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21/01/2007 - 09h01

Bolívia celebra hoje em São Paulo um ano de revolução indígena

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ANDREA MURTA
da Folha Online

Apesar dos dissabores causados no Brasil pela insistência da Bolívia em revisar os preços de seu gás natural, além da exigência de flexibilização das regras do Mercosul para permitir sua adesão, o país do presidente Evo Morales escolheu São Paulo para abrir as comemorações do primeiro ano de sua "Revolução Cultural e Democrática".

"Morales está há um ano no poder, apesar das expectativas negativas dos neoliberais, que achavam que não conseguiríamos nos manter. Agora, vamos poder mostrar ao mundo que estamos em posição de festejar", afirmou o cônsul-geral da Bolívia em São Paulo, Jaime Almanza, que conversou com a Folha Online por telefone do Rio de Janeiro.

A festa em São Paulo faz parte de uma ofensiva de integração com o Brasil, que Almanza chama de "irmão mais velho" da Bolívia, mas o cônsul-geral não esconde as garras ao defender temas controversos como a elevação do preço do gás natural boliviano vendido ao país. "O que são US$ 300 milhões [cerca de R$ 639 milhões a mais] por ano para o Brasil, ou para a Petrobras? Somos um país pobre. Queremos um preço justo."

Quanto às disputas travadas na reunião de cúpula do Mercosul, realizada na última semana no Rio de Janeiro, acerca da adesão da Bolívia ao bloco, Almanza diminui a importância da oposição apresentada pela Argentina. O país só entra para o Mercosul se houver solução para o fato de ter tarifas de comércio mais baixas do que as praticada pelo bloco --a Bolívia não quer adotar a TEC (Tarifa Externa Comum), pois isso levaria a aumento de custos. E a Argentina não gostou da proposta.

"Na verdade não houve nenhuma real oposição, nem da Argentina nem de nenhum outro país. O que queremos, e será feito, é a avaliação cuidadosa das tarifas para corrigir todas as assimetrias", afirmou o cônsul-geral. Na última quinta-feira (18), o Mercosul aceitou formalmente criar um grupo de trabalho para avaliar, em seis meses, o pedido de adesão da Bolívia.

A celebração da revolução indígena boliviana, que contará com música e culinária típicas, será realizada hoje a partir das 15h na praça da Kantuta, rua Pedro Vicente, no bairro Caninde, em São Paulo. A data foi adiantada um dia para permitir maior participação (em um domingo), e no resto do mundo a celebração será amanhã. Será anunciada na ocasião o apoio boliviano à indicação de Evo Morales para o prêmio Nobel da Paz.

Leia a seguir a íntegra da entrevista com o cônsul-geral da Bolívia no Brasil, Jaime P. Almanza.

Folha Online - A Bolívia promove hoje em São Paulo e amanhã em todo o mundo a comemoração do 1° ano da Revolução Democrática e Cultural do país. Qual o objetivo da Bolívia em estender a celebração na América Latina e no mundo?

Jaime P. Almanza
- Estamos marcando uma nova fase da Bolívia. Faz um ano a entrada de Evo Morales no poder, um ano que os neoliberais achavam que não íamos agüentar nos manter. Então é uma mostra para o mundo e para a América Latina de que estamos em posição de festejar. O novo sistema que estamos implantando na Bolívia está dando certo.

Folha Online - O presidente Evo Morales gravou uma fala para ser divulgada em telões durante a festa em São Paulo. O sr. pode adiantar um pouco de seu conteúdo?

Almanza
- O presidente vai falar justamente sobre este processo neoliberal que nos excluiu, e que negou a nossa gente oportunidades. Vai ser uma mensagem de esperança, assim como uma defesa da integração sul-americana, e com o Brasil mais especificamente, que consideramos um país irmão. E dentro desta condição de irmandade, o presidente quer apresentar ao Brasil nossa nova política econômica e cultural --da revolução que celebramos-- para que os bolivianos não se sintam abandonados. É uma mensagem de otimismo.

O que queremos dizer a todos os brasileiros e latino-americanos com este evento de comemoração é que queremos nos integrar a todas as comunidades. Este é um momento festivo, de poder dizer que temos uma nova esperança de progresso. O Brasil, como disse o presidente Evo Morales, é como nosso irmão mais velho, e queremos participar da comunidade brasileira nos integrando socialmente, politicamente, empresarialmente.

É preciso deixar claro que a Bolívia e o presidente Evo Morales não os 'satãs' que a imprensa costuma apresentar.

Folha Online - Como se comparam as medidas da revolução da Bolívia, que nacionaliza reservas e busca distribuir a renda entre povos indígenas tradicionalmente oprimidos, com as medidas rumo ao socialismo adotadas na Venezuela por Hugo Chávez?

Almanza
- Na verdade, nossa revolução cultural é praticamente uma revolução indígena, dos excluídos, democrática. Temos uma autenticidade própria que não é comparável a de ninguém mais. Nosso caráter está associado aos movimentos sociais e ao nosso presidente, organizados justamente em conseqüência da exclusão que nos impôs o processo neoliberal.

