Reuters
09/10/2002 - 19h08

Crise dos mísseis em Cuba ressoa no debate sobre o Iraque

ANTHONY BOADLE
da Reuters, em Havana

Protagonistas norte-americanos, russos e cubanos da crise dos mísseis de Cuba em 1962 se encontrarão em Havana na sexta-feira (11) para relembrar os 13 dias que levaram o mundo à beira de uma guerra nuclear, em um momento histórico que tem certa repercussão no debate sobre uma possível guerra com o Iraque.

O presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, citou a crise dos mísseis em Cuba no discurso da noite de segunda-feira (7) para sustentar sua defesa da ação preventiva contra o Iraque.

Autoridades graduadas do governo Kennedy, como o ex-secretário da Defesa McNamara, se encontrarão para debater documentos e as lições aprendidas de um dos episódios mais dramáticos da Guerra Fria.

Em outubro de 1962, aviões espiões norte-americanos descobriram que a União Soviética havia posicionado secretamente mísseis nucleares em Cuba, a cerca de 145 quilômetros da costa dos EUA. Washington e Moscou ficaram frente a frente e o mundo segurou a respiração até a retirada dos armamentos.

O então presidente norte-americano, John F. Kennedy, ordenou um bloqueio naval de Cuba para impedir o avanço de fragatas soviéticas com mísseis balísticos de médio alcance e ogivas. O premiê soviético, Nikita Khrushchev, acabou recuando.

"O encontro avançará nosso entendimento no momento em que esta história ressoa com força no debate político de hoje sobre ataques preventivos e armas de destruição em massa", disse Peter Kornbluh, diretor do projeto Cuba do Arquivo Nacional de Segurança, em Washington.

Depois do discurso de Bush na segunda-feira, o senador Edward Kennedy lembrou que seu irmão evitou um ataque preventivo contra Cuba ao impor uma quarentena naval.

"A lição da crise dos mísseis é a necessidade de transparência dos governos e a convicção de que grandes problemas da humanidade precisam ser resolvidos por meio pacíficos para evitar catástrofes", disse o vice-presidente do Conselho de Ministros de Cuba, Jose Ramon Fernandez.

Fernandez disse em entrevista que a política "agressiva" de Bush em relação ao Iraque somente semeará mais ódio no mundo contra países ricos.

Veteranos em Havana
Entre os participantes do encontro estarão ex-assessores de Kennedy, como Theodore Sorensen, autor de discursos, e o historiador Arthur Schlesinger. Os protagonistas soviéticos incluem o ex-vice-ministro do Exterior Georgy Kornienko e o general Anatoly Gribkov, coordenador do envio de mísseis.

Kornbluh, da organização responsável por levar os veteranos norte-americanos a Havana, disse que a conferência de três dias vai esclarecer o papel de Cuba na crise em que as duas superpotências se encararam com armas nucleares.

Cuba afirma que deseja registrar diretamente as condições que levaram o líder Fidel Castro a permitir que Khrushchev instalasse as bases de mísseis na ilha com propósitos defensivos.

Fernandez disse que Cuba assumiu o risco de se defender da ameaça de invasão dos Estados Unidos para derrubar a revolução de Castro, que completava três anos.

Em abril de 1961, os Estados Unidos apoiaram e treinaram exilados cubanos, que tentaram uma invasão que fracassou e se tornou um fiasco para Kennedy.

"Instalar os mísseis criou uma intimidação que contribuiu para dissuadir qualquer tentativa de atacar Cuba", declarou.

Castro mandou o líder revolucionário Che Guevara para tentar convencer Moscou a se pronunciar publicamente sobre o envio de mísseis, e a prova norte-americana de que os soviéticos estavam mentindo para o mundo enfraqueceu o poder de Khrushchev, afirmou Fernandez.

Segundo Kornbluh, os cubanos ficaram furiosos quando deixaram as negociações e não conseguiram nada além de uma garantia verbal de que os Estados Unidos nunca invadiriam Cuba, que havia se recusado a permitir a inspeção internacional da retirada dos mísseis.

A CIA pressionou Kennedy a não assinar a promessa porque a agência queria continuar com seus esforços para depor Castro, disse.

Os norte-americanos viveram a crise com medo que os mísseis soviéticos fossem disparados de tão perto. Já os cubanos relembram que a ameaça de uma invasão dos Estados Unidos mobilizou milhares de pessoas na ilha.

"Eles estavam bem na nossa costa, tão perto que suas bitucas de cigarro e latas de refrigerante vazias flutuavam para a praia", observou um jornalista que liderou um pelotão que se posicionou em trincheiras nas praias ao leste de Havana.

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