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  24 de novembro
  Mistura Fina
   
   
Apertem os cintos

Nos últimos dias cresceu o número de previsões terríveis a respeito da economia mundial. Não tenho a menor idéia do que vai acontecer. Por via das dúvidas, é melhor se preparar.

Quem tiver a paciência de percorrer os jornais, revistas e sites colherá opiniões para todos os gostos. Desde o otimismo do empresário Benjamin Steinbruch , presidente dos conselhos de administração da Vale do Rio Doce e da CSN, até o catastrofismo de Stephen Roach, economista-chefe da Morgan Stanley Dean Witter, uma das principais "grifes do mercado financeiro", segundo o jornalista Clóvis Rossi .

A discussão a respeito de um possível crash global não vem de hoje. Não falo do debate sobre a inevitabilidade, a longo prazo, de uma grave crise do capitalismo, como pensa o sociólogo alemão Robert Kurz. Refiro-me à dupla impressão de que a nova economia era uma bolha inflada e que a economia norte-americana não poderia continuar a crescer no ritmo atual.

Há cerca de um ano, a combinação das duas preocupações -- com a fantasia digital e com a expansão do Tio Sam --, gera a expectativa de que um grande desequilíbrio estaria por se aproximar. Dada a internacionalização dos mercados financeiros, um estouro da bolha digital poderia provocar uma reação em cadeia de proporções inimagináveis. A quebra da bolsa em 1929 seria fichinha perto do que estaria por vir.

Por meses, falou-se em pouso suave ou forçado da economia americana. Caso se conseguisse uma redução gradual e sob controle do crescimento ianque, haveria, então, esperança de evitar a grande catástrofe.

Aos poucos o ambiente desanuviou-se. A Nasdaq sofreu as esperadas quedas. Empresas virtuais fecharam. No entanto, não houve quebradeira geral. A velha economia continuou tão bem ou tão mal quanto antes. O Banco Central dos EUA parecia no controle da nave.

Quando tudo caminhava para um fim de ano tranqüilo, no qual Papai Noel desceria do avião recém-pousado cheio de boas notícias para os países emergentes (ho ho ho), o ambiente turvou-se por dois acontecimentos graves. O primeiro foi o inesperado impasse na eleição presidencial norte-americana. O segundo, a esperada piora das condições econômicas argentinas.

A dificuldade em decidir quem será o próximo presidente dos Estados Unidos criou um vácuo de poder no país que ancora a economia mundial. A sede do império está vazia e o resto do planeta pergunta-se o que vai acontecer em cada uma das nações.

O fato de Bush ter decidido em 23/4 apelar para a Corte Suprema pode tornar insolúvel o problema. Uma análise publicada na Agenda Global da revista The Economist mostra como a questão tem potencial para se arrastar.

A dificuldade está em encontrar saídas institucionais para um problema simples, mas não previsto: não se consegue descobrir, pela contagem dos votos, quem ganhou. Nesses casos, o que fazer?

Se tivesse ocorrido em um pequeno município brasileiro seria engraçado, mas sem maiores conseqüências. Provavelmente ocorreria outro pleito. Acontece que em uma economia interligada como a desta etapa do capitalismo, a ausência do piloto na aterrissagem da nave-mãe pode ser fatal para todas as outras.

Nesse capítulo tendo a concordar, mais por intuição do que por conhecimento, com a idéia de que teremos um pouso aos solavancos (por uma adesão recente ao nacionalismo linguístico, recuso-me a dizê-lo em inglês, mas quem quiser encontrar a expressão pode ir a www.primeiraleitura.com.br/entenda/eco_mundo.asp). Ou seja, uma descida intermediária entre o suave e o forçado.

O segundo fato nefasto deste fim de ano aconteceu na casa vizinha ao Brasil. O drama argentino não estava escrito nas estrelas. Estava nos jornais. Basta ter um pouco de memória para saber que milhares de artigos foram escritos com o intuito de mostrar que o atrelamento do peso ao dólar era uma loucura.

Faz nove anos, desde que a dupla Menem-Cavallo implantou o sistema, que leio tais advertências. Elas acabaram por se revelar corretas. Agora não adianta chorar sobre o leite derramado.

Diante deste fim de ano aziago, o Brasil precisa pensar em duas frentes. Número um: guardar a lição de que em uma economia mundial interligada foi um acerto não ter dolarizado o real e não se deve fazê-lo no futuro, mesmo que as condições internas fiquem difíceis (toc toc toc). O melhor caminho parece ser no sentido oposto.

Na hora do aperto, dolarizar é sempre uma das hipóteses cogitadas. O Equador o fez e Menem voltou a sugeri-lo para tirar a Argentina do atual enrosco. Imagine-se a aflição de quem está com a moeda dolarizada e nem pode votar para presidente.

Aliás essa poderia ser uma saída para o imbroglio americano. Por que não dar direito de voto aos equatorianos e deixar eles decidirem se Gore ou Bush devem despachar desde o salão oval.

A outra vertente que deveria ocupar a mente dos brasileiros é como influir junto à Argentina para que seja adotado a melhor saída, a desdolarização. Uma mudança desse porte seria um verdadeiro pouso de emergência, porém é melhor arriscar em pista improvisada do que destruir devagar o grande patrimônio de um dos países mais interessantes do globo.

O FMI continua a pressionar os argentinos. O Mercosul, paralisado pela diferença de política cambial entre Brasil e Argentina. Com todo o respeito pela soberania argentina, é hora de Brasília mostrar-se mais ativa.

A reunião de presidentes do Mercosul em Florianópolis entre 14 e 15 de dezembro seria uma oportunidade para isso. Enquanto o império encontra um meio de escolher o próximo imperador, a periferia deveria tomar conta da própria vida.

Leia colunas anteriores
22/11/2000 - Primeiros acordes do balé presidencial
17/11/2000 - Conhaque de Pitanga
15/11/2000 - Volta apoteótica
10/11/2000 - Está tudo na voz

 


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