É uma condição própria e específica da Bolívia, que não sofre nenhuma influência externa sobre o presidente Evo Morales.

Folha Online - Que tipo de apoio a Bolívia busca no Brasil e nos outros países da América Latina para esta revolução?

Almanza
- Estamos buscando justamente a integração. Um ponto importante é regularizar a documentação dos imigrantes bolivianos no Brasil. Temos tido bastante abertura com a reeleição do presidente [Luiz Inácio Lula da Silva]. Tivemos várias reuniões em Brasília com resultados muito bons.

Outro ponto importante é o reconhecimento de que a Bolívia é um país pobre, um país excluído, pequeno, onde os países naturais precisam ser vendidos a um preço justo, comercialmente falando. Estamos buscando no Brasil essa integração comercial, além da integração social dos abandonados e desprotegidos.

Também queremos nos integrar melhor com as empresas produtivas, como é o caso da Petrobras e de outras empresas menores. O Brasil tem nos dado grandes oportunidades, e estamos muito agradecidos. Estamos pedindo ajuda ao Brasil e o presidente Lula nos está entendendo.

Folha Online - Sobre a relação com a Petrobras, como o senhor a classificaria hoje, pouco menos de oito meses depois da nacionalização do gás natural da Bolívia (que afetou diretamente as operações da empresa brasileira), o status dos acordos comerciais com o Brasil?

Almanza
- As relações estão sem dúvida muito boas agora. Nos últimos dias, durante a cúpula do Mercosul no Rio, tivemos um diálogo aberto e claro com o presidente Lula, e estamos avançando muito neste sentido da integração comercial.

Com os recursos naturais que tem a Bolívia, e com a demanda destes recursos que tem o Brasil, é praticamente impossível pensar em desgastar essa relação. Hoje estamos falando de valores muito pequenos em relação ao aumento do gás natural -não é nada dramático como foi divulgado na mídia. O que são US$ 300 milhões (cerca de R$ 639 milhões) por ano para o Brasil, ou para a Petrobras?

Estamos falando de um desgaste que tivemos por conta de nada. Somos um país pobre, pequeno, e o Brasil está nos entendo. Vamos avançando muito positivamente em direção a uma relação comercial serena e tranqüila.

Folha Online - Também durante a cúpula do Mercosul, foi alvo de discussões o pedido de entrada da Bolívia no Mercosul, que exigiria uma flexibilização da TEC (Tarifa Externa Comum). Como o sr. avalia este processo, que sofreu também com certa oposição de países como a Argentina?

Almanza
- Na minha avaliação, após ser oficializado o pedido de entrada da Bolívia do Mercosul, não houve nenhuma real oposição, nem da Argentina nem de nenhum outro país.

O que queremos, e será feito, durante a Presidência do bloco por Nicanor Duarte [presidente do Paraguai que recebeu de Lula o posto rotativo ao final da cúpula] é a avaliação cuidadosa das tarifas para corrigir todas as assimetrias políticas e sociais entre os países-membros, em um processo absolutamente normal pelas regras do Mercosul.

Folha Online - Na comemoração da revolução será também anunciada a candidatura do presidente Evo Morales ao prêmio Nobel da Paz.

Almanza
- Realmente faremos durante a comemoração o lançamento do apoio à indicação de Evo Morales ao prêmio. Isso será feito no Brasil no dia 21 de janeiro (este domingo), e no dia 22 de janeiro no resto do mundo.

Ao lado de todas as entidades sociais bolivianas, vamos lançar o apoio a esta grande indicação, e esperamos receber também o apoio mundial.

Mas essa ação social que levou à indicação de Evo Morales já acontece há muitíssimos anos, e o que esperamos é que isso ajude a divulgar os objetivos que não são do presidente, mas da Bolívia e de toda a América Latina -de ajudar os mais pobres.

Estamos representando a população desamparada e queremos sensibilizar o mundo para obter mais apoio para nossa ação por meio desta candidatura.

Folha Online - Em um ano de seu governo, o país já enfrentou vários conflitos graves, com Províncias exigindo autonomia e choques entre a oposição e simpatizantes do governo que resultaram em violência e mortes em Cochabamba... A indicação de Morales neste momento não é um pouco contraditória?

Almanza
- Não. Quem nos provoca é a oposição neoliberal. Nós, ao contrário, não estamos contra nenhum movimento social. É a oposição que nos provoca. No caso de Cochabamba, a oposição se articulou para provocar os indígenas.

Queremos sempre, com humildade, apoiar os movimentos sociais, mas sem luta armada, sem agressões. Neste caso específico, a oposição é que se uniu e agiu contra os movimentos sociais que estavam se organizando.

Nossa posição sempre foi muito clara. Apoiamos o direito dos movimentos sociais de protestar contra a ação de um governador que provoca a democracia.

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