Livraria da Folha

 
19/02/2010 - 11h05

"Quis privilegiar o futebol como encantamento", diz Milton Leite sobre seu novo livro

JULIANA FARANO
colaboração para a Livraria da Folha

Em ano de Copa, todo mundo passa a entender e a gostar de futebol. Os que já eram fanáticos viram os técnicos da vez e não medem palavras para dar pitacos na escalação oficial. Aqueles que não são muito ligados ao esporte, passam a acompanhar o noticiário da modalidade para saber o nome e a função de alguns jogadores do Brasil e arriscar um ou outro palpite mais tático. Até mesmo quem jura nunca trocar um passeio numa tarde domingo por um estádio lotado parece criar um pouco mais de compaixão com quem faz questão de estar sempre no meio da massa, seja torcendo pelo seu time do coração, seja pela seleção brasileira ou até mesmo pela Argentina -- os "do contra" nunca deixarão de existir.

Divulgação
Editora lança livro sobre as grandes equipes que defenderam o Brasil
Editora lança livro sobre as grandes equipes que defenderam o Brasil

Nada mais propício para esta época que antecede a Copa do Mundo do que relembrar as melhores equipes que o país já reuniu. Quem ganhou a tarefa de escalar as seleções e falar sobre elas foi Milton Leite, que acaba de lançar "As Melhores Seleções Brasileiras de Todos os Tempos" pela editora Contexto. No livro, o jornalista esportivo apresenta grandes reportagens sobre os times vencedores de 1958, 1962, 1970, 1994 e 2002, além do marcante grupo de 1982.

"Mesmo quem não entende nada de futebol vai compreender como esses grupos chegaram a resultados tão expressivos", afirma Leite, que sabe que pode provocar polêmica em suas escolhas. Ele, que diz preferir a parte lúdica à pragmática do esporte, optou por incluir a equipe comandada por Telê em 1982, de Sócrates, Zico, Falcão, Junior, entre outros, que apesar de fazer bonito, não levantou a taça. "Poderia ter colocado também o time de 1950, mas seria muito ruim escolher uma seleção que marcou época carregando a maior derrota da história do nosso futebol", explica.

Em entrevista à Livraria da Folha, Milton Leite fala sobre o livro, analisa o time formado por Dunga e dispara críticas ao despreparo do Brasil para a realização da Copa do Mundo de 2014.

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LIVRARIA DA FOLHA - Quando você começou a se interessar por futebol?
MILTON LEITE - Desde menino, sempre adorei jogar bola na rua, jogar botão. Sou apaixonado por futebol e por esportes desde que me entendo por gente.

LIVRARIA - Como surgiu a oportunidade para escrever o livro? Você já tinha material pronto sobre o assunto?
LEITE - O meu amigo Maurício Noriega lançou "Os 11 Melhores Técnicos do Futebol Brasileiro" no ano passado, pela mesma editora, e no dia do coquetel de lançamento ele me apresentou ao professor Jaime Pinsky, diretor da empresa. Daí surgiu a proposta. Além dos livros sobre o assunto que eu já tinha e que me ajudaram, comprei e li outros tantos. Também realizei diversas pesquisas sobre o tema com a ajuda da Internet.

LIVRARIA - Em quanto tempo você escreveu o livro?
LEITE - Desde o encontro no lançamento do livro do Noriega até a entrega dos originais, foram uns seis meses, mais ou menos.

LIVRARIA - O formato do livro é baseado em grandes reportagens sobre as seleções. Como você chegou nessa ideia e o que ela traz de melhor ao leitor?
LEITE - Cheguei à conclusão de que era a melhor maneira de atingir tanto pessoas que gostam e conhecem futebol, como aquelas que não são fanáticas, não lêem nem assistem tudo o que está à disposição. Tentar descrever a formação daquelas equipes, com palavras dos próprios personagens, me pareceu a melhor maneira de atingir um maior número de leitores.

LIVRARIA - O que o leitor deve encontrar de mais interessante e curioso no livro?
LEITE - Um dos méritos desse trabalho é contar a história destas campanhas vencedoras e reuni-las num mesmo volume. É uma boa maneira de comparar como cada trabalho surgiu e como foi realizado e, ao mesmo tempo, perceber que o que eles têm em comum é o fundamental: o talento do jogador brasileiro. Foram os craques em campo que ganharam os mundiais. Parece óbvio, mas não é. Organizada ou não, com bons técnicos ou não, com trabalhos de longo prazo ou não, sem talento, nenhuma das seleções teria sucesso.

LIVRARIA - Quais critérios você usou para escolher as seleções retratadas?
LEITE - Primeiro, tinham que ser seleções que disputaram Copas do Mundo. A partir daí, foram dois critérios: a conquista do título, que é a parte mais pragmática, e o lado lúdico, do futebol como encantamento, beleza e emoção. Você entra numa competição para ganhar. Para quem não vive do futebol, como eu, nem sempre ganhar é o mais importante. Encantar é fundamental. Por isso a seleção de 1982 está entre elas. Teria entrado a de 1950 também, outra equipe que encantou. Mas seria muito ruim escolher uma seleção que carregou a maior derrota da história do nosso futebol. Faço justiça a ela no texto de abertura, mas não virou um capítulo.

