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Morto aos 29, Jean Vigo inspirou a nouvelle vague
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ANA PAULA SOUZA
da Folha de S.Paulo
Luce Vigo, crítica de cinema e historiadora, tinha apenas três anos quando seu pai morreu. E oito quando perdeu a mãe. Aos 78 anos, a filha de Jean Vigo (1905-1934) volta-se para o passado com a serenidade que a pátina do tempo empresta ao olhar. "Durante muito anos, não falei do meu pai. Eu era próxima de seus amigos, mas não perguntava nada sobre ele. Cresci sozinha e em silêncio", diz, com um fiapo de tristeza na voz, em entrevista exclusiva à Folha, de Paris.
"Quando Paulo Emílio [Sales Gomes] veio me visitar, eu tinha uns 20 anos. O que eu podia oferecer a ele? Nada. Foi ele que me fez redescobrir a história da minha família."
Luce refere-se a "Jean Vigo", que chega às livrarias em outubro. "É uma mina de informações", diz a senhora que, quando menina, viveu em internatos, sob o cuidado de tutores. Foi também isso que disse François Truffaut (1932-1984), um dos artífices da nouvelle vague, ao tomar contato com o trabalho de Sales Gomes (1916-1977), publicado em Paris, em 1957. O diretor se disse "transtornado" com a descoberta da vida do diretor de "Zero de Comportamento" e "Atalante", obras de vanguarda que o inspiraram. É que a história de Vigo, com o perdão do lugar-comum, é mesmo daquelas que dariam um filme.
Gomes seduziu-se de tal modo com a saga que escreveu "Vigo, Vulgo Almereyda", sobre o pai de Jean, anarquista morto na cadeia, quando o filho tinha 12 anos. As desventuras políticas do pai fizeram com que, em parte da infância, ele vivesse sob identidade oculta. Como descreveu o escritor Jean de Saint-Prix, era um menino "pálido, magro, taciturno".
A saúde frágil o fez passar longas temporadas em casas de saúde. Numa delas conheceu Lydu, com quem se casaria em 1919 e teria Luce. Após a morte de Jean, Lydu repetia: "Lutei pela vida dele com todas as minhas forças, e poucas me sobraram para lutar pela minha".
Vem daí a solidão citada por Luce e, em certa medida, a resistência em conhecer seu legado. "Vi seus filmes, pela primeira vez, quando tinha 14 anos. Foi tanta emoção que nem me lembro mais do que vi na tela", recorda.
Por volta dos 30 anos, com a própria família construída e a memória do pai assentada, Luce abriu um cineclube e, claro, passou a programar os quatro únicos filmes de Vigo. Por fim, conseguiu escrever sobre ele. E falar. "Não o vi trabalhar, não o conheci. Sou, como vocês, espectadora de Vigo."
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