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19/09/2004 - 14h00

Herdeiros querem vetar comércio de imagens do Cristo Redentor

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DIEGO ASSSIS
da Folha de S.Paulo

Se está na rua, é do povo. Nem sempre. Apoiados na nova lei de direitos autorais, aprovada em 1998, herdeiros de artistas que tiveram suas obras exibidas durante anos em praça pública estão se mexendo para começar a fazer valer os seus direitos.

A polêmica da hora gira em torno dos direitos sobre a imagem símbolo, e por isso mais reproduzida, da cidade do Rio de Janeiro: a estátua do Cristo Redentor.

Antônio Gaudério/FI
Estátua do Cristo Redentor, no RJ


Inaugurada em 1931, a escultura de 38 m instalada sobre o morro do Corcovado foi criada sob encomenda da Arquidiocese do Rio pelo artista plástico francês Paul Landowski (1875-1961), cujos herdeiros agora brigam para impedir que a obra seja explorada comercialmente sem a sua autorização.

"Não existe nenhum documento que mostre que Paul Landowski tenha cedido os direitos autorais de sua obra a um terceiro", argumenta Christiane Ramonbordes, superintendente da ADAGP (Société des Auteurs dans les Arts Graphiques, Plastiques, Photographiques), associação francesa que, desde 1953, administra direitos autorais de artistas franceses.

Assim toda e qualquer reprodução comercial do Cristo precisa ser autorizada pela família Landowski, pelo menos até a obra cair em domínio público -70 anos após a morte do escultor, em 1961.

"Antes de qualquer coisa, a estátua é um patrimônio da cidade do Rio, assim como a Torre Eiffel é de Paris e a Estátua da Liberdade é de Nova York", contrapõe Paulo Bastos, 49, subsecretário de turismo da cidade do RJ. "A população contribuiu na construção da estátua, que até onde sei é de propriedade da Arquidiocese do Rio."

Procurada pela reportagem, a assessoria de imprensa da entidade reiterou a propriedade da obra, mas negou-se a comentar o tema.

"A Torre Eiffel é de domínio público. Mas, se falarmos do Arco da Defesa ou da pirâmide do Louvre, cujos titulares ainda são vivos, os usuários pagam para fazer reproduções. Se alguém quiser usar a imagem do Cristo Redentor, na França, também tem de pagar", rebate Ramonbordes, que esteve na última semana em São Paulo para o 1º Congresso de Gestão Coletiva de Direitos Autorais.

Seguindo esse raciocínio, do mesmo modo que a secretaria de turismo e a igreja e todos que empregaram a imagem da estátua para fazer santinhos, cartões-postais, camisetas etc., o longa-metragem "Redentor", que acabou de chegar aos cinemas, em tese, também deveria ter pedido autorização dos herdeiros de Landowski para explorá-la no filme e em seu material de divulgação.

"Do nosso ponto de vista, a lei brasileira autoriza a inclusão em obras de arte de estátuas que estão em logradouros públicos", defende Leonardo Monteiro de Barros, 41, sócio-diretor da produtora responsável, Conspiração Filmes. "Ainda não fomos procurados, mas se quiserem conversar, a gente conversa", adianta.

"Nossa orientação é primeiro notificar. A idéia é o diálogo. Se não houver composição, aí vamos à Justiça", diz Maria Luiza Egea, diretora da Autvis (Associação Brasileira dos Direitos de Autores Visuais), que representa os interesses da ADAGP no Brasil.

Segundo a advogada, muitos ainda desconhecem a alteração do Código Civil de 73, que permitia, sim, a livre reprodução de obras de arte instaladas em logradouros públicos. A nova lei, de 98, suprime esse artigo e cria um que permite apenas a "representação" dessas mesmas obras.

"As obras podem ser representadas em pinturas, desenhos e fotografias pessoais, mas sem finalidade comercial", destaca.

Situação semelhante vive a família do escultor Victor Brecheret (1894-1955). Símbolo da cidade de São Paulo, o Monumento às Bandeiras, inaugurado em 1952, é diariamente fotografado e reproduzido em suvenires ligados à memória da capital paulista.

Para o desembargador Luis Fernando Gama Pelegrini, 64, genro de Brecheret, todas as reproduções da obra precisam passar pela aprovação dos dois filhos do artista. "O fato de o monumento pertencer à prefeitura e de ser um cartão-postal da cidade não guarda nenhuma relação com o direito autoral, que é da minha mulher", diz. "Pode filmar, fotografar, mas não pode fazer um pôster, por exemplo. Porque aí começa a haver interesse econômico."

Durante o congresso sobre direitos autorais, Pelegrini debateu o assunto com Heitor Estanislau do Amaral, sobrinho de Tarsila do Amaral, que fez uma ressalva quanto à função social das obras de arte. "Deve haver um convívio entre o interesse social e o dos herdeiros. Mas o interesse do artista não pode ser anulado pelo interesse público. Não há ninguém melhor do que ele para dizer o que fazer com a sua obra", concluiu o desembargador.

Durante a produção desta reportagem uma integrante da família do artista Carlos Oswald (1882-1971) enviou um e-mail sustentando que ele havia sido o autor do croqui do Cristo e que, assim como o engenheiro Heitor Silva Costa, que participou da realização da obra, também deveria receber os créditos.

A superintendente da ADAGP contesta: "Em caso de co-autoria, os outros também teriam direito. Mas isso está fora de cogitação. Landowski é o único autor da obra". A briga está só começando.

Especial
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