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05/09/2004 - 08h58

Governo negocia novas regras para a programação; TVs falam em censura

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LAURA MATTOS
da Folha de S.Paulo

É proibido exibir "reality shows", telejornais "mundo cão" antes das 20h e pegadinhas com crianças, adolescentes e idosos.

Esses são alguns dos pontos de um termo de compromisso proposto às emissoras de TV pelo Ministério da Justiça (MJ) e pelo Ministério Público Federal (MPF).

O texto veta determinados tipos de programas, sugere a adoção de um ombudsman e a preferência por programação "educativa, cultural, artística e informativa".

Globo, SBT, Record, Rede TV! e Band receberam o documento há cerca de um mês, e havia uma reunião marcada para a última sexta, para que se manifestassem. Estrategicamente, no entanto, os órgãos federais adiaram o encontro por tempo indeterminado. Perceberam que a tendência era que as TVs se recusassem a assiná-lo e chegassem com toda a munição contra a proposta, falando em censura e autoritarismo.

O termo propõe adesão voluntária e não tem força de lei. Poderá, contudo, servir de reforço a futuras ações judiciais contra as TVs. A reação contrária foi forte, e a polêmica irá esquentar nos próximos dias. O Ministério Público Federal espera, ao menos, uma contraproposta.

Se as TVs se recusarem até mesmo a discutir o projeto, o MPF deverá entrar com uma série de ações judiciais por reclamações de telespectadores. As queixas atualmente estão paradas, aguardando definição sobre o termo de compromisso.

Censura

As emissoras, porém, não parecem dispostas a negociar. "Isso não deve ser assinado. A Constituição garante a liberdade de expressão, e o termo viola esse princípio. Esse texto e as propostas de criação do Conselho Federal de Jornalismo e da Ancinav [Agência Nacional do Audiovisual] mostram uma ofensiva de governo para cercear a liberdade de expressão", afirma Marcelo Parada, vice-presidente da Band. "É curioso que venha do PT, que lutou contra censura e agora, no governo, faz justamente o contrário. O controle social da TV é o controle remoto."

A Record também se declarou contrária e não irá apresentar uma contraproposta. "A Record não aceita nenhuma espécie de controle. Já tem sua ética, uma programação voltada à família. Não tem de assinar nada, porque já existem leis, como a Lei de Imprensa e o Estatuto da Criança e do Adolescente, que punem excessos. E não vai dar nenhuma sugestão [ao governo]. A sugestão é aplicar a lei vigente", disse Dennis Munhoz, presidente da rede.

Segundo ele, a proposta busca a censura porque proíbe previamente a exibição de programas. Munhoz falou ainda em subjetividade, por exemplo, quando o documento veta "reality shows" por "explorarem a intimidade". "O que é intimidade? É relativo."

Faz coro às TVs José Pizani, recém-eleito presidente da Abert (Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e TV), que representa a Globo. "Nossa posição é de não assinar termo algum, o qual consideramos indiscutível. Defendemos auto-regulamentação."

O SBT afirmou que não iria comentar porque a reunião havia sido adiada em razão da "preocupação" das TVs com "qualquer iniciativa que possa resultar em restrição à liberdade de imprensa". Globo e Rede TV! não se manifestaram oficialmente.

O Ministério da Justiça negou que a iniciativa tenha relação com o conselho de jornalismo ou a Ancinav. A suposição foi negada também pela procuradora Federal dos Direitos do Cidadão, Ela Wiecko de Castilho, que assina o termo. "O texto surgiu porque o Ministério Público recebe grande número de reclamações contra a programação das TVs. A discussão existe há mais de um ano."

A procuradora da República Eugênia Fávero, uma das mentoras do termo, negou a acusação de censura e de ligação com outros projetos do governo. "As redes querem se valer disso para dizer que sofrem um ataque. Mas é o contrário. O termo busca um acordo e pode evitar que entremos com ações. Nada tem a ver com censura, que é arbitrária. Mas a liberdade de expressão via TV tem limites impostos pela própria Constituição."

Ela Castilho afirmou que sua expectativa é que as TVs se comprometam a mudar de postura. "Não queremos ser autoritários, mas sim discutir com as redes se estão ou não respeitando o Estatuto da Criança e do Adolescente. Estamos abertos a negociações e queremos um avanço do diálogo.

Será que as emissoras não concordam com nenhuma proposta?"
Segundo ela, se as TVs não assumirem nenhum compromisso, o MPF terá de começar a entrar com ações. "Temos de dar respostas ao cidadão que nos procura para reclamar da programação."

Esse é mais um capítulo da antiga novela do controle da programação, que opõe governo e TV. Na era FHC, o MJ tentou negociar uma auto-regulamentação e assinou uma portaria que controlava o horário de exibição dos programas.

A primeira idéia não vingou, e a portaria foi derrubada na Justiça. Nos bastidores do governo e das TVs, poucos crêem que o fim do "melodrama" esteja próximo.

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