Livraria da Folha

 
30/10/2010 - 15h10

Palocci revela em livro "tiro de canhão" disparado contra ele por Dilma Rousseff

colaboração para a Livraria da Folha

No livro "Sobre Formigas e Cigarras" (Objetiva), o ex-ministro da Fazenda, Antônio Palocci, revela os bastidores do primeiro governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2006). Além de relatar sua experiência na área econômica, Palocci fala sobre a crise do "mensalão", a relutância de Lula em disputar a reeleição, e de como o nome dele chegou a ser contado para disputar a Presidência da República em 2006. Ele também dá suas impressões sobre a avalanche de "denúncias" bancadas contra ele pela oposição. Até disparos feitos pela então ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, hoje candidata petista a presidente, Palocci disse que enfrentou.

"Mas não só de fortalezas adversárias viriam os torpedos. Um novo e inesperado foco de tensão com origem no interior do próprio governo se somaria aos ataques cada vez mais frequentes de setores da oposição, que se esforçavam para me levar a depor em uma das CPIs", conta Palocci no livro.

Naquela época, o ministro do Planejamento, Paulo Bernado, revelou que o governo estudava um projeto de Lei instituindo o compromisso fiscal de longo prazo. Bernardo havia apresentado a proposta numa reunião da Câmara de Política Econômica do governo algumas semanas antes. "Lula sabia do projeto e autorizara o início das tentativas sobre o assunto. O ex-ministro e deputado federal Delfim Netto era um grande entusiasta da proposta e fazia prospecções no congresso para viabilizar a apresentação de um projeto de Lei com esse objetivo", diz Palocci.

Questionada a respeito por jornalistas, a ministra Dilma Rousseff classificou a proposta de "rudimentar". "Contrária à ideia do alongamento do esforço fiscal, tema em que sempre se mostrou resistente, ela bateu duro na tese e defendeu os gastos crescentes do governo como 'meritórios'. A declaração provocou uma nova polêmica no governo e, menos de 24 horas depois, ainda que não tivesse pronunciado uma única palavra, lá estava eu metido em outra confusão. Como era público que o compromisso fiscal de longo prazo era uma tese defendida por mim desde o início do governo, inúmeros jornalistas buscaram me levar para o epicentro da disputa. 'Era só o que faltava', foi o que me ocorreu assim que o caso veio à tona. Não bastassem os ataques da oposição, agora o tiro de canhão vinha de dentro do próprio governo", afirma Palocci.

Divulgação
Palocci fala da crise que culminou em sua queda na Fazenda
Palocci fala da crise que culminou em sua queda na Fazenda

Em vários momentos do livro "Sobre Formigas e Cigarras", a narrativa ganha um tom de desabafo. "Entre o dia em que o chefe de gabinete da Presidência, Gilberto Carvalho, veio me sondar sobre uma possível candidatura presidencial e a minha saída do Ministério da Fazenda foram exatos oito meses", diz.

De acordo com o ex-ministro, o presidente Lula sinalizava não estar disposto a disputar a reeleição. Lula era contrário ao mecanismo que permite ao presidente disputar o segundo mandato desde que a ideia havia sido lançada pelo presidente Fernando Henrique Cardoso para se viabilizar por mais quatro anos no cargo. Palocci relembra o diálogo que teve com Gilberto Carvalho: "O presidente está realmente pensando em não ser candidato ", revelou Gilberto. "E nós vemos o seu nome como opção. O Ciro Gomes também é uma alternativa, mas percebemos uma preferência por seu nome". "Se o presidente não quiser mesmo disputar a reeleição, é melhor vocês pensarem no Ciro", atalhei, com firmeza. "Não quero de jeito nenhum e por vários motivos, mas principalmente porque o trabalho que estou fazendo na economia é realmente incompatível com a candidatura".

Ainda segundo Palocci, até às vésperas da crise eclodir, a oposição fazia um jogo de empurra para decidir quem deveria ir para o sacrifício da derrota tida como certa nas eleições presidenciais de 2006 para um Lula com forte aprovação popular. Os dois principais partidos de oposição estudavam a hipótese de lançarem candidaturas separadas - a do prefeito do Rio de Janeiro, César Maia, pelo PFL, e, provavelmente, a do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, pelo PSDB.

Depois vieram as sucessivas crises: a do "mensalão", a dos "bingos" e a dos "correios". "Lula ficou preocupado. Principalmente, porque se surpreendia com as novas revelações e com a horrível sensação de que aquilo parecia não ter fim. De fato, a figura de Marcos Valério e os seus empréstimos ao PT não eram conhecidos no Palácio do Planalto. Em certas ocasiões, Lula se irritava profundamente. Outras vezes, ficava quase deprimido", garante Palocci.

"Com o recrudescimento da crise, a situação do ministro José Dirceu ficou muito difícil. Ele conversou algumas vezes com Lula e concluíram ser preferível que enfrentasse as acusações no Congresso, como deputado federal. Ao contrário do que muitos insinuaram a saída de Dirceu não significou, em momento algum, o fortalecimento do Ministério da Fazenda ou mesmo do meu papel dentro do governo. Apesar dos conflitos existentes, nossa convivência manteve o equilíbrio razoável e possível e, na maior parte do tempo, foi muito produtiva", diz.

Palocci previa que com a saída do Dirceu, até então o "o homem forte" de Lula, ele passaria a ser o novo alvo. "Quando ele (Dirceu) deixou o governo, chamei meu assessor de imprensa, Marcelo Netto, para avaliar possíveis desdobramentos do episódio", conta, dando detalhes do diálogo: "Prepare-se, meu caro", avisei. "A coisa vai piorar para nós. Não deixe crescer essa conversa de que estamos fortalecidos ou que, a partir de agora, assumirei responsabilidades também na área política, pois isso só vai trazer a crise para a Fazenda".

De fato, as denúncias vieram de todos os lados. "Nada parecia baixar a pressão da oposição. O tiroteio contra mim jamais cessaria por completo", descreve. "Foi um período de grande desgosto. Certamente, o momento mais difícil da minha vida. Minha família se sentia muito constrangida e queria reagir. Aquele era um sofrimento para suportar calado", desabafa. E em seguida faz a seguinte reflexão: "Olhando agora, com mais calma, os fatos passados, tento reconstruir e entender as turbulências da crise política que levou à minha saída do governo, reconhecer erros, aprender com eles. Entendo que não há uma explicação única e simples, como, em geral, são as coisas na política".

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"Sobre Formigas e Cigarras"
Autor: Antônio Palocci
Editora: Objetiva
Páginas: 214
Quanto: R$ 32,90 (preço promocional, por tempo limitado)
Onde comprar: 0800-140090 ou na Livraria da Folha

 
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