São Paulo, terça-feira, 06 de março de 2001


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A MORTE DE COVAS

Ascensão de tucanos mais jovens, como Aécio, presidente da Câmara, no plano nacional, e Alckmin, governador, teve aval de Covas

Morte de líder abre nova fase no PSDB

ELIANE CANTANHÊDE
DIRETORA DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Mário Covas era o principal líder do PSDB, e sua morte abre uma nova fase no partido, em âmbitos estadual e nacional, com a ascensão de estrelas mais jovens, como Geraldo Alckmin, que o substitui no governo de São Paulo, e o deputado Aécio Neves, recém-eleito presidente da Câmara.
Dos sete fundadores do PSDB em 1988, Fernando Henrique Cardoso dirigiu prioridades e energias para o governo, Covas e Franco Montoro estão mortos e os paranaenses José Richa e Euclides Scalco abandonaram o partido e a política. Sobram na ativa os ministros José Serra (Saúde) e Pimenta da Veiga (Comunicações).
Outro líder nacional tucano é o governador Tasso Jereissati, do Ceará, que recebeu apoio público de Covas na disputa com Serra para se lançar candidato à Presidência da República em 2002.
De todos, Covas sempre foi considerado o líder mais forte, respeitado e representativo do PSDB, inclusive Äou principalmenteÄpela geração de Alckmin e Aécio.
"O Covas é e vai continuar sendo nossa principal referência política", diz o mineiro Aécio Neves, ao classificar o apoio do governador como "decisivo" para sua eleição como presidente da Câmara. "Sou eternamente grato a ele", diz o tucano mineiro.
O baiano Jutahy Magalhães Júnior, eleito líder tucano na Câmara no rastro do lançamento, do crescimento e da consolidação da candidatura de Aécio, diz: "O Covas era um paizão para nós".
Alckmin, Aécio e Jutahy têm entre 40 e 50 anos e, ao lado do líder no Senado, Sérgio Machado, dissidente do grupo de Tasso no Ceará, são a nova geração de líderes do PSDB. Estão dispostos a garantir a sobrevida do partido para além do governo FHC, resgatando alguns valores perdidos ao longo do exercício do poder.
Além de fundador, líder mais importante e primeiro candidato a presidente da República pelo PSDB (em 1989), Mário Covas é também a principal referência e foi o arauto do que a nova geração de tucanos espera para o partido: uma espécie de volta às origens.
O PSDB foi criado em 1988, no embalo da Constituinte daquele ano e como reação ao domínio crescente de Orestes Quércia no PMDB, em substituição ao deputado Ulysses Guimarães.
As principais bandeiras do novo partido eram o parlamentarismo, a justiça social e a ética na política, que os jovens tucanos identificam principalmente com Covas e com sua atuação pública.
Ao ser reeleito governador, em 1998, Covas defendeu uma guinada à esquerda. Ou seja, o distanciamento do PFL e do atual PMDB e uma aproximação com o PT e o PSB, por exemplo.
Nas eleições municipais, levou todo o partido a apoiar a petista Marta Suplicy no segundo turno para a Prefeitura de São Paulo contra Paulo Maluf, do PPB.
Esse movimento à esquerda deu gás para os tucanos mais jovens, virou o centro das discussões estratégicas do partido e acabou gerando a candidatura de Aécio Neves para a presidência da Câmara. Covas se tornou, assim, o padrinho da nova era do PSDB.
No plano estadual, o herdeiro de Covas é Geraldo Alckmin. Se conseguir o salvo-conduto da Justiça e puder candidatar-se ao governo de São Paulo em 2002, após assumir pouco menos da metade do mandato de Covas, terá pela frente condições francamente favoráveis a uma ascendente e duradoura carreira política.
Superada por Covas a etapa mais difícil no governo do Estado, Alckmin chega para colher os louros, com estabilidade, inaugurações e boas notícias.
Além disso, Covas foi peça fundamental na campanha municipal do ano passado, em que Alckmin começou com 2% das pesquisas e por pouco não foi para o segundo turno. Também deixou tudo preparado para a campanha ao governo, legando ao sucessor dezenas de fotos e fitas ao lado dele e recheadas de elogios.
No plano nacional, o cenário pós-Covas ainda é incerto. O apoio público do governador a Tasso Jereissati o incluiu definitivamente entre os favoritos de 2002, mas o paulista José Serra continua forte no páreo.
