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  7 de novembro
  Bush ou Gore?
  A difícil e penosa escolha entre o seis e o meia dúzia

Já que temos que ser todos americanos, é bom prestar a devida atenção ao que se passa nos EUA. Nossos irmãos do Norte dirão nesta terça-feira se preferem Bush ou Gore. A verdade é que, no essencial, eles se assemelham. Daí o equilíbrio da disputa. Se as pesquisas estiverem certas, a vitória será medida em milímetros. Vencerá aquele que tiver o maior nariz.

Naquilo que nos diz respeito, nenhum dos candidatos parece inclinado a modificar o modelo que guia a ação política e econômica do mundo. Seja qual for o escolhido, portanto, o Big Mac com fritas continuará sendo provido. As diversas opções de sundae e o estilo que entre nós é personificado por Pedro Malan também.

Não faz muito, quando ainda podiam beneficiar-se do contraste soviético, os EUA projetavam para o mundo uma imagem idealizada, escorada na defesa da liberdade. Os demais aspectos do estilo de vida americano eram como que negligenciados. Agora, acomodado no alto do pódio como um modelo, os EUA são observados por olhos mais acurados. A imagem que sobressai é outra, mais complexa, nuançada. Muito do que se vê não é dignificante.

Vê-se, por exemplo, a glorificação do consumo desenfreado, da auto-satisfação a qualquer custo, do individualismo exacerbado. Vê-se a crescente tribunalização do cotidiano, marcado por uma compulsão endêmica pela causa judicial. Vê-se a decadência da indústria cultural, que espalha pelo mundo, na forma de películas de quinta, fragmentos da crise que corrói os valores éticos e morais de uma sociedade que se pretendia hegemônica.

O mundo pós-guerra fria continua meio sem norte, como um avião que, mantido no piloto automático, ainda não sabe direito onde irá pousar. A hipótese de um retorno ao universo da economia socialista é improvável. Mas a pista de pouso oferecida pelo neocapitalismo pós-muro tampouco parece entusiasmar os passageiros.

Três fatores separam a liderança dos EUA de um inevitável processo de questionamento:

1) o arsenal militar;

2) o despreparo dos rivais;

3) a relativa longevidade de uma bolha econômica prestes a aterrissar, não se sabe se de forma suave ou turbulenta;

O sonho de uma economia condenada ao crescimento, em que os vícios do mercado seriam anulados pela intervenção de um Estado enxuto e forte, continua ameaçado pelo fantasma dos ciclos econômicos. Agora mesmo observa-se com temor reverencial o conflito que palestinos e judeus travam na beira dos poços de petróleo mais fartos do planeta.

Imaginando-se portadores de uma resposta a Marx, os EUA ainda se comportam como donos da cena. Mas nem Bush nem Gore têm a cara de alguém prestes a entrar na história para dominá-la. Não há o mais remoto sinal de que vá brotar da cabeça de um dos dois o conjunto de idéias capaz de mobilizar a ação política do mundo nos próximos anos.

A campanha presidencial americana não esteve à altura do poderio global dos EUA. Quem assistiu aos debates entre Bush e Gore deve ter guardado duas impressões sobre os candidatos: dada a facilidade com que esgrimiram números e cifras, eles parecem ter os pés no chão; mas a ausência de idéias que perpassou o duelo tornou-o tão absurdamente claro que, amanhã, não causará espanto se o novo chefão do mundo vier a ser flagrado também com as mãos plantadas no solo.

Sempre se poderá alegar que o presidente ajoelhou apenas para certificar-se de que Clinton não esqueceu nenhuma estagiária sob a mesa do Salão Oval. Mas nada apagará a impressão de que o vazio da cena política nos EUA não faz jus ao papel de controlador da grande rédea. Se já era difícil dormir tranqüilo aqui embaixo sabendo que o botão vermelho, com tudo o que ele representa, estava sob a guarda de um sujeito que tinha certa dificuldade para controlar o próprio zíper, agora então...

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