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Terça-Feira, 3 de outubro de 2000


O jogo das porcentagens

Melchiades Filho
     

Diego Medina

Simples e claro: a seleção de Antonio Carlos Barbosa, medalha de bronze em Sydney, não mostrou nada de mais.

Sua jogadora de referência esteve longe de brilhar. Janeth foi a cestinha da competição, mas na verdade disputou uma Olimpíada irregular. Basta lembrar que, carregada de faltas, pouco atuou na única exibição convincente das brasileiras, a vitória sobre a Rússia nas quartas-de-final.

O time entrou e saiu da Austrália com uma pendência: a definição das armadoras titulares. Testaram-se todas as combinações entre Claudinha, Helen e Adriana. Nenhuma convenceu.

Talvez por conta desse vaivém na armação, o ataque jamais mostrou inspiração e pontaria. O aproveitamento parou em 44,5% nos arremessos de quadra _nada animador. E não passou de 29,2% nos tiros de três pontos _bastante desanimador.

Na marcação, a equipe também não sobressaiu. Sofreu 65,9 pontos por jogo, a sexta defesa mais vazada entre as 12 participantes.

Aliás, escolha qualquer fundamento. O Brasil não se destacou em nenhum. Assistências? Ficou em quinto (12,5). Rebotes? Em quarto (32). Desarmes? Em oitavo (5,4). Tocos? Em nono (1,9). Bolas perdidas? Em quinto (13,8).

Como um time tão mediano (ou medíocre) pôde ter chegado ao pódio?, você pode perguntar.

É que um torneio rápido e competitivo como o da Olimpíada não deixa mesmo alternativas para uma equipe de nível técnico modesto. Não há tempo para testes. Não há perdão para os erros.
O time pode apostar alto, no risco. Com muita velocidade, criatividade e arremessos de longa distância, tentar pegar o adversário desprevenido, no contrapé.

Ou pode apostar “pingado”. Deixar a partida fluir naturalmente, evitando as falhas e explorando as oportunidades que o adversário oferecer.

Este foi o caminho que o Brasil adotou em Sydney.

O técnico Barbosa teve a modéstia de não blefar, de jogar no seguro, de implantar a tática da simplicidade. E Janeth, Claudinha, Adriana, Helen, Marta, Cíntia Tuiú e Alessandra, a competência para executá-la.

A craque do time não resolve a parada? Divida o ônus do ataque.
As armadoras estão pouco inspiradas na transição? Pise no freio e faça a bola rodar.

Os tiros de longe não caem? Arremesse de perto. Ou recupere a bola e chute de novo.

As infiltrações não resultam em cestas? Busque cavar faltas e acumular pontos em lances livres.

Lembre-se, o Brasil classificou-se à semifinal com um arremesso debaixo da tabela _e não com um tiro de longe ou um “drive” de improviso.

E passou pelas sul-coreanas no duelo pelo terceiro lugar porque carregou as adversárias de faltas e pôde construir seu placar na prorrogação com lances livres.

Enfim, o Brasil teve sucesso porque valorizou a posse de bola, pegou rebotes ofensivos (foi o melhor nesse quesito) e chutou lances livres (o segundo nesse ranking).

É um jogo tedioso, que mexe com porcentagens baixas de emoção (erro) e altas de bocejo (acerto). Mas, na Austrália, o sem-graça virou com-medalha. Para o basquete do Brasil, tão combalido, basta. E sobra.

NOTAS

0%
Na próxima terça-feira, uma análise sobre o desempenho da seleção dos EUA na Olimpíada. Prometo fugir do lugar-comum _ “ganhou, mas não encantou”, “Time dos Sonhos é só o original”, “são um bando de arrogantes”...

50%
Depois da rateada na semana passada, a versão eletrônica (e turbinada) desta coluna retorna à normalidade. Agradeço aos leitores que entenderam o “estresse” (“coisa de babaca”, nas palavras do técnico Barbosa) e a brincadeira que pendurei no site.

100%
Os destaques da Olimpíada na minha opinião foram Yolanda Griffith (EUA) e Sarunas Jasikevicius (Lituânia).

1000%
Mas o melhor de Sydney foi uma enterrada do norte-americano Vince Carter contra a França. O cidadão voou por cima de Frederic Weis, como estivesse brincando de “pular sela”, antes de cravar a bola. O pivô francês tem “só” 2,18 m.



E-mail: melk@uol.com.br


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