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19/08/2009 - 18h25

Desiludidos com corrupção, afegãos têm pouca esperança em eleições

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MARCIA SOMAN MORAES
da Folha Online

Em 2004, cerca de 70% dos eleitores foram às urnas para a primeira eleição direta para presidente do Afeganistão. Injetados com o entusiasmo do conceito democrático, eles esperavam deixar para trás a destruição de mais de três décadas de guerra e vários anos de um obscuro governo Taleban. Nesta quinta-feira (20), o cenário deve ser diferente diante da desilusão por um governo que se mostrou fraco, corrupto e ineficaz.

"Muitos acharam que [a eleição de 2004] foi uma oportunidade perdida. A situação de segurança se deteriorou e os afegãos perderam as esperanças", afirma Jake Sherman, especialista em Afeganistão do Centro de Cooperação Internacional da Universidade Nova York. Uma opinião corroborada por todos os analistas ouvidos pela reportagem da Folha Online.

Adrees Latif /Reuters
Homem carrega saco ao passar em frente à parede repleta de folhetos de campanha na capital afegã, Cabul; 15 milhões podem votar
Homem carrega saco ao passar em frente à parede repleta de folhetos de campanha na capital afegã, Cabul; 15 milhões votam

O Afeganistão chegou a flertar com a democracia nos anos 1960 e 1970, quando organizaram eleições legislativas parciais. A experiência foi interrompida pela invasão soviética de 1979, décadas de guerra e cinco anos (entre 1996 e 2001) de um governo taleban radical. Com a ajuda das tropas internacionais, instaurou-se as estruturas do governo democrático em um país onde 80% da população é rural e 70%, analfabeta.

Os afegãos criaram seu próprio conceito de democracia e voto. "É uma lógica simples: se eu votar na pessoa que representa minha etnia, ela vai cuidar de mim e haverá algum tipo de recompensa por fazer isso. Há uma associação muito próxima no Afeganistão entre votar em alguém e obter algo em troca", explica Sherman.

Para quem está no poder, a lógica de ganho próprio não é diferente. O resultado foi uma corrupção endêmica, vertical, que se transformou em modo de governo. "A percepção é de que o governo é corrupto, comandado por personagens instáveis [...] envolvidos em atividades criminosas, em tráfico de drogas", afirma Andrew Wilder, analista de governança do Centro Internacional Feinstein para estudos de países em conflito.

Lucy Nicholson-07ago.09/Reuters
Homem mostra cédula de votação distribuída em comício para ensinar afegãos a votar
Homem mostra cédula de votação distribuída em comício para ensinar afegãos a votar

"Eu acho que este é um tema crítico para um novo governo eleito, o que fazer para ampliar a qualidade do trabalho do governo melhore e que os afegãos sintam que eles têm um governo que quer efetivamente servi-los e não juntar dinheiro e mudar para Dubai", afirma.

O saldo da experiência democrática no Afeganistão foi um salto no índice de percepção de corrupção, realizado anualmente pela ONG Transparência Internacional. Em 2005, o país estava em 117º. Em 2008, saltou para 176º lugar --o quinto país mais corrupto do mundo. Para efeito de comparação, o Brasil ficou em 62º em 2005 e em 80º em 2008.

Legitimidade

Os analistas são unânimes em apontar os efeitos da corrupção no fracasso do governo do primeiro presidente do país, Hamid Karzai, controverso favorito à reeleição, em enfrentar o desafio de estabelecer a paz depois de décadas de conflito e, com uma economia (lícita) pobre, garantir os serviços essenciais ao povo afegão --uma atribuição essencial na construção da legitimidade da democracia.

O desemprego bate os 40% e a renda per capita é de US$ 800 --dado que exclui a renda da produção de mais de 90% do ópio vendido no mundo. A situação é agravada ainda pela abundante ajuda internacional, que chega aos bilhões de dólares e sobre a qual há muito pouco controle.

AP-1ºago.09
Afegãos participam de campanha do Hamid Karzai em seu primeiro comício fora da capital Cabul; presidente é favorito à reeleição
Afegãos participam de campanha do Hamid Karzai em seu primeiro comício fora da capital Cabul; presidente é favorito à reeleição

"Se você dá dinheiro para alguém no Afeganistão, o dinheiro pertence a eles. Se a verba é para construir uma escola ou algo do gênero, isso não significa que vai necessariamente acontecer quando você entrega o dinheiro", explica o coronel Christopher Langton, do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos.

