos do supremo vilão, o aeroporto.

"Eu acordo com o barulho dos aviões no meio da madrugada; eles parecem que vão entrar dentro da minha casa", diz a pedagoga Maria Cristina Proença, moradora de Moema, uma das áreas mais afetadas. Dependendo do dia, Congonhas pode funcionar até 1h30.
Conselhos dos especialistas

1. Lembre-se de que, quanto maior a espessura do vidro, melhor o isolamento

2. O vidro laminado oferece melhor isolamento acústico do que um monolítico de mesma espessura

3. O PVB (polivinilbutiral) entre os vidros melhora o isolamento acústico e reduz a influência da freqüência crítica

4. A freqüência de ressonância diminui com o aumento da espessura dos vidros e o tamanho da câmara de ar que os separa. O vidro duplo insulado é ideal para isolamento termoacústico

5. Quem quer isolar sons graves, de caminhões, motos, motores e carretas, por exemplo, deve investir em vidros triplos. Por ter freqüência de 500 a 40 Hz (médias graves e graves), o ideal é usar vidros laminados com espessuras diferentes (4 mm ou 5 mm) ou até duplos com ar no meio e sempre espessuras diferentes

6. Em substituição ao ar seco desidratado obtido no interior da câmara do vidro, o modelo de vidro duplo insulado com gás é eficiente para isolar médias e altas freqüências, caso dos latidos de cães

7. Os sons agudos, com freqüência acima de 2.000 Hz, são isolados com vedação perfeita e um vidro de 10 mm no mínimo

FONTES: Alexandre Sresnewsky, engenheiro acústico; Claudia Mitne, arquiteta e gerente de marketing da Glassec - Vidros de Segurança; Paulino Lyrio, diretor da Acoustic Line; Paulo Duarte, arquiteto e consultor.
Caio Esteves/Folha Imagem
Esquadria de alumínio com vidro tríplo
Esquadria de alumínio com vidro tríplo
Com vidros duplos, triplos ou até quádruplos e esquadrias preenchidas com borracha, lã de vidro ou outro material elástico, os produtos disponíveis no mercado prometem reduzir em até 70% os ruídos.

"Se forem feitas com vidro laminado (reforçado) e tiverem uma vedação perfeita, há essa melhora", afirma Paulo Duarte, arquiteto e consultor, que recomenda vidros com mais de 12 mm em áreas com alta poluição sonora.

Sresnewsky sugere vidros de no mínimo 10 mm e muito bem vedados, com caixetas e frisos de alta qualidade. "Qualquer furinho ou fresta põe tudo a perder", diz ele.

Quem mora em apartamento e não pode alterar a fachada do edifício encontra opções para serem instaladas pelo lado interno, que podem ser abertas e que não têm necessidade de quebra-quebra.

Outra vantagem dessas janelas é o conforto térmico -os vidros mantêm a temperatura interna, economizando energia com a calefação. A desvantagem é que a pessoa vive praticamente num "bunker", sem abrir uma fresta, e precisa colocar ar-condicionado para suprir a falta de ventilação.

Sem contar que o preço do silêncio é um tanto perturbador. Em pesquisa com quatro dos maiores fabricantes, a reportagem constatou que uma janela padrão, de 1,20 m x 1,20 m, não sai por menos de R$ 1.200. Ou seja, quem quer todos os cômodos isolados precisa desembolsar uma bela quantia.

"Mesmo com esse custo, acho que vale a pena", diz a professora de inglês Adrianna Saldanha, que mora na avenida Nove de Julho e colocou janelas duplas nos três quartos de seu apartamento. "O som dos ônibus era infernal. Minha vida é outra depois disso", resume.

Não é exagero. Gerente da Atenua Som, Annie Fischer conta que há pessoas que chegam em plena crise ao show-room da empresa. "Uma cliente apareceu aos prantos, dizendo que estava com os nervos à flor da pele por não conseguir dormir."

O tamanho do barulho*
FontesHertzSintomas
Jatos, trio elétrico13060/300Dor, perda auditiva, danos ao labirinto
Motoserra ou caminhões pesados12060/15 milDor, perda auditiva, danos ao labirinto
Banda de rock ou britadeira100500Perda auditiva, dor de cabeça
Furadeira81500/1.000Perda auditiva, aumenta 25% a taxa de colesterol
Latidos de cães70500/1.000Irritação e fadiga
Rua com trânsito intenso80300Aumento da pressão arterial e do batimento cardíaco
Som de escritório, computador60 a 70200Desconforto, irritabilidade
* as freqüências podem variar, de acordo com as características da fonte sonora

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