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25/12/2009 - 16h52

Saiba tudo sobre o Grupo Ornitorrinco de teatro; leia trecho

da Folha Online

Divulgação
Saiba tudo sobre o Grupo Ornitorrinco e seus idealizadores
Saiba tudo sobre o grupo teatral Ornitorrinco e seus idealizadores

O Grupo Ornitorrinco foi criado em abril de 1977 por Luiz Roberto Galízia, Cacá Rosset e Maria Alice Vergueiro e ganhou destaque pelas encenações provocantes, lúdicas e inovadoras, cheias de deboche e efeitos pirotécnicos.

Com o intuito de mostrar toda a história teatral do grupo, a atriz e organizadora Christiane Tricerri acaba de publicar "Teatro do Ornitorrinco" (Imprensa Oficial, 2009), que fala sobre cada uma das montagens da companhia e também de seus idealizadores.

Abaixo, veja um trecho no qual Cacá Rosset conta sobre sua iniciação no teatro.

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Cena II

Cacá Rosset
O primeiro caderno do aluno de direção teatral

No Colégio de Aplicação, Cacá Rosset começou a interessar-se por teatro. Participou de algumas montagens como ator. Na ECA ele encontrou novamente Maria Alice Vergueiro. Como aluno, diretor, ator e tradutor, Rosset assumiu vários papéis dividindo a ribalta ao longo dos anos com sua professora-atriz-musa Maria Alice Vergueiro.

Victor Nosek
Na foto, ator Cacá Rosset em Pária de August Strindberg, 1977
Na foto, ator Cacá Rosset em Pária de August Strindberg, 1977

Cacá Rosset: Meu primeiro contato com o teatro foi nos anos 1960 no Colégio de Aplicação. Foi, talvez, o primeiro colégio experimental da cidade ligado à Faculdade de Filosofia da USP. Era uma instituição que tinha proposta educacional totalmente nova e revolucionária. Havia um enfoque para artes e humanidades. Foi justamente no Colégio de Aplicação que eu, aos 11 anos, conheci Maria Alice Vergueiro.

No Colégio de Aplicação, tendo aulas com Maria Alice Vergueiro, começamos a montar a primeira peça que fiz na minha vida como ator. Foi um texto, do dramaturgo argentino Dragún (Osvaldo Dragún), chamado O homem que virou cachorro, com direção da Maria Alice Vergueiro. Eu estava com 12 anos. Lembro da minha segunda experiência no palco, ainda no Colégio de Aplicação... era uma peça de Molière, As preciosas ridículas, também com direção de Maria Alice. Eu fazia o Marquês de Mascarille que, na verdade, era um criado que o patrão transformava num marquês pedante para enganar a namorada dele. É um personagem muito engraçado, com maneirismos da época. Nós usávamos as perucas feitas de algodão, era uma produção escolar muito caprichada. Nessa peça, quando eu fui sair de cena, acabei caindo de bunda no chão e a plateia veio abaixo. E assim, no segundo dia, acabei repetindo a cena, só que fazendo um trabalho de ator, e o público riu do mesmo jeito. Com essa queda e essa "bundada" no chão descobri Molière e a comédia.

Além dos trabalhos de montagem de peças e leituras de textos, Maria Alice desenvolvia ainda duas coisas muito interessantes. Ela convidava pessoas bacanas para conversar com os alunos. Lembro, entre outros convidados, de Guarnieri. A Maria Alice nos levava também para ver espetáculos proibidos para menores de 18 anos. A gente viu tudo nos anos 1960. Paulo Autran, fazendo Édipo rei; Cacilda Becker, em Esperando Godot.

As montagens do Teatro de Arena: Arena canta Zumbi e Arena canta Tiradentes. Vimos também espetáculos do Oficina: Pequenos burgueses, Rei da vela e Na selva das cidades. Espetáculos aos quais a gente não teria possibilidade de assistir porque seríamos barrados na porta. Eu ficava fascinado com as peças. Na adolescência comecei a me interessar por teatro por causa das montagens escolares e dos espetáculos a que assisti. Lembro que, nessa época, em São Paulo, havia grande efervescência cultural.

Na minha família não havia ninguém ligado ao teatro. Meu pai era engenheiro; minha mãe, médica e minha irmã, economista. Mas sempre tive apoio familiar na escolha por teatro. Quando fui fazer vestibular, ainda estava em dúvida. Eu estava no terceiro colegial e resolvi fazer cursinho para economia. Na metade do ano tive caxumba e fiquei um mês de cama. Nessa convalescença, resolvi fazer comunicação. Prestei vestibular para a ECA. Quando fui aprovado, não sabia muito bem se faria rádio e TV, jornalismo... porém, logo de cara entrei no grupo de teatro do centro acadêmico.

Quando cheguei ao quinto semestre já estava com a opção definida: o curso de direção teatral. Na ECA, reencontrei Maria Alice Vergueiro. A primeira peça que eu dirigi, curricularmente foi Lux in tenebris, de Brecht, em que a Maria Alice participou como atriz. Depois, num outro espetáculo, O cabaré da rainha louca, trabalhei como ator. Nessa peça Maria Alice era a Rainha Louca, a dona desse cabaré, e eu, Ramon, el cafetón. Maria Alice ficava de quatro e eu a enrabava. Ela gritava: "Tudo pelo teatro nacional!". Os professores acharam um absurdo uma professora ser enrabada por um aluno. Foi aberta uma comissão de sindicância, Sábato Magaldi a defendeu. Além de crítico teatral, ele era também professor. Sábato até chegou a falar que, historicamente, sempre os professores "enrabaram" os alunos. Assim, ao menos uma vez, por que um aluno não poderia "enrabar" uma professora? Maria Alice acabou sendo expulsa da faculdade.

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"Teatro do Ornitorrinco"
Autora: Christiane Tricerri
Editora: Imprensa Oficial
Páginas: 524
Quanto: R$ 159,99
Onde comprar: Pelo telefone 0800-140090 ou pelo site da Livraria da Folha.

 
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