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05/05/2006 - 16h36

EUA querem pôr Irã contra a parede, diz especialista iraniano

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GUILHERME GORGULHO
da Folha Online

A crescente pressão exercida pelos Estados Unidos contra o governo iraniano é motivada pelas grandes reservas de petróleo e gás do país persa, e a suposta utilização militar do programa nuclear de Teerã é apenas uma desculpa utilizada por Washington, disse o ex-vice-ministro iraniano de Relações Exteriores Abbas Maleki, 49, em entrevista à Folha Online, por telefone.

Maleki, que foi o segundo homem da Chancelaria iraniana entre 1989 e 1997 e atualmente é pesquisador-chefe na Kennedy School of Government da Universidade Harvard (EUA), disse ainda que "os EUA querem forçar o Irã a uma situação limite".

Divulgação
Abbas Maleki, ex-vice ministro iraniano
"A situação ideal desejada pelos EUA é a mudança de regime ou a mudança no comportamento do regime iraniano. O que quero dizer é que os EUA não têm problema apenas com o programa nuclear do Irã, os EUA temem o Irã, um grande país com muito petróleo e gás", afirmou Maleki, que desenvolve estudos em segurança energética.

As potências ocidentais que têm vaga permanente [poder de veto] no Conselho de Segurança (CS) da ONU (Organização das Nações Unidas) --EUA, França e Reino Unido-- e Alemanha defendem a adoção de sanções contra Teerã, que anunciou na última terça-feira (2) ter avançado no procedimento de enriquecimento de urânio. O processo é necessário para a geração de combustível para usinas nucleares, mas também pode ser utilizado para o desenvolvimento de bombas atômicas.

Independentemente de seu potencial militar e de sua influência geopolítica no Oriente Médio, o Irã é o segundo maior exportador de petróleo da Opep [orgão que reúne os 11 maiores exportadores de todo o mundo].

Os países aliados aos EUA no CS já manifestaram sua posição favorável à adoção de medidas punitivas contra o governo iraniano em razão do descumprimento de determinações da AIEA (Agência Internacional de Energia Atômica). O órgão, ligado à ONU, deu ao Irã 30 dias para interromper o enriquecimento de urânio. Expirado o prazo, na última sexta-feira (28), Teerã insistiu em desafiar as exigências da AIEA.

Abertura

Em meio à pressão da comunidade internacional, o governo do presidente iraniano, o conservador Mahmoud Ahmadinejad, já deu sinais de que poderia abrir concessões após a divulgação do relatório do diretor-geral da AIEA, Mohamed El Baradei, que reclamou da "falta de informações" sobre o programa nuclear do país persa.

Mesmo dizendo que "jamais" renunciará ao seu direito de desenvolver energia nuclear para fins civis, Teerã sinaliza que pode voltar a permitir inspeções de surpresa em suas instalações se as discussões voltarem ao âmbito da AIEA.

"Eu não acho que houve um recuo na posição do Irã, eu acho que é uma nova posição do Irã, que poderá trabalhar com a AIEA melhor do que com o CS", defendeu Maleki. "O Irã é membro de praticamente todas as organizações internacionais, e o país gasta mais de US$ 500 milhões anualmente por ser sócio destas entidades, a AIEA é uma delas. O Irã prefere negociar com a AIEA, que é um corpo técnico, a discutir com o CS [da ONU], que tem caráter político", explica.

A principal dificuldade para a adoção de embargos ou sanções contra o Irã, no entanto, é a oposição de China e Rússia --os outros dois membros permanentes do CS com direito a veto e principais parceiros comerciais do Irã-- a uma resolução que obrigue o Irã a suspender suas atividades nucleares.

"Rússia e China trabalham para não tirar as negociações dos canais diplomáticos e avaliam que é melhor negociar e discutir com Teerã sobre o tema nuclear. Ao mesmo tempo, os EUA querem submeter o Irã ao Capítulo 7 da Carta da ONU, o que pode levar a sanções ao Irã."

Relações tensas

Apesar da tentativa iraniana de reconduzir o tema para as vias diplomáticas, a secretária americana de Estado, Condoleezza Rice, acusou Teerã de estar "fazendo um jogo" e disse que o país já teve "tempo suficiente" para cooperar pela resolução de forma pacífica.

As relações entre Washington e Teerã foram gravemente abaladas em novembro de 1979, quando um grupo de estudantes iranianos invadiu a embaixada americana na capital do Irã e manteve mais de 50 reféns presos no local até janeiro de 1981. Desde então, os americanos acusam o Irã de ser um patrocinador de ações terroristas e de apoiar grupos insurgentes do Oriente Médio.

Além de ser um grande produtor de petróleo, o Irã tem o controle de duas áreas estratégicas para a exportação de óleo no mundo, o golfo Pérsico e o estreito de Hormuz.

Para Maleki, o que realmente motiva os EUA a exercer toda esta pressão sobre o regime do Irã é a importância das reservas petrolíferas do país persa. "Quando o Irã não tinha um programa nuclear, por exemplo, nas décadas de 1980 e 1990, os EUA promoveram várias sanções e muitas estratégias, entre elas de dupla restrição, como o ILSA [Iran and Libya Sanctions Act] contra o Irã, proibindo até mesmo empresas não-americanas de investir mais de US$ 20 milhões nos setores de petróleo e gás iranianos", diz.

O Ato de Sanções contra o Irã e a Líbia (ILSA) é uma lei americana que deu direito aos EUA para punir qualquer empresa que investisse mais de US$ 20 milhões no setor de energia de qualquer um destes dois países.

Segundo o ex-vice-chanceler iraniano, muitas empresas americanas querem ter relações e laços comerciais com o Irã, mas não podem fazê-lo em razão das sanções. "Se você se lembrar de 1995, quando o presidente Clinton (Bill, 1993-2001) assinou um decreto proibindo a Conoco [grupo petrolífero americano] de negociar com o Irã, eram simplesmente gás e petróleo os assuntos no território persa, mas o presidente Clinton o fez porque achava que não era do interesse nacional dos EUA", ressaltou Maleki.

Em 1995, o então presidente Clinton proibiu empresas dos EUA de atuar em prol do desenvolvimento de campos de gás e petróleo do Irã depois que uma afiliada do grupo Conoco Inc. anunciou um contrato para desenvolver dois campos no golfo Pérsico.

A administração do presidente americano, George W. Bush, já considera a possibilidade de promover uma ação militar para barrar o suposto desenvolvimento de armas nucleares por parte do Irã. Em entrevista a jornalistas no mês passado, questionado sobre a possibilidade de uma intervenção militar contra os iranianos, Bush foi evasivo, afirmando que "todas as opções estão sobre a mesa".

Sobre a pressão de Bush, Maleki disse que toda saída é possível, mas que a probabilidade de isso ocorrer agora é diferente. "Eu acho que os novos conservadores em Washington querem fazer isso [intervir militarmente contra o Irã], mas não é do interesse nacional dos EUA, e cabe aos americanos pensar sobre isso. Ao mesmo tempo, acho que [uma ação militar] é pouco provável, porque os EUA estão comprometidos com duas guerras na região, uma no Iraque e outra no Afeganistão, e é realmente muito difícil abrir um terceiro front nesse cenário."

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