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03/08/2003 - 09h07

Argentina aplaude ação contra repressores

ELAINE COTTA
da FOlha de S.Paulo, em Buenos Aires

Os argentinos apóiam a ofensiva iniciada pelo governo para que os ex-repressores acusados por abusos dos direitos humanos no período da chamada "guerra suja" da ditadura militar, entre 1976 e 1983, sejam julgados e punidos.

A população, a imprensa e alas políticas classificadas como progressistas aplaudiram as recentes medidas anunciadas pelo presidente Néstor Kirchner, que anulou um decreto que impedia a extradição de militares e, agora, cobra da Suprema Corte de Justiça a declaração de inconstitucionalidade de duas leis de anistia assinadas pelo ex-presidente Raúl Alfonsín (1983-1989) que beneficiam ex-repressores.

As críticas partem apenas de setores ligados aos militares e à direita do país. Segundo essas pessoas, Kirchner está "desagradando" as Forças Armadas e isso pode ser um risco à estabilidade do seu governo. Alegam ainda que a extradição e o julgamento desses argentinos no exterior atentam contra a soberania nacional. Nos próximos dias, a Espanha deve oficializar um pedido para extraditar 46 ex-repressores, e o governo ainda aguarda solicitações da França --que condenou um ex-repressor à prisão perpétua_, da Itália, da Alemanha e de Israel.

Kirchner nega que exista um "clima tenso" com as Forças Armadas e responde: "Nenhum país do mundo constrói um futuro deixando de lado o passado, sem promover justiça. Nos países sérios, justiça é algo permanente. Na Argentina, lamentavelmente, a reconciliação nacional é baseada na impunidade, pois as leis [de anistia] foram sancionadas para evitar levantes militares que ameaçavam o governo civil com um novo golpe", disse.

O presidente considera a possibilidade de atender aos pedidos de extradição, mas não esconde a sua vontade de julgar os ex-repressores dentro da Argentina. Essa posição conta com o respaldo da população e de organizações de direitos humanos. Pesquisa recente mostra que 65% dos argentinos querem que os ex-militares sejam julgados no país. Outros 25% preferem as extradições. Motivo: essas pessoas não acreditam que a Justiça local tenha independência suficiente para julgar esses casos. Eles temem que a impunidade prevaleça.

Pressão

Kirchner faz bom uso político da falta de credibilidade da Justiça e a utiliza para pressionar os ministros da Suprema Corte a anular as leis de anistia. Analistas dizem que os juízes tendem a acatar o seu desejo temendo represálias. Em menos de dois meses de mandato, o presidente já conseguiu destituir o presidente da Corte --que tinha fortes ligações com o ex-presidente Carlos Menem (1989-1999)-- e já deu andamento, por meio de sua influência na Câmara dos Deputados, a uma investigação que pode resultar na destituição de outro ministro, também ligado a Menem.

População e organizações de defesa dos direitos humanos comemoram e se dizem otimistas com o que chamam de "renovação institucional" promovida pelo novo governo. Na primeira semana de mandato, Kirchner renovou todo o comando das Forças Armadas e trocou parte da chefia da Polícia Federal.


Polêmica

A possibilidade de extradição de militares e ex-militares argentinos para serem julgados no exterior tem sido alvo de várias polêmicas na Argentina. Entre os 46 ex-repressores que estão na lista de extradição que será oficializada nos próximos dias pela Espanha, pelo menos 20 alegam que, juridicamente, não poderiam ser julgados em tribunais no exterior.

A legislação argentina permite a extradição de qualquer cidadão que tenha cometido um crime e cuja custódia seja requerida por outras nações. A Constituição do Brasil, diferentemente, só prevê extradição de brasileiros em casos de envolvimento comprovado com tráfico de drogas.

A argumentação adotada pelos advogados dos ex-repressores que correm o risco de extradição está no Código Civil argentino. O artigo que trata de processos penais diz que nenhuma pessoa pode ser julgada duas vezes pelo mesmo crime. E muitos dos militares que estão na lista espanhola já sofrem processos no país. Entre eles, estão o ex-ditador Jorge Rafael Videla e Emilio Massera. Ambos cumprem prisão domiciliar pela acusação de roubo de bebês de desaparecidos na ditadura.
 

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