Na avaliação de tucanos de diferentes Estados, é muito difícil para o PSDB abdicar de uma candidatura de São Paulo por dois motivos principais: o Estado é o número um da Federação, e a sigla
tem origem nitidamente paulista.
Os tucanos do Estado que queiram concorrer à Câmara e ao Senado tendem a preferir um conterrâneo como Serra concorrendo à Presidência e puxando votos para eles ao lado de Alckmin, candidato ao governo. Juntos, seriam poderosos carros-chefes para suas candidaturas.
Já com o cearense Tasso concorrendo e sem a força eleitoral de Covas, o panorama pode não ser tão tranquilo. Os candidatos tendem a se sentir "órfãos" de Covas num Estado fortemente polarizado em três correntes: o PT, Maluf e, até agora, Covas.
O grande desafio deles vai ser canalizar a força de Covas para o partido. Sem um candidato próprio do Estado, é mais difícil.
Outro elo dessa corrente é FHC, que, depois das eleições do Congresso e do rompimento com o senador Antonio Carlos Magalhães, tem como prioridade reequilibrar o peso do PSDB, do PMDB e do PFL no seu governo.
FHC irá entrar firme na discussão sucessória, mas só a partir do fim deste ano, início do próximo. Até lá, tenta ficar neutro, mas há indícios de preferência por Serra.
Desde a Constituinte de 1988 e da criação do PSDB, FHC e Serra fazem uma "dobradinha intelectual", contra Covas, político de carreira e considerado mais estatizante, por exemplo.
O peso das bancadas do Senado e da Câmara cresce sensivelmente a partir de agora, com a eleição de Aécio, o fortalecimento do PSDB e o efeito cascata da renovação dos quadros tucanos no Congresso. Mesmo depois de morto, Covas continua sendo a bússola.
"Quando ninguém acreditava Änem FHC, nem Serra, nem TassoÄ, o primeiro a me estimular e me empurrar para a frente foi Covas, o nosso grande líder", relata Aécio. Quando decidiu se lançar, ele pegou um avião e foi para o Palácio dos Bandeirantes. Covas ouviu e se animou.
Foi assim que se tornou o mais poderoso padrinho da candidatura de Aécio, um dos fatos políticos mais importantes dos últimos anos para o PSDB, que fora excluído das presidências da Câmara e do Senado desde o primeiro mandato de FHC por um rodízio do PMDB e do PFL.
Mesmo doente, Covas participou do lançamento da candidatura em Brasília: "Vou trabalhar pelo Aécio, pelo meu partido". Vez ou outra, aproveitava entrevistas nas viagens pelo interior para repetir: "A única coisa que presta é deixarmos o PFL ganhar, é isso?".
A presença, o aval e a frase de Covas tiveram um significado ainda mais especial porque, na véspera do lançamento do nome de Aécio, FHC, Pimenta da Veiga, Serra e o ministro Aloysio Nunes Ferreira, também tucano, haviam combinado "zerar o jogo".
Em resumo, acertaram que, na hora "H", pediriam a renúncia de Aécio, ofereceriam a ele uma compensação no governo e garantiriam a vitória de Inocêncio. Mas Covas consolidou o nome de Aécio e inviabilizou o acerto. Essa atuação foi como uma espécie de fecho de ouro de sua atuação e influência sobre aos jovens líderes que estão assumindo gradualmente o PSDB e querem que o partido "recupere o amor próprio e se reencontre com sua própria história", como disse um deles.
Além de Alckmin, Aécio, Jutahy e Sérgio Machado, um grupo maior de deputados faz parte dessa rebelião tácita inspirada sobretudo em Covas: Márcio Fortes, Nárcio Rodrigues, João Almeida, Arthur Virgílio Neto, Arnaldo Madeira, entre outros.
Eles têm sido unânimes em apontar Covas como a grande referência, mas nem por isso embarcaram no seu apoio a Tasso contra Serra na disputa presidencial. Por enquanto, preferem não optar por um dos candidatos.
Encampam, entretanto, outra tese de Covas: a de prévias para que a escolha do candidato de 2002 seja feita pelo maior número possível de correligionários, não apenas por uma convenção.
O "novo PSDB" tenta orientar-se pelas posições de Covas, sabe que depende muito de FHC e quer tornar-se alvo das atenções de Serra e de Tasso. Mas com um cuidado: evitar crises e dissidências internas que possam enfraquecer o partido para 2002.


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