07/06/2002
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10h18
Restaurado, "Alô, Alô, Carnaval" mostra que resiste aos Carnavais
MARIO SERGIO CONTI da sucursal da Folha, no Rio
Quando foi lançado, em janeiro de 36, "Alô, Alô, Carnaval" bateu o recorde de bilheteria dos filmes nacionais. Ficou um mês em cartaz no Rio e depois percorreu o Brasil, lotando salas.
"Alô, Alô, Carnaval" foi relançado três vezes (em 52, 74 e 83) e em todas as ocasiões atraiu público e elogios da crítica. Há algo no filme de Adhemar Gonzaga que desafia o tempo, mas o que será?
Graças à tenacidade da filha do diretor, Alice Gonzaga, responsável pela restauração primorosa que estréia hoje, fica claro que o filme não é uma peça de museu, que agrada apenas nostálgicos ou cinéfilos. Sua força está na feliz união de cinema e música popular, na leveza com que confronta o subdesenvolvimento.
O filme conta a história de dois autores e produtores de revistas musicais, Arthur (Barbosa Júnior) e José (Pinto Filho). Endividados até o pescoço, eles querem que um empresário português (Jayme Costa) financie a montagem de um espetáculo que os redima da penúria. O empresário tem um acerto com uma companhia francesa e os afasta liminarmente. A companhia francesa, contudo, cancela a turnê para o Rio, e o português é obrigado a recorrer a Arthur e José.
Os brasileiros se vingam, obrigando o empresário a saldar-lhes todas as dívidas. O objetivo deles, por meio de macetes escusos e superfaturamento, é arrancar o máximo de dinheiro do português.
Esse enredo tênue, que serve de ligação para os 23 números musicais mostrados no filme, capta aspectos do movimento do capital: o endividamento do empresariado nacional, a substituição de importações e a rede de favorecimentos e corrupção que se cria com a chegada do investimento.
A música popular já era, nos anos 30, a arte brasileira mais rica. Seu meio industrial de difusão era o rádio. O longa cumpriu então o papel de revelar aquilo que o rádio não podia mostrar: os cantores e músicos em ação.
Esse aspecto continua tão vivo quanto na sua estréia. Lamartine Babo, Mario Reis, Francisco Alves, Dircinha Baptista, Aurora e Carmen Miranda desfilam pela tela, interpretando músicas ingênuas e engraçadas. Tolas, até.
Mas é da tolice, do esquematismo do enredo e da dicção popular que "Alô, Alô, Carnaval" retira a sua graça. Gonzaga sublinha o congraçamento (vale dizer: a conciliação entre exploradores e explorados) carnavalesco propiciado pela música popular.
O gume político e as marcas do subdesenvolvimento, no entanto, estão intactas em "Alô, Alô, Carnaval". Eles fazem tanto sentido hoje quanto há quase 70 anos.
Alô, Alô, Carnaval Direção: Adhemar Gonzaga Produção: Brasil, 1936 Quando: a partir de hoje no Espaço Unibanco
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