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25/02/2007 - 09h01

O professor acha que pena de morte é pouco

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ELIO GASPARI

NUM ARTIGO RECENTE, tratando do assassinato do menino João Hélio, o doutor Renato Janine Ribeiro, professor titular de ética da USP, escreveu o seguinte:

"Se não defendo a pena de morte contra os assassinos, é apenas porque acho que é pouco. (...) Todo o discurso que conheço, e que em larga medida sustento, sobre o Estado não dever se igualar ao criminoso, não dever matar pessoas, não dever impor sentenças cruéis nem tortura --tudo isso entra em xeque, para mim, diante do dado bruto que é o assassinato impiedoso. Torço para que, na cadeia, os assassinos recebam sua paga; torço para que a recebam de modo demorado e sofrido."

Janine é diretor de avaliação da Capes, entidade encarregada de julgar a qualidade acadêmica das universidades brasileiras.

O professor não defende a pena de morte, mas entende sua lógica. No ano passado, uma pesquisa do Datafolha mostrou que 51% dos brasileiros desejam uma lei que permita a execução de bandidos. A Corte Suprema dos Estados Unidos restabeleceu-a em 1976. Admitindo-se que essa penalidade existisse no Brasil e fosse administrada de acordo com os critérios da Justiça americana, é possível que só o motorista do carro que arrastou João Hélio arriscaria perder a vida. O bandido de 16 anos, por menor, estaria expressamente a salvo da pena capital. Toda vez que se organiza uma mesa-redonda para discutir o sistema penal brasileiro sem a presença de um defensor da pena de morte exerce-se um piedoso patrulhamento que mutila o debate e mascara as execuções feitas por policiais e milicianos.

A ética de Janine é assustadora quando ele diz que no caso dos quatro bandidos a pena de morte "é pouco", pois torce para que os bandidos paguem, na cadeia, "de modo demorado e sofrido".

Falta definir "sofrido", mas não falta conhecer como se sofre nas cadeias brasileiras, comandadas por quadrilhas de bandidos. Cada pessoa disposta a desejar que um delinqüente seja submetido aos sofrimentos estipulados pela "Lei da Massa", ou "do Cão" pode escolher uma pena cumulativa, com base na vida real. A escolha é livre.

"E eles batiam no senhor? (...) E esculacharam? Estupraram o senhor?" "Fizeram tudo. Me esculacharam, tiraram minha roupa todinha. Fizeram besteira comigo. (...) Tem um mês que estão me esculachando, e tudo." (Diálogo extraído do trabalho "Oficina do Diabo", do sociólogo Edmundo Campos Coelho.)

Admita-se que o estupro sistemático de presos faça parte do mundo das penitenciárias. Há também a chantagem contra irmãs, mulheres e mães que vão visitar os cárceres. Em alguns casos, cobra-se dinheiro ou serviços para a quadrilha. Em outros, sexo.

Preso sem dinheiro é obrigado a trabalhar para os outros e a assumir a responsabilidade por crimes alheios. Vira "robô". Em alguns casos, mata por encomenda. Há casos de "robôs" com mais de dez homicídios dentro da prisão.

Nas penitenciárias controladas pelos comandos, vigoram os códigos das quadrilhas, movidos a dinheiro. Mesmo que os assassinos de João Hélio fossem retalhados vivos, a torcida haveria de se decepcionar. Qualquer que fosse a paga demorada e sofrida, ela nada teria a ver com a indignação dos homens de bem. Seria apenas um gesto destinado a intimidar bandidos que tumultuam os negócios das quadrilhas e do tráfico. Seria uma iniciativa destinada a fortalecer a bandidagem, enfraquecendo a lei.

Janine colocou "em xeque" a idéia de que o Estado não deve torturar o criminoso, mas não propôs a entrega de bandidos à Lei do Cão. Fica uma dificuldade: só ela inclui a tortura na sua lista de penas. Pelo Código Penal, tortura é crime inafiançável.

Nosso Guia acha que os defensores da redução da maioridade penal acabarão perseguindo fetos. Blablablá. O inferno não está nos outros, mas no seu governo, no qual um hierarca do ministério da Educação acha que a "pena de morte é pouco".

Serviço: O artigo de Janine está nos seguintes sítios: Na Folha (para assinantes), no caderno Mais! do dia 18. No Humanitas Unisinos, uma busca em "Janine" traz o artigo, com data do dia 19.

DARCY, 10 ANOS
Uma colaboração para a lembrança dos dez anos da morte de Darcy Ribeiro:
Em julho de 1969, Darcy estava preso no Batalhão de Comando do Corpo de Fuzileiros Navais no Rio. Ocupava uma espaçosa suíte com vista para a baía e deu-se conta de que abaixo de sua janela viam-se as ruínas de um portão do início do século 19. Tinha alguma beleza, mas estava degradado.

Da cana, Darcy telefonou ao diretor do Iphan, Renato Soeiro, pedindo ao governo que o encarcerava que cuidasse melhor do patrimônio da Viúva. O portão foi consertado

OITICICA NA TATE
Vem aí uma das maiores exposições já organizadas com a obra de um artista brasileiro. Infelizmente, será em Londres, na Tate Gallery.

Irá de junho a setembro e mostrará 150 trabalhos de Hélio Oiticica (1937-1980), alguns dos quais estão guardados há mais de 50 anos.

Hélio pegava pesado. Homenageou o bandido Cara de Cavalo, a quem conhecera no morro da Mangueira, com uma bandeira que dizia o seguinte: "Seja marginal, seja herói".

METRÔ INTELIGENTE
A urucubaca continua perseguindo os transportecas do metrô de São Paulo. Enquanto eles resistem à idéia de instalar um sistema de tarifagem inteligente, o metrô do Rio deverá oferecer esse tipo de vantagem ainda neste ano.

Com um bilhete inteligente, virão descontos aos passageiros habituais (refresco que os paulistas confiscaram) e novas vantagens. Estuda-se um jeito de dar desconto às pessoas que tomam o metrô para ir ao cinema.

MARTA É MÓVEL
É ilusão acreditar que Lula e Marta Suplicy podem cabalar que ela permanecerá no ministério até 2010.

Nessa combinação, a permanência no ministério é irrelevante. No ano que vem, o problema dos dois será a busca de um candidato capaz de tomar a Prefeitura de São Paulo do consórcio tucano.

ELO PERDIDO
Depois da queda de Severino Cavalcanti surgiu a idéia de o presidente da Câmara devolver a mansão oficial em que vive enquanto ocupa a função.

Aldo Rebelo esqueceu o assunto e Arlindo Chinaglia não chegou a lembrá-lo. Ela custa, no barato, R$ 50 mil por mês, fornecendo teto, comida e roupa lavada.

GRANDE BORAT
Passado o Carnaval, a melhor diversão é ver "Borat" nos cinemas. Nele se ri daquilo que o bom tom colocou fora do alcance do humor. O repórter que saiu do Cazaquistão para visitar os "US and A" é o caipira globalizado. Sacha Baron Cohen é um grande comediante, mas o maior artista do Cazaquistão é o presidente Nursultan Nazarbayev.

Começou como metalúrgico comunista e manda no pedaço desde 1984. Teve 91,5% dos votos e quer que as pessoas acreditem nisso, mas desmente que tenha amealhado US$ 1 bilhão em bancos europeus.

Nazarbayev está sentado em imensas reservas de petróleo. Na sua terra, oposicionista vai embora e jornalista apanha. Houve uma época em que pagava os melhores mensalões com diamantes. Quando quer conversar assunto sério, chama o convidado para a sauna. Com os dois pelados, só ele grava.
 

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