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3 de agosto |
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Trens de subúrbio lembram a
vergonha dos navios negreiros
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Na minha primeira visita à Mostra do Redescobrimento fiquei emocionada ao ver os desenhos reproduzindo os navios negreiros. Na Pinacoteca, eles mostram a brutalidade do tráfico escravo. Empilhados como bichos nos porões, milhares de negros morreram - 12,4% dos viajantes, ensina o professor Luiz Felipe de Alencastro.
Assim foi por 300 anos. Milhões de vidas foram destruídas entre a África e o Brasil. Aos olhos de hoje, fica difícil imaginar como os habitantes daquele mundo conviviam com a escravidão. Como podiam suportar tratar pessoas como se fossem animais?
Muitas vezes penso nisso quando observo os pedintes nos semáforos ou os grupos de trabalhadores que saem das bocas do metrô de manhã bem cedo. Andam cabisbaixos, encolhidos, doídos. Como será que as gerações futuras avaliarão o nosso comportamento social? Deverão perguntar como podíamos habitar um lugar com tamanha concentração de renda?
Lembrei dos navios negreiros da Pinacoteca quando soube do desastre de trem na sexta-feira em São Paulo. Nove pessoas morreram e 115 ficaram feridas. Eram todos de famílias muito pobres. O caso ainda está sendo investigado, mas há indícios de desleixo e incompetência na operação da linha.
Naquele dia, um trem parou. Os passageiros foram desembarcados e o maquinista pediu um reboque. Uma hora e quarenta minutos depois o reboque não chegou e o comboio começou a se mexer. O maquinista foi buscar madeiras para tentar calçar o trem. Não conseguiu. O trem acelerou e arrebentou outro trem de passageiros e a estação de Perus.
Só dois minutos antes da tragédia, a estação foi comunicada que havia uma composição desgovernada na linha. Se avisadas a tempo, pessoas poderiam ter saltado do trem e da plataforma. Não tiveram chance de escapar.
O desastre trouxe à luz a vergonha do transporte coletivo para a gente que vive nas cidades-dormitório da periferia de São Paulo. Todos os dias esses pobres são tratados como animais de trabalho. São empurrados, esmagados, tragados pelo aperto insuportável nos vagões. Esperam horas em filas. Perdem boa parte da vida se arriscando no vaivém do trabalho para a casa. Não têm alternativa.
Não olham nos olhos deles. Transitam nos modernos navios negreiros. Um dia chegarão à Pinacoteca.
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