Pensata

João Pereira Coutinho

08/03/2010

Oscar: os meus vencedores

da Folha Online

Escrevo antes do Oscar. Não vou fazer previsões. Para quê? Os últimos dias foram pródigos em previsões, como se jornalismo cultural fosse um contínuo jogo de poker. Não é. Mais importante que as previsões são as preferências. Criticar é preferir, camaradas.

Primeiro ponto: assisti a quase todos os filmes indicados ao Oscar principal. Doz dez, três deixaram saudades: "Bastardos Inglórios", "Amor sem Escalas" e "Guerra ao Terror". Sobre os dois primeiros, escrevi na "Ilustrada" textos elogiosos a respeito.

Mas, pensando bem, e pensando de novo, talvez o último seja o melhor dos três. Estou cansado de filmes sobre a guerra do Iraque que são meros panfletos de retórica pacifista e sentimental. "Guerra ao Terror" é sobre o Iraque, sim, mas não sobre a dimensão política dele. A Kathryn Bigelow, a diretora, interessou a dimensão humana de soldados comuns que desarmam bombas em território hostil. Um risco e um vício que, a prazo, se transforma na segunda natureza desses homens. Acontece.

Nos atores, há pouco por onde escolher. Não assisti a "Coração Louco", com Jeff Bridges, o provável vencedor. Nada contra: Bridges já merecia o prémio em 1971 ("A Última Sessão de Cinema"), 1989 ("Susie e os Baker Boys"), 1990 ("Texasville"), 1991 ("O Pescador de Ilusões"), 1992 ("Nada a Perder") e 1998 ("O Grande Lebowski").

Mas, dos quatro indicados que vi, votaria em George Clooney, em "Amor sem Escalas". Intoxicados com os maneirismos do Método, esquecemos por vezes que a grandeza de um ator está na capacidade de sugerir, não necessariamente de dizer ou mostrar. A subtileza de Clooney como "homem sem qualidades", capaz de oscilar entre o ritmo da "screwball comedy" e o desencanto da solidão pós-moderna, é um dos grandes papéis a que assisti recentemente. Parece fácil, muito fácil. É difícil, muito difícil. E raro de ver.

E nas damas? Conheço o trabalho das cinco. Não hesito: Carey Mulligan, em "Educação". Quem diria: um ano atrás vi Mulligan (e Peter Sarsgaard, seu companheiro no filme) em "A gaivota", nos palcos da Broadway. Na peça, Mulligan, como Nina, eclipsava Kristin Scott Thomas, como Arkadina. Será preciso dizer mais?

Em "Educação", Mulligan repete o número no papel de Jenny, uma jovem estudante na Inglaterra da década de 1960, destinada a prosseguir os rigores da educação formal (em Oxford). Até o dia em que conhece David, um "teddy boy" que lhe oferece um atalho para a educação "informal". O atalho revela-se dramático; e dramático porque ilusório. A descoberta da mentira é, em Carey Mulligan, um milagre de representação.

Restam os estrangeiros. "A Fita Branca", de Michael Haneke, talvez faça as delícias de quem prefere acreditar que o nazismo foi um problema de falta de estima paternal. Comigo não, violão. Prefiro "O Profeta", o filme de Jacques Audiard que, divagações oníricas à parte, filma o ambiente e as cumplicidades prisionais como já não se via desde Jacques Becker. Os franceses percebem do assunto.

João Pereira Coutinho é colunista da Folha. Reuniu seus artigos para o Brasil no livro "Avenida Paulista" (Record). Escreve quinzenalmente, às segundas-feiras, para a Folha Online.

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