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16/02/2004 - 07h14

"Jornalismo público" da Cultura exige esforços

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CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
Especial para a Folha de S.Paulo

O projeto "jornalismo público" da TV Cultura entra hoje em sua segunda semana. O objetivo de produzir um noticiário televisivo "independente do poder e do mercado", "voltado para o cidadão" e que "privilegia a compreensão do fato" só pode receber incentivo e estímulo.

O resultado visto na tela nas primeiras cinco edições da nova fase do "Diário Paulista" e do "Jornal da Cultura" comprova que há empenho sincero da equipe liderada por Marco Antonio Coelho Filho, mas muito esforço ainda a ser feito até chegar aos ambiciosos resultados propostos.

O modelo do "espetáculo" do telejornalismo que a Cultura pretende combater está enraizado demais em quem produz e consome informação pela televisão no Brasil.

A tendência de quem pretende superá-lo costuma ser encompridar os programas (os dois jornais dobraram seus 30 minutos anteriores), as unidades que os compõem e a pretexto de seriedade torná-las mais chatas. Quando isso ocorre, a conseqüência é perda de público.

Esse é um risco que a proposta da Cultura terá de superar se quiser dar certo. Há matérias longas demais que nem sempre cumprem o propósito explícito de "trazer a reflexão e o aprofundamento das histórias de interesse público".

No "Diário Paulista" de terça-feira passada, por exemplo, o interessante tema do veto da prefeita de São Paulo a um projeto de lei aprovado pela Câmara para pôr fim ao sacrifício de animais, embora tenha mostrado os dois lados da questão, deixou de responder a perguntas essenciais como se é possível fazer pesquisa médica sem usar bichos. Na mesma edição, reportagens sobre falta de água e enchente não explicaram por que elas estão ocorrendo.

Para se contrapor ao excesso de "fatos negativos" que prevalece no telejornalismo, "Diário Paulista" pode cair no extremo oposto de pintar o mundo de cor-de-rosa.

Na quinta-feira, uma reportagem afirmou categoricamente que a cidade de Santos resolveu o problema do transporte público, hipótese contestada por muitos dos quem moram ou visitam a cidade, como contraditoriamente a própria matéria documenta.

Além disso, é preciso resolver erros técnicos ostensivos demais, que ocorreram durante a semana de estréia do projeto, como anúncio de reportagens que não entravam no ar no momento previsto ou entravam com atraso. A informalidade do competente trio de âncoras é positiva, mas não suficiente para garantir qualidade ao programa.

O "Jornal da Cultura" atual também padece de dificuldades semelhantes. O papel de Celso Zucatelli, o terceiro apresentador que dialoga com Heródoto Barbeiro e Márcia Bongiovanni, ainda precisa ser definido além de ele passear pelo estúdio e não usar paletó. A idéia é que ele dê coerência às notícias, mas isso ainda não está sendo feito com clareza.

As entrevistas de Barbeiro são mais longas do que as habituais na TV, mas talvez ele possa ser mais combativo no questionamento dos convidados do que foi na semana passada para oferecer aos espectadores mais debate do que exposição de idéias.

Linguagem inovadora

No prato dos pontos positivos da balança estão as intervenções dos comentaristas de temas específicos (economia, jurídico, esportes), a reflexão sobre o papel dos veículos de comunicação no caso do menino Iruan e o ótimo quadro "Blog do Tas", este sim protótipo auspicioso de linguagem telejornalística inovadora, atraente e crítica.

Enfim, uma semana é muito pouco para traçar juízo definitivo sobre o que advirá desse corajoso desafio. São conhecidas as limitações orçamentárias e as complicações políticas que a TV Cultura enfrenta, o que torna a audácia dos dirigentes do seu jornalismo ainda mais admirável por terem se proposto a uma tarefa tão difícil num momento particularmente complicado da vida da emissora.

Carlos Eduardo Lins da Silva, 51, livre-docente, doutor e mestre em Comunicação, é jornalista e diretor da Patri Relações Governamentais e Políticas Públicas.
 

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