Livraria da Folha

 
24/05/2010 - 21h19

"Os Diários de Carrie" apresenta 1º amor da colunista de "Sex and the City"; leia trecho

da Livraria da Folha

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Livro apresenta Sebastian Kydd, o primeiro amor de Carrie Bradshaw
Livro apresenta Sebastian Kydd, primeiro amor de Carrie Bradshaw

Às vésperas da estreia do segundo longa de "Sex and the City", marcada para a próxima sexta-feira (28) chega às livrarias "Os Diários de Carrie", obra que apresenta a adolescência da protagonista fashion Carrie Bradshaw.

Candace Bushnell, autora do livro que deu origem à série e uma das escritoras mais badaladas de Nova York, revela neste diário os motivos que levaram Carrie do interior à Big Apple.

No livro estão expostos os segredos da estudante que sonha em ser escritora, mas vive o drama de prestar vestibular para biologia para agradar ao pai. Marca registrada da personagem, os comentários irônicos e sarcásticos sobre as mais diversas situações cotidianas continuam.

A história se passa na década de 80 e começa no último ano de Carrie na escola, em Connecticut. "Os Diários de Carrie" revela quem eram suas amigas, como elas viviam e quais eram os seus sonhos. Por último, mas não menos importante, o romance também apresenta quem foi o cara por quem Carrie se apaixonou e a grande decepção que ele causou em sua vida adolescente.

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Sarah Jessica Parker como Carrie Bradshaw em cena de "Sex and the City 2", que estreia nesta sexta dia 28
Sarah Jessica Parker como Carrie Bradshaw em cena de "Sex and the City 2", que estreia nesta sexta dia 28

*

CAPÍTULO UM

Uma princesa em outro planeta

Dizem que muita coisa pode acontecer em um verão.

Ou não.

É o primeiro dia do último ano da escola e, pelo que posso perceber, estou exatamente igual ao ano passado.

Assim como minha melhor amiga, Lali.

- Não se esqueça, Bradley: precisamos arranjar namorados este ano - diz ela, dando partida na picape vermelha que herdou de um de seus irmãos mais velhos.

- Saco. - Era pra gente ter arranjado namorado no ano passado e nada. Abro a porta e entro correndo, escondendo a carta dentro do livro de biologia, onde, imagino, não possa causar grandes danos. - Já conhecemos todos os garotos da escola. E...

- Na verdade, não os conhecemos - diz Lali, enquanto muda para marcha a ré, olhando por cima do ombro. De todas as minhas amigas, Lali é a que dirige melhor. Seu pai é policial e insistiu para que ela aprendesse a dirigir quando tinha 12 anos, para o caso de alguma emergência.

- Ouvi dizer que tem um garoto novo - sugere ela.

- E daí? - O último garoto novo que entrou na nossa escola acabou se revelando um sequelado que nunca mudava de macacão.

- Jen P disse que ele é bonitinho. Muito bonitinho.

- Ahã. - Jen P era a presidente do fã-clube de Leif Garrett na sexta série. - Se ele for realmente bonitinho, Donna LaDonna vai ficar com ele.

- Ele tem um nome esquisito - observa Lali. - Sebastian alguma coisa. Sebastian Little?

- Sebastian Kydd? - Engasgo.

- Isso mesmo - responde, entrando no estacionamento do colégio. Ela me olha desconfiada. - Conhece ele?

Hesito, meus dedos já procurando a maçaneta.

Meu coração está pulando até a garganta; se eu abrir minha boca, tenho medo de que ele pule pra fora.

Sacudo a cabeça.

Já passamos da porta principal da escola quando Lali repara em minhas botas. São de vinil branco e têm uma rachadura num dos bicos, mas são autênticas botas go-go do começo dos anos 1970. Imagino que as botas tenham tido uma vida muito mais interessante que a minha.

- Bradley. - Ela diz, olhando as botas com desprezo. - Como sua melhor amiga, não posso permitir que use essas botas no primeiro dia do nosso último ano.

- Tarde demais - digo afetadamente. - Além disso, alguém tem que ousar um pouco por aqui.

- Mas não vá ousar demais. - Lali faz uma mímica de arma com uma das mãos, beija a ponta do dedo e aponta para mim antes de virar para ir até seu armário.

- Boa sorte, Pantera - digo. Ousar demais. Rá. Estou longe disso. Principalmente depois da carta.

"Cara Srta. Bradshaw", dizia.

Obrigado por se inscrever no Seminário de Verão de Literatura Avançada da New School. Apesar de suas histórias serem promissoras e imaginativas, lamentamos informar-lhe que no momento não podemos lhe oferecer uma vaga no programa.

Recebi a carta na última terça-feira. Li e reli umas 15 vezes, só para ter certeza, e então tive de largá-la. Não que eu me ache muito talentosa nem nada, mas, pela primeira vez na vida, fiquei na expectativa de ser.

