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01/07/2001 - 21h11

"Estilistas não estão habituados a questionar", diz Ronaldo Fraga

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CARLA NASCIMENTO
da Folha Online

A crítica já se tornou a marca do estilista mineiro Ronaldo Fraga. Na coleção que mostrou ontem, na São Paulo Fashion Week, Fraga mais uma vez deixou evidente que não pretende mudar de rota.

Fraga fez uma homenagem a estilista Zuzu Angel, mostrando que, de fato, a moda é uma forma de expressão e, mais do que isso, pode ser veículo de contestação e (por que não?)também uma forma de fazer política.

Com lojas espalhadas em cidades como Rio de Janeiro e Curitiba, Fraga vai inaugurar em setembro um show room em São Paulo.

Leia trechos da entrevista que o estilista concedeu à Folha Online:

Folha Online - Esta edição da semana de moda de São Paulo vive um clima de "mostrar a que veio", colocando como ordem do dia a necessidade de se criar uma marca brasileira. Como você vê isso? De fato existe necessidade de se imprimir uma brasilidade na moda feita aqui?

Ronaldo Fraga -
Não é uma coisa muito fácil. Primeiro que, ao falar de brasilidade a gente pode tropeçar e cair de boca na roupa folclórica e, no mundo moderno, não tem mais lugar para isso. Nós perdemos o bonde da história. Já passou esse momento de discutir essa brasilidade. Hoje eu procuro colocar no meu trabalho uma legitimidade. Agora, essa coisa que você vê muito, que é o cara ir lá fora e copiar a coleção do estilista que foi o top da última estação, chegar aqui e colocar na passarela e vir com a embromação de que foi inspirado em índio, isso é preguiça. Isso é ruim para a nossa semana de moda. A imprensa tem que falar isso, que é mais importante do que discutir essa identidade brasiliera na roupa.

Folha Online - Você vê o Brasil como um futuro centro de referência de moda. Já tem mercado aqui para isso?

Fraga -
Vale lembrar que em São Paulo vende-se muito mais Giorgio Armani do que em Nova York. Essa é uma informação que têm de se levar em conta. Quando a moeda brasileira deu sinal de estabilidade você viu isso na reação do consumo das pessoas. Hoje, por exemplo, as pessoas que procuram Ronaldo Fraga vão atrás de um conceito. Até bem pouco tempo atrás as pessoas falavam assim: 'Não, o Brasil não tem cultura de moda pra entender isso. O Brasil quer só consumir tendência'. Eu não acredito nisso. O Brasil, em termos de moda, consome muito mais e, culturalmente, compra-se muito mais do que em um país como a Inglaterra. Seria importante então que os estilistas do Brasil virassem uma referência da América do Sul e, quem sabe, até do hemisfério sul, pra começar. Isso tem chances de acontecer.

Folha Online - E o que está faltando?

Fraga -
A análise, a discussão e a crítica. Não é simplesmente fazer roupa. Hoje a gente vê na prática a diferença entre fazer moda e fazer roupa. Entre fazer evento de lançamento e fazer uma semana de moda para o mundo. Entre falar do desfile e cobrir o evento de moda.

Folha Online - Você já vê sinais de mudança?

Fraga -
Toda a estrutura ligada à moda está sendo mexida. A imprensa está sendo obrigada a reavaliar a forma como escreve. Os estilistas estão sendo obrigados a rever essas pesquisas de influências e referências. Nós não podemos deixar de ver que nos últimos cinco anos nós demos um pulo de 30 e isso não tem mais retorno.

Folha Online - Nas suas coleções você normalmente faz uma crítica sobre determiandos fatos ou situações. Como forma de expressão a moda sempre tem que ser crítica?

Fraga -
A gente vive em um mundo diverso e nessa diversidade a moda se ocupa de várias coisas. Pode ser aquela feita para vender e que movimenta a economia, ou uma moda que marca e que é reflexo de tempo. Ela pode ser as duas coisas. Eu optei por fazer roupa desta forma [crítica].

Folha Online - Ao contar a história de Zuzu Angel em seu desfile você também falou do regime militar. Por que agora?

Fraga -
Quando eu resolvi falar da Zuzu foi pensando no momento que a moda brasileira está passando. Essa pseudo-maturidade vivida nesse momento e que ainda incorre em alguns erros.

Folha Online - Que tipo de erro?

Fraga-
Tem muita gente que acredita que essa geração inventou a saia rodada, por exemplo, e isso não é verdade. Nós temos precussores de uma história da moda que já vem sendo construída no Brasil. Pessoas que foram pioneiras em coisas que muita gente hoje está falando. A Zuzu Angel falava dessa necessidade de identidade há 30 anos e muita gente hoje não sabe disso. Nós temos uma relação muito fria e muuito distante com a nossa própria história.

Folha Online - E sobre o regime militar. Você vê muita proximidade entre o Brasil daquela época e o de hoje?

Fraga -
Tem certas indignações que permanecem. Quando eu liguei a TV e vi Gal Costa e Zélia Gattai abraçadas com Antonio Carlos Maglhães, eu pensei: que país é esse? Nunca é tarde pra gente rever e mexer no baú da nossa história.

Folha Online - Existe um pensar sobre o fazer no mundo da moda? Os estilistas pensam no porquê de suas propostas estéticas?

Fraga -
Falta isso. Nós não estamos habituados a pensar. Eu respeito o trabalho de todos, mas nós estamos pouco acostumados a questionar.

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