O que o povo afegão vê, alerta Langton, são escolas, hospitais e estradas com bandeiras estrangeiras --projetos que atravessam o governo central e são bem-sucedidos porque são gerenciados diretamente pelas missões internacionais. "Assim, este dinheiro acaba enfraquecendo ainda mais as instituições afegãs e o povo não compreende que o governo existe para ajudá-los."

Reforma

A expectativa dos analistas é de que a ampla discussão sobre o problema da corrupção na campanha presidencial traga um ímpeto de reforma no novo governo afegão e a reversão da crise de legitimidade.

Para Wilder, a questão é de modéstia. "Não vamos conseguir um Estado moderno que concede serviços sociais efetivos e respeita os direitos humanos. Mas podemos investir em maior monitoramento do dinheiro internacional e em alguns indivíduos chaves nomeados para as Províncias mais problemáticas."

Ele alerta, contudo, que nem isso é missão fácil no Afeganistão: "Infelizmente, conseguir um bom ministro, governador ou policial é algo muito difícil." Resta aos cerca de 15 milhões de eleitores afegãos outro conceito muito conhecido --mas não tão praticado-- nas democracias ocidentais: o voto consciente.

Comentários dos leitores
J. R. (1160) 22/11/2009 14h07
J. R. (1160) 22/11/2009 14h07
"Afeganistão é o pior lugar do mundo para crianças, diz ONU" - É que o pessoal da ONU assistiu ao filme 'O caçador de pipas' e nunca assistiu a 'Pixote, a lei do mais fraco' ou 'Cidade de Deus'. Talvez uma visita a outras partes do mundo os façam parar de trabalhar apenas para os Estados Unidos e comecem a trabalhar em prol da humanidade. sem opinião
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samuel haddad carvalho (106) 07/11/2009 21h06
samuel haddad carvalho (106) 07/11/2009 21h06
Prezado sr. Mauro Harpen,
Talvez a maneira que escrevo seja um tanto difícil para algumas pessoas entenderem. Acho isso normal! Quando escrevi que se a força de trabalho dos afegãos fosse "utilizada" de maneira construtiva, isso serviria pra atrair muito mais gente para a reconstrução e não para a insurreição e a história, talvez, tivesse um destino diferente da que nós estamos vendo hoje. Sim! É verdade que citei ATÉ os nazistas souberam utilizar a abundante mão de obra ociosa na Alemanha da época. Foi somente com esse objetivo. Dizer que com essa frase era pra que "todos" se transformassem em nazistas ofende qualquer pessoa com um mínimo de bom senso. Até alguém que tem facilidade em tentar ofender as pessoas deve entender que o trabalho ocupa mente e corações. O Afeganistão sempre foi e continuará sendo tribal e democracia para eles é uma palavra desconhecida. Querem pacificá-lo? Sentem-se com os chefes tribais e coloquem todos para trabalhar. Não se deve "nazificar" tudo em nome do passado tão tenebroso pelo qual a história da humanidade já passou. Na minha opinião, os males do nazismo deveria ser matéria obrigatória em todas as escolas do mundo. Com o objetivo de jamais permitir que ele volte. Porém, algumas pessoas não aprendem. Mesmo já tendo sentido na própria pele. O gueto de Gaza não é diferente do de Varsóvia. E, igual em Varsóvia, eles também tem o direito a autodefesa. Parece que estão querendo transformar todo o território palestino em uma grande Gaza...
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Carlos Gonçalves (396) 05/11/2009 19h01
Carlos Gonçalves (396) 05/11/2009 19h01
O ministro francês esqueceu que na segunda guerra mundial, a resistência francesa não era terrorista, porque lutava contra os invasores. De Gaule formou a resistência encarregando Jean Moulin para cuidar dela.
E Petain, era o entreguista; queria um estado totalitário aliando-se à Itália e Alemanha. Parece que esse ministro esqueceu disso. Ele é um nazista. Espero que ele vá para a mesma prisão que Pétain foi na ilha de YEU. E que seja perpétua.
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