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29/12/2006 - 10h56

"Tropa de Elite" de José Padilha explica por que polícia "é o que é"

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SILVANA ARANTES
da Folha de S.Paulo

"Tropa de Elite", filme inédito do cineasta José Padilha, esparrama-se por um terreno pantanoso no qual nem sempre polícia é polícia; bandido é bandido; e ficção é ficção.

A questão da segurança pública no Brasil --especialmente no Rio de Janeiro, que atravessa agora nova crise, com série de ataques de facções criminosas-- é o tema de Padilha desde seu filme anterior, o documentário "Ônibus 174".

Com "Ônibus 174", ele foi reconhecido dentro e fora do Brasil, pela qualidade da reconstituição da saga pessoal do delinqüente Sandro do Nascimento, ao mesmo tempo em que revê a atuação do Bope (Batalhão de Operações Especiais) no episódio do seqüestro do lotação por Nascimento --que terminou com a morte de Nascimento e de uma passageira.

"Tropa de Elite" era originalmente um projeto de documentário, derivado de "Ônibus 174", tendo o Bope como tema principal. O título se converteu num drama ficcional quando Padilha concluiu que o "filme que queria fazer não era exeqüível como documentário".

A impossibilidade, segundo o cineasta, está no fato de que "policiais sinceros não estavam dispostos a falar em frente às câmeras, com medo de retaliações". Contudo, Padilha diz que "os antigos membros do Bope têm muita preocupação em dividir com a sociedade a culpa das repugnâncias que viveram em sua vida profissional".

E assim "Tropa de Elite" se transformou num filme de ficção, para "mostrar a forma pela qual nossas instituições policiais transformam quem tenta fazer parte delas".

O diretor diz que não busca "culpas, mas relações de causa e efeito", até porque "a polícia não existe no vazio. Ela é o que é e faz o que faz por causa da sociedade que a moldou", afirma.

Nas filmagens do longa, finalizadas neste mês, uma van da equipe foi alvo de um roubo que fez sumir um carregamento de armas cenográficas. Após o ataque, diversos profissionais da equipe desertaram do set.

Temia-se que o roubo fosse um recado mandado pelo Bope de seu desagrado com uma história que expõe a face menos honrosa da corporação --a de policiais que distorcem suas funções, lucram com a criminalidade e usam a violência excessiva e indiscriminadamente.

Padilha diz que "afirmações nesse sentido [de apontar o Bope por trás do roubo] não são verdadeiras". Segundo o diretor, "a Polícia Militar do Rio de Janeiro ficou preocupada com a realização do filme e com sua imagem como instituição, mas respeitou a liberdade de expressão e não atrapalhou o filme. Na verdade, ajudou bastante". Sobre o Bope, diz que o batalhão "também não interferiu ou ameaçou as filmagens".

"Tropa de Elite" enfoca o grupo especializado no combate ao tráfico nos morros cariocas por meio da trajetória de três oficiais (interpretados pelos atores Wagner Moura, Caio Junqueira e André Ramiro).

O prejuízo causado pelo roubo das armas, somado à contratação de uma equipe de profissionais norte-americanos especialistas em cenas de ação e aos custos de filmagens em quatro locações, ou seja, fora de estúdio, fizeram com que o orçamento de "Tropa de Elite" saltasse de R$ 4,9 milhões para R$ 10,5 milhões, autorizados ao benefício do patrocínio pelas leis de renúncia fiscal.

Com a nova cifra, o título acabou se tornando "o longa de maior porte filmado no Brasil em 2006", de acordo com seu produtor, James Darcy.

Padilha afirma que as filmagens de "Tropa de Elite" foram "a mais gratificante dose de estresse" que já experimentou.

Tormentos com a representação da violência no cinema --tema quase obrigatório na recente produção nacional-- não consomem o cineasta. "Dou pouca importância a discussões sobre a relação entre a estética e a ética, porque usualmente elas se dão a partir de conceitos mal definidos", diz.

Cineasta com formação em física, Padilha prefere fazer "uma distinção entre o conteúdo objetivo [o que um filme afirma da realidade] e o conteúdo estético do filme [como o filme faz estas afirmações]", evocando as noções de sentido segundo o pensamento do matemático e filósofo alemão Gottlob Frege (1848-1925).

"A meu ver, a ética dos filmes se relaciona diretamente com o seu conteúdo objetivo e apenas indiretamente com o seu conteúdo estético", afirma Padilha.

Levar o filme (e a discussão) ao Festival de Cannes é a pretensão de Padilha, impulsionada pelos irmãos Weinstein, sócios internacionais do longa.
Proprietários do extinto e lendário selo Miramax, os Weinstein --agora sob a grife Weinstein Co-- são experts em transformar filmes de orçamento médio em exemplos de sucesso de público e renda.

Para pleitear uma vaga em Cannes, "Tropa de Elite" tem de estar pronto até maio, data do festival. A partir do início de 2007, Padilha troca o Rio de Janeiro por São Paulo, para fazer a edição do material, ao lado do montador Daniel Rezende, o mesmo de "Cidade de Deus".

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