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PENSATA

Terça-Feira, 21 de novembro de 2000


Alta fidelidade

Melchiades Filho
     

Diego Medina

E o Utah Jazz volta a desafiar a natureza, de novo amparado na extraordinária capacidade técnica e médica de John Stockton (38 anos e 35 batidas cardíacas por minuto em repouso, menos da metade de um cidadão normal) e Karl Malone (37 anos e taxa de apenas 3,7% de gordura corporal, um terço da média dos atletas da liga profissional)."

O parágrafo, perdido na coluna da semana passada, assustou leitores que acompanham os campeonatos da NBA. Minha caixa-postal eletrônica amanheceu com mensagens de espanto, reticência e até indignação com o desempenho do time de Salt Lake City.

Considerado decadente e conservador demais, o Utah ostenta a segunda melhor campanha do ano, sete vitórias em nove jogos.

Só está atrás do Philadelphia, invicto depois de nove rodadas.

A NBA do fim de século privilegia o mano-a-mano. O time isola seu melhor jogador em um canto do ataque e torce para que ele, na criatividade e/ou vigor físico, leve vantagem sobre o marcador.

Mas, para construir sua disparada de sucesso, o Philadelphia jogou essa fórmula no lixo. Domesticou seu único astro, Allen Iverson, e valorizou a participação tática dos "role players", atletas sem reputação na liga.


E foi exatamente esta a trilha que o Utah adotou há uma década. A diferença é que Stockton e Malone, as estrelas, já nasceram moldadas no basquete solidário.

No Jazz, até eles atuam, em algumas situações, como "role players". O técnico Jerry Sloan, há 13 anos no comando do time (recorde entre os que estão na ativa), não deixa espaço para espasmos de individualidade.

"Canta" todas as jogadas da equipe.

No máximo, o Utah isola duplas no ataque, geralmente Stockton e Malone.

Numa margem do garrafão, eles trocam passes e corta-luzes até que um se desvencilhe para arremessar.

Por abdicar do improviso individual, esse artifício, o "pick and roll'',
tira a explosão do jogo, torna-o matemático, às vezes maçante _imagem bem distante da que a NBA bombardeia na mídia.

Mas a tática poupa energias e rende dividendos. Embora ainda lhe falte um título, o Utah dá show de regularidade. Classificou-se aos playoffs das últimas 17 temporadas, a série mais longa entre os 29 times da NBA.

Stockton segue uma máquina de dar passes: quatro assistências por "turnover", a melhor relação entre os armadores da liga. E Malone, com 25 pontos e 10,7 rebotes por jogo, exibe os melhores números entre os alas-pivôs.

Stockton já é recordista em assistências e desarmes. Malone está a 153 pontos de ultrapassar Wilt Chamberlain (31.419) e se converter no segundo maior cestinha da história _na semana que vem, começa a buscar Kareem Abdul-Jabbar (38.387).

Mas a estatística mais impressionante, que talvez melhor traduza suas carreiras, é que ambos serão, ao final do torneio, os atletas com mais partidas em uma mesma equipe, na casa de 1.300.



O Chicago inscreveu o time mais jovem da história da NBA, com cinco calouros e média de idade inferior a 23 anos. Foi quem mais mexeu no elenco para o campeonato. Está na penúltima colocação, nove derrotas em dez jogos...



NOTAS

Estranho 1
A esquisitice do Utah começa pelo nome. Jazz só fez sentido até 1979, enquanto a franquia esteve em New Orleans, berço da música negra e entrada de escravos na América do Norte. Nada tem a ver com Salt Lake City, cidade sem agito cultural, fundada por peregrinos mórmons num planalto desértico nos cafundós dos EUA.

Estranho 2
Dos mais de 400 atletas da NBA, 80% são negros. No Jazz, eles representam menos, 64%. Em Salt Lake City, de acordo com censo de 1990, a população negra é de apenas 0,7%. Em 1997, dos 134 funcionários da administração do Jazz, do dono às cheerleaders, achei apenas 1 que não era branco.

Estranho 3
Domingo, na PSN, a chance de ver os esquisitos do Utah em ação (às 22h, contra o Detroit).



E-mail: melk@uol.com.br


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