Não contei a ninguém sobre ela. Eu não tinha nem contado a ninguém que havia me inscrito, nem mesmo para meu pai. Ele estudou na Brown e quer que eu também vá pra lá. Ele acha que eu seria uma boa cientista. E se eu não me der bem com estruturas moleculares, sempre posso mudar para biologia e estudar insetos.

Já estou na metade do corredor quando vejo Cynthia Viande e Tommy Brewster, o casal vinte dos Ocos da Castlebury. Tommy não é muito esperto, mas é pivô do time de basquete. Cynthia, por outro lado, é a representante de classe do último ano, presidente do comitê de formatura, integrante ilustre do National Honor Society, e aos 10 anos já tinha ganhado todas as medalhas de escoteira. Ela e Tommy namoram há três anos. Tento não prestar muita atenção neles, mas, em ordem alfabética meu sobrenome vem exatamente antes do de Tommy, então meu armário fica ao lado do dele e tenho de sentar a seu lado nas reuniões, razão pela qual sou basicamente forçada a olhar para ele - e para Cynthia - todo dia.

- E não fique fazendo aquelas caretas durante a reunião - repreendeu Cynthia. - Hoje é um dia muito importante pra mim. E não se esqueça do jantar do papai no sábado.

- E a minha festa? - Tommy protesta.

- Deixe para fazer a festa na sexta à noite - rebate Cynthia.

Pode até ser que haja um ser humano de verdade dentro de Cynthia, mas, se tem, eu nunca vi.

Abro a porta do meu armário. Cynthia subitamente levanta os olhos e me vê. Tommy me encara sem expressão, como se não fizesse a mínima ideia de quem eu sou, mas Cynthia é educada demais para isso.

- Olá, Carrie - cumprimenta ela, como se tivesse 30 anos em vez de 17.

Ousar. É uma coisa difícil nessa cidadezinha.

- Bem-vinda ao inferno - diz uma voz atrás de mim.

É um dos meus melhores amigos, Walt. Ele é namorado de outra melhor amiga minha, Maggie. Walt e Maggie estão namorando há dois anos, e nós três fazemos praticamente tudo juntos. O que parece meio estranho, mas Walt é como uma das meninas.

- Walt - diz Cynthia. - Era exatamente você que eu queria encontrar.

- Se quer que eu participe do comitê de formatura, a resposta é "não".

Cynthia ignora a piadinha de Walt:

- É sobre Sebastian Kydd. Ele voltou mesmo para a Castlebury?

De novo não. Meus nervos se acendem como luzinhas numa árvore de Natal.

- É o que Doreen diz. - Walt dá de ombros, como se não ligasse a mínima. Doreen é mãe de Walt e conselheira na Castlebury High. Ela alega saber de tudo, e
passa todas as notícias de lá para Walt: as boas, as ruins e as completamente mentirosas.

- Ouvi dizer que ele foi expulso de uma escola particular por tráfico de drogas - diz Cynthia. - Preciso saber se vamos ter problemas.

- Não tenho ideia - responde Walt, abrindo um enorme e falso sorriso para ela. Walt considera Cynthia e Tommy quase tão irritantes quanto eu considero.

- Que tipo de drogas? - pergunto casualmente enquanto nos afastamos.

- Analgésicos?

- Como em O vale das bonecas? - É meu livro secreto favorito, junto com o DSM III, que é um breve manual sobre doenças mentais. - Onde é que se
conseguem analgésicos hoje em dia?

- Ah, Carrie, eu sei lá - responde Walt, já desinteressado. - Com a mãe dele?

- Duvido. - Tento tirar da minha cabeça a lembrança do meu primeiro e último encontro com Sebastian Kydd, mas ela volta mesmo assim.

Eu tinha 12 anos e começara a entrar numa fase desajeitada. Tinha pernas finas e nenhum peito, duas espinhas e cabelo frisado. Também estava usando óculos de gatinha e carregando um exemplar já todo marcado de What About Me?, de Mary Gordon Howard. Eu era obcecada por feminismo. Minha mãe estava reformando a cozinha dos Kydd, e tínhamos parado na casa deles para ver o andamento do projeto. De repente, Sebastian apareceu na porta. E, sem motivo algum, completamente do nada, eu solto:

- Mary Gordon Howard acha que a maioria das relações sexuais pode ser classificada como estupro.

Por um momento, só houve silêncio. A Sra. Kydd sorriu. Era o final do verão, e seu bronzeado estava realçado por seu short verde e rosa de estampa em espiral. Ela usava sombra branca nos olhos e batom cor-de-rosa. Minha mãe sempre dizia que a Sra. Kydd era considerada uma mulher muito bela.

- Espero que você mude de ideia quanto a isso quando se casar - disse ela.

- Ah, não pretendo me casar. É uma forma de prostituição legalizada.

- Minha nossa!

