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18/08/2008 - 15h57

Mídia dos EUA perpetua era Bush

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CLAUDIA ANTUNES
Editora de Mundo da Folha de S.Paulo

Nomes do establishment da política externa americana já vieram a público anunciar que estamos em um mundo "apolar". Outros falam em "multipolaridade", alguns ainda em era "pós-americana". Os Estados Unidos, dizem em coro, continuam a ser uma potência econômica e militar sem igual, mas perderam poder relativo.

Era evidente que, nessas circunstâncias, o avanço americano em regiões que os russos consideram parte de sua "zona de segurança" encontraria resposta, nem que fosse sob a forma de mais uma guerra por procuração, como a que ocorre no Cáucaso.

Mas boa parte da imprensa americana e a imensa maioria dos seus chamados formadores de opinião parecem não ter sido avisados disso. Do "New York Times" à CNN, houve pressão contínua sobre o governo Bush para que fossem tomadas medidas de força contra a Rússia.

Os âncoras e jornalistas estão excitados por terem reencontrado em Vladimir Putin um inimigo menos ubíquo do que Bin Laden. A volta, como se possível, à bipolaridade da Guerra Fria, afinal tão simples, é uma perspectiva saudada com indisfarçável frenesi.

Encurralado em uma entrevista coletiva, o secretário da Defesa Robert Gates, veterano do combate ao "império do mal" soviético, teve de acrescentar um "fui claro?" quando questionado pela terceira vez se mandaria tropas para expulsar os russos do país ao qual os americanos prometeram o ingresso na Otan e que, em troca, forneceu 2.000 homens para a ocupação do Iraque.

Quem mais tenta tirar partido desse clima é John McCain, que elevou sua retórica a tal ponto que teve que soltar um comunicado para dizer que não, ele não mandaria soldados americanos para lutar contra o urso renascido.

Um artigo na página on-line da revista esquerdista "The Nation", de leitura marginal e que apóia Barack Obama, levantou a possibilidade de que McCain, cujo principal assessor de política externa foi lobista do governo georgiano, tenha estimulado o pequeno país a provocar a Rússia, sabendo que a volta do fantasma da Guerra Fria poderia favorecê-lo contra o democrata.

Essa é, aliás, a mesma teoria conspiratória que corre entre oposicionistas na Geórgia, que se preparam para dar o bote no presidente pró-ocidental. Do ponto de vista de Moscou, seria um fecho de ouro para a operação que mimetizou a ofensiva dos EUA contra o ditador sérvio Slobodan Milosevic, nos anos 90.

Confrontados de passagem com as analogias do Iraque e da Sérvia, em debate na CNN, o neoconservador Robert Kagan e o conservador moderado Michael O'Hanlon, do Instituto Brookings, logo as puseram de lado argumentando que tanto Saddam quanto Milosevic eram déspotas, enquanto o georgiano Mikhail Saakashvili é um democrata formado em Harvard.

A imprecisão do elogio ao georgiano, que vinha se firmando como mais um autocrata, confirma que recorrer a imperativos morais para justificar jogos de poder é terreno pantanoso. A Rússia alega que avançou sobre a Geórgia para proteger os separatistas da Ossétia do Sul e da Abkházia das ações do "lunático" Saakashvili. Quem acreditaria em tamanho desprendimento?

É verdade que é possível pescar na cobertura americana reflexões sobre a eventual indisponibilidade de soldados para combater no Cáucaso, quando há 200 mil no Afeganistão e no Iraque, ou sobre a oposição de França e Alemanha a um confronto com a Rússia. Mas elas ficaram soterradas sob a linha-dura midiática.

A guerra no Cáucaso transformou em pó a idéia de que o fim do governo Bush enterraria os instintos mais messiânicos de uma era de ilusões unipolares que ele levou ao paroxismo.

 

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