LIVRARIA - Entre as seleções escolhidas, qual você considera a melhor?
LEITE - Acho quase impossível responder a essa pergunta. São épocas muito diferentes. O futebol que se praticava em 1958 é completamente diferente do jogado em 2002. Não faço essa eleição no livro, mas tenho minhas preferências pessoais, que são muito mais afetivas do que técnicas. A seleção de 1970 foi aquela que me fez me apaixonar pelo futebol, quando eu tinha 11 anos. Além disso, foi a primeira Copa que o Brasil viu ao vivo, com a TV aproximando o público das seleções. A de 1982 também tem um lugar especial nas minhas lembranças por causa do encantamento e da personalidade daquele grupo de jogadores.

LIVRARIA - Em sua opinião, qual foi o melhor jogador brasileiro de todas as Copas?
LEITE - Pelé é uma escolha óbvia. Mas colocaria o Garrincha na sequência. Também tem lugar pro Romário, Bebeto, Zico, Sócrates, Ronaldo, Rivaldo e muitos outros. É duro escolher um só.

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Milton Leite apresenta grandes reportagens sobre as melhores seleções brasileiras
Milton Leite apresenta grandes reportagens sobre as melhores seleções brasileiras

LIVRARIA - O que você acha da seleção atual?
LEITE - Não encanta como tantas outras. Ao contrário, em minha opinião, joga mal a maioria das partidas. Como tem vencido, acaba conquistando o torcedor. O Brasil é muito pragmático nesse aspecto. Quer ganhar, na importa como. A minoria prefere a parte mais lúdica, como eu.

LIVRARIA - Como você analisa o Dunga como técnico?
LEITE - Não costumo dar a importância que, em geral, a média dá aos treinadores. Acredito que o papel dele é muito mais não atrapalhar. O Dunga é pragmático além da conta. Poderíamos ter uma seleção jogando muito mais bonito do que joga. Como já disse, não é isso que vai ou não nos fazer campeões na África do Sul. Essa possibilidade está muito mais com Kaká, Júlio César, Robinho e Luiz Fabiano. Se eles estiverem bem naquele mês da Copa, temos boas chances.

LIVRARIA - Você acha que a presença maciça de jogadores que atuam no exterior faz com que o povo perca um pouco da identificação com o time?
LEITE - Não é só isso. Acredito que perdeu um pouco da identificação com o torcedor porque a política da CBF é fazer o time jogar apenas no exterior. A seleção só joga em casa pelas eliminatórias e porque é obrigada. Se pudessem, levavam as eliminatórias para a Europa ou para o mundo árabe. Em cada quatro anos, o Brasil só joga nove vezes por aqui. Isso sim, em minha opinião, tira a identidade da seleção.

LIVRARIA - Desta seleção atual, quais jogadores você destacaria?
LEITE - O goleiro Júlio César, hoje um dos melhores do mundo. Kaká, Robinho e Luiz Fabiano são outros dos quais se espera muito. Mas não se pode esquecer que Kaká não vem jogando bem e dizem ter um problema físico importante. Já era esperança de ser decisivo na Alemanha e não jogou nada. As pessoas colocam muito a culpa sobre o fracasso de 2006 nas costas do Ronaldo e do Adriano, mas esquecem que Ronaldinho Gaúcho e Kaká estavam no peso e foram muito mal no Mundial. Robinho não joga bem há dois anos.

LIVRARIA - Você convocaria o Ronaldinho? E o Ronaldo?
LEITE - O Gaúcho eu convocaria. Mas antes disso teria feito um longo e cuidadoso trabalho de recuperação da autoestima e parte técnica. Já o Ronaldo eu só convocaria se voltasse a ter silhueta de atleta. Com aquele sobrepeso pode até jogar bem aqui no Brasil, mas numa Copa do Mundo acho pouco provável, como já se viu em 2006.

LIVRARIA - Você aposta todas as suas fichas no Brasil?
LEITE - Acho que o Brasil está entre as equipes que podem voltar com o título, aliás, sempre está. Mas colocaria a Inglaterra, que agora conta com um técnico que sabe ganhar, o italiano Fábio Capello, a Espanha, desde que deixe de lado o complexo de vira-latas que um dia assombrou o Brasil, além das tradicionais Alemanha e Itália. Se a Argentina tivesse um técnico que se pudesse levar a sério, seria candidata. Mas com Maradona, não dá.

LIVRARIA - Você acha que o Brasil estará pronto para receber uma Copa do Mundo em 2014?
LEITE - Não, está muito longe disso. O Brasil já sabe que vai ser sede há três anos e nada foi feito. Nenhuma obra foi iniciada. Nossos aeroportos são uma vergonha, sem falar no transporte público nas grandes cidades. Faltam três anos para a Copa das Confederações e temos que ter pelo menos quatro estádios prontos. Será que teremos tempo para não passarmos o constrangimento de levarmos puxões de orelha da Fifa?

LIVRARIA - Neste ano de Copa do Mundo diversos livros estão sendo lançados sobre futebol. Em sua opinião, qual é o papel da literatura na preservação da memória do esporte?
LEITE -Fundamental. Pensei nisso também quando comecei a escrever. Muita gente que torce pela seleção hoje não faz idéia de quem foi Nilton Santos, da importância do Zagallo, de como o Vavá foi fundamental em duas Copas ou da missão de Amarildo de substituir Pelé em 1962. São muitos os exemplos e os livros mantêm vivas essas lembranças. Não se constrói futuro sem respeito e reverência ao passado.

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"As Melhores Seleções Brasileiras de Todos os Tempos"
Autor: Milton Leite
Editora: Contexto
Páginas: 224
Quanto: R$ 33,00
Onde comprar: Pelo telefone 0800-140090 ou pelo site da Livraria da Folha

 
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