Folha Online Ilustrada  
Crítica
04/01/2003 - 16h49

Biografia de Lima Barreto escrita em 1952 ganha novos prefácios

NICOLAU SEVCENKO
Especial para a Folha


É um grande prazer saudar o lançamento da nova edição, a oitava, de "A Vida de Lima Barreto", escrita por Francisco de Assis Barbosa (1914-1991). De volta à sua editora original, a José Olympio, a nova edição vem enriquecida de dois belos prefácios, de Otto Lara Rezende (1922-1992) e Beatriz Resende, além de uma nota introdutória na orelha, escrita pelo professor Antonio Arnoni Prado, da Unicamp.

Essa é provavelmente a biografia mais louvada da literatura brasileira. Para se ter idéia, ela foi celebrada e consagrada por críticos do gabarito de Sérgio Buarque de Holanda (1902-1982), Gilberto Freyre (1900-1987) e Antonio Candido e também por escritores como José Lins do Rego, Rachel de Queiroz e Manuel Bandeira (1886-1968). Não resisto a reproduzir o juízo ponderado e agudo com que ela foi recebida pelo crítico Tristão de Ataíde (1893-1983).

"Foi destacada como a melhor biografia de um escritor brasileiro já publicada em nossa língua. Foi escrita com um cuidado, uma objetividade, uma paciência, uma elegância de estilo, um critério de relação documental e acima de tudo com um amor, sem desvario, que realmente fazem dessa biografia qualquer coisa à altura do biografado. Creio que basta dizer isso para dizer tudo. Temos nela um modelo e uma lição, de como a verdade e a beleza, quando se entrelaçam, não há quem lhes resista."

Em meio à sua vida atribulada de redator-chefe da lendária "Última Hora" de Samuel Wainer, Barbosa levou cerca de seis anos para compor esse trabalho. Em sua carreira no jornalismo, passou também, entre outros, pelo "Correio da Manhã", "Diário Carioca" e Folha.

Como ele mesmo relata no prefácio à primeira edição, tudo começou quando o editor Zélio Valverde o encarregou, em 1946, de organizar as obras completas de Lima Barreto. Ele entrou em contato com a família e recebeu uma massa de documentos, literários e pessoais, zelosamente guardados pela irmã do escritor, dona Evangelina, no guarda-louças de sua casa. O projeto da edição das obras naufragou, então ele decidiu ir adiante com a biografia.

Na sua modesta avaliação, Barbosa considerou a biografia como "uma singela narrativa literária". Mas o fato é que o livro teve um extraordinário impacto no momento em que veio a público, em 1952, em meio ao processo de redemocratização da vida brasileira, pós-guerra e pós-Vargas.

Na sequência, o historiador Caio Prado Jr. (1907-1990), para quem Lima Barreto era "o maior e mais brasileiro dos nossos romancistas", sendo então o editor da Brasiliense, resolveu retomar o projeto da publicação das suas obras completas.

Para comandar a iniciativa encarregou Barbosa, o qual se acercou de Manoel Cavalcanti Proença e Antônio Houaiss para enfrentar o desafio.
A publicação, em 1956, das "Obras de Lima Barreto", em 17 volumes, todos prefaciados pela fina flor da crítica e da intelectualidade, juntamente com a biografia, são um marco da cultura brasileira na segunda metade do século 20. Esses dois trabalhos não só reavaliaram a posição do escritor na historia literária do país, como projetaram para o primeiro plano um período até então relativamente obscuro e que se revelaria decisivo para a compreensão do Brasil contemporâneo.

Inspirados nessas fontes prodigiosas, toda uma nova geração de pesquisadores as tomariam como material estratégico para estudar a consolidação do regime e da sociedade republicana.

A biografia interagia às maravilhas com as obras completas, na medida em que os escritos de Lima Barreto têm um caráter fortemente confessional, e Barbosa os articulou com as sucessivas fases da vida do escritor, urdindo numa trama habilidosa as vicissitudes dramáticas da sua existência, uma densa imaginação crítica e literária e as dores de gestação do Brasil moderno.

Por sua origem humilde e sua sensibilidade aguçada, Lima Barreto produziu uma das mais raras e profundas percepções da realidade social brasileira vista de baixo para cima, julgando os poderosos pela indignação dos injustiçados. Pagou um preço alto por isso. A elite letrada cercou a força de sua obra com uma muralha de silêncio por um longo tempo. Foi esse muro que Barbosa pôs por terra, revelando os tesouros que ele ocultava. Leitura obrigatória em tempos de virada.


Nicolau Sevcenko, 50, é professor de história da cultura da USP e autor de "Orfeu Extático na Metrópole" (Companhia das Letras), entre outros

 Serviço

A Vida de Lima Barreto
Autor: Francisco de Assis Barbosa
Editora: José Olympio
Quanto: R$ 45 (458 págs.)


   
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