A Sra. Kydd riu, e Sebastian, que havia parado na entrada enquanto saía, disse:

- Vou nessa.

- De novo, Sebastian? - A Sra. Kydd exclamou com uma ponta de irritação. - Mas as Bradshaw acabaram de chegar.

Sebastian deu de ombros:

- Vou pra casa do Bobby tocar bateria.

Fiquei olhando para ele em silêncio, minha boca aberta. Estava claro que Mary Gordon Howard nunca conheceu um Sebastian Kydd.

Foi amor à primeira vista.

No auditório, sento em meu lugar ao lado do Tommy Brewster, que está batendo no garoto à sua frente com um caderno. Uma menina no corredor está perguntando se alguém tem um absorvente, enquanto duas garotas atrás de mim estão sussurrando animadamente sobre Sebastian Kydd, que parece ficar cada vez mais em evidência sempre que seu nome é mencionado.

- Ouvi dizer que ele foi preso...

- A família dele perdeu todo o dinheiro...

- Nenhuma garota conseguiu segurá-lo por mais de três semanas...

Tento tirar Sebastian Kydd da minha cabeça, fingindo que Cynthia Viande não é uma colega de escola e sim uma espécie rara de pássaro. Habitat: qualquer palco que a aceite. Plumagem: saia de tweed, blusa branca com suéter de cashmere, sapatos confortáveis e uma fileira de pérolas que provavelmente são verdadeiras. Ela não para de mudar seus papéis de um braço para o outro e de puxar sua saia para baixo, então talvez ela esteja, sim, um pouco nervosa no final das contas. Sei que eu estaria. Não ia querer, mas estaria. Minhas mãos estariam tremendo e minha voz sairia esganiçada, e depois eu me odiaria por não ter controle sobre a situação.

O diretor, Sr. Jordan, vai até o microfone e diz um monte de coisas chatas sobre chegar na hora certa para as aulas e algo sobre um novo sistema de deméritos, e então a Sra. Smidgens os informa que o jornal da escola, The Nutmeg, está procurando repórteres e ainda discursa a respeito de uma história bombástica sobre a comida da lanchonete que sairá na edição dessa semana. Finalmente, Cynthia vai até o microfone.

- Esse é o ano mais importante da nossa vida. Estamos parados na beira de um grande precipício. Em nove meses, nossa vida estará irreparavelmente mudada - declara ela, se achando o próprio Winston Churchill ou coisa parecida. Estou quase esperando que ela acrescente que tudo que temos a temer é o medo em si, mas, em vez disso, ela continua: - Então este ano se resumirá a momentos inesquecíveis desta fase que se encerra. Momentos que lembraremos para sempre. A expressão de êxtase de Cynthia transforma-se em irritação quando a cabeça de todos começa a virar para o meio do auditório.

Donna LaDonna está descendo o corredor. Ela está vestida como uma noiva, num vestido branco com um profundo decote em V, os seios grandes acentuados por uma pequena cruz de diamantes pendurada numa delicada corrente de platina. Sua pele é como alabastro; em um dos pulsos, uma constelação feita de pulseiras de prata que soam como sinos quando mexe o braço. O auditório fica em silêncio.

Cynthia Viande se inclina para o microfone:

- Olá, Donna. Que bom que conseguiu vir!

- Obrigada - Donna diz e se senta.

Todos riem.

Donna acena com a cabeça para Cynthia e dá um pequeno tchau, como se indicando que ela deve continuar. Donna e Cynthia são amigas daquele jeito estranho que as garotas ficam quando pertencem ao mesmo grupinho, mas não se gostam muito.

- Como eu estava dizendo - Cynthia recomeça, tentando reconquistar a atenção do público -, este ano se resumirá a momentos inesquecíveis desta fase que se encerra. Momentos que lembraremos para sempre. - Ela aponta para técnico de som, e a música "The Way We Were" começa a tocar nos alto-falantes.

Eu gemo e enterro o rosto em meu caderno. Começo a dar risadinhas junto com todo mundo, mas então me lembro da carta e de repente fico deprimida de novo.

Mas, toda vez que me sinto mal, tento me lembrar do que uma garotinha me disse uma vez. Ela tinha bastante personalidade - tão feia que era bonitinha. E dava pra perceber que ela também sabia disso.

- Carrie? - ela pergunta. - E se em outro planeta eu fosse uma princesa? E ninguém deste planeta soubesse?

De certa forma, aquela pergunta ainda me deixa meio embasbacada. Quero dizer, não é verdade? Quem quer que sejamos aqui, podemos muito bem ser princesas em outro lugar. Ou escritoras. Ou cientistas. Ou presidentes. Ou quem diabos queiramos ser que todo mundo diz que não podemos.

*

"Os Diários de Carrie"
Autor: Candace Bushnell
Editora: Galera Record
Páginas: 382
Quanto: R$ 34,90
Onde comprar: 0800-140090 ou na "Livraria da Folha"

 
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