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A MORTE DE COVAS
Apesar de deixar o Estado financeiramente saudável para
o sucessor, o governador de São Paulo perdeu a guerra
contra a violência nas ruas, nos presídios e na Febem
Ajuste das finanças marcou gestão em SP
SÍLVIA CORRÊA
DA REPORTAGEM LOCAL
Engenheiro de formação, Mário
Covas administrou o Estado como um dedicado economista. Em
uma gestão sem obras grandiosas,
fez do ajuste das contas públicas a
principal marca de seus pouco
mais de seis anos de governo.
Perdeu a guerra contra a violência urbana e certamente não entrará para a história como "o homem do metrô" -cuja extensão
aumentou em apenas 5,7 km-
ou do Rodoanel, um anel viário
que deverá ligar as principais rodovias do Estado em torno da capital e que virou sua menina-dos-olhos, mas que, até agora, é só um
viaduto, algumas alças de retorno
e um enorme canteiro de obras.
Mas o saneamento que promoveu nas finanças do Estado deve
dar a seu sucessor condições de
abocanhar o título de realizador.
Covas deixa para Geraldo Alckmin, seu vice nas duas eleições e
potencial candidato tucano à sucessão paulista, um Estado com
dívidas renegociadas, previsão de
um superávit primário de R$ 3 bilhões e um extenso cronograma
de obras a entregar.
Em 1995, quando o tucano assumiu pela primeira vez o governo
de São Paulo, o déficit era de
21,7% do Orçamento anual e não
havia dinheiro para pagar as dívidas nem as obras iniciadas.
No total, o Estado devia R$ 67,9
bilhões (R$ 6,6 bilhões em contas
vencidas da administração passada e R$ 61,3 bilhões em dívidas de
longo prazo), pendências com a
União, títulos no mercado e débitos com os bancos estaduais.
A dívida de longo prazo foi renegociada de 1996 a 1997. Na ocasião, chegava a R$ 89,7 bilhões.
Hoje, é de R$ 84,2 bilhões.
Sem a negociação, segundo
uma projeção da Secretaria da Fazenda, ela teria chegado a R$ 132,3
bilhões em 2000. Com ela, no ano
passado, pela primeira vez desde
o acordo, o governo pôde gastar
mais com a saúde (R$ 3,4 bilhões)
do que com o serviço da dívida de
longo prazo (R$ 2,4 bilhões).
No tocante aos débitos de curto
prazo, o déficit orçamentário de
21,7% (R$ 6,6 bilhões) em 1995
caiu a 2,9% (R$ 1 bilhão) em 1996.
Nos anos seguintes, o governo
passou a gastar apenas o que arrecadava. Em 2000, sem incluir o
serviço da dívida de longo prazo,
as receitas superaram as despesas.
Do déficit ao superávit, o caminho foi longo. Fez-se à custa do
que os tucanos chamaram de
"economia de guerra": renegociação da dívida, financiada por um
pacote de privatizações que rendeu R$ 23,4 bilhões, integralmente destinados a pagar débitos e a
sanear empresas públicas; revisão
de quase 5.000 contratos; extinção
de dezenas de órgãos; parcelamento dos salários; demissão de
funcionários -mais de 30 mil só
no primeiro ano de governo; suspensão dos investimentos; paralisação de cerca de 300 obras e cortes de manutenção da máquina.
As medidas de saneamento, que
bloqueavam os investimentos, somadas aos crescentes índices de
criminalidade, custaram a Mário
Covas a própria popularidade.
"Ou você coloca a casa em ordem ou não governa. E isso inclui
frustrar as expectativas de quem o
elegeu", disse, em julho de 1997.
Covas sentiu a frustração nas
ruas, em embates com servidores
que, em geral, pediam aumento
de salários ou criticavam suas medidas administrativas.
Os confrontos se intensificaram
após a primeira cirurgia para a retirada de um tumor, em 1998. A
doença, disse Covas já às vésperas
da segunda operação, ensinou-lhe que, mais do que nunca, deveria dizer tudo o que pensava.
A resposta ao jeito enfrentador
veio, não raro, na forma de paus,
pedras, ovos e laranjas. Em junho
de 2000, o embate rendeu-lhe ferimentos na testa e no lábio em plena praça da República, durante
confronto com professores em
greve, que tentaram impedi-lo de
entrar na Secretaria da Educação.
Os servidores da educação foram, nas ruas, os maiores opositores de Covas, mas foi a segurança pública a área que se transformou no seu calcanhar-de-aquiles.
Quando se candidatou à reeleição, Covas prometeu reduzir à
metade os índices de criminalidade. Apostava, para isso, na integração das polícias e no policiamento comunitário.
No governo, criou a ouvidoria
para fiscalizar a ação policial e investiu em equipamentos. Não
adiantou. Covas deixou um policiamento comunitário embrionário, uma relutante integração operacional entre as corporações e altos índices de criminalidade.
Os assassinatos na capital, por
exemplo, passaram de 4.814 em
1998 para 5.418 em 1999 -por 10
mil habitantes, pularam de 4,86
para 5,45. Outros índices tiveram
crescimento semelhante.
Na esteira do aumento da criminalidade, outra promessa de campanha foi prejudicada: a de zerar
o déficit de vagas no sistema penitenciário. Apesar da construção
de 31 cadeias, passando de 24.620
para 49.052 o número de vagas no
sistema, o déficit pulou de 6.270
para 11.203 -situação que culminou com a maior rebelião da história do sistema prisional do país,
registrada em fevereiro.
A situação se repetiu na Febem,
cujas constantes rebeliões, superlotação e denúncias de tortura
marcaram negativamente o governo, que chegou a ser acusado
pela Anistia Internacional de "tolerância semi-oficial" com as recorrentes violações.
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