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Educação
24/06/2005

Melhorar a base do aprendizado para avançar com qualidade

ERNANE GUIMARÃES NETO
Da equipe de trainees

Maíra Soares/Equipe de trainees
Alunos fazem tarefa em sala de aula da Escola Estadual Demóstenes Marques, em Heliópolis, na capital paulista
Alunos fazem tarefa em sala de aula da Escola Estadual Demóstenes Marques, em Heliópolis, na capital paulista
Sem ensino fundamental eficiente, o ensino médio torna-se um problema. Os especialistas ouvidos pela Folha dão razões históricas, pedagógicas, financeiras e sociais para defender esse argumento. Se o aluno chega defasado ao nível médio, o curso pode ser insuficiente para recuperá-lo; se a classe chega defasada, o próprio nível médio fica em risco.

Eglê Malheiros, 77, lecionou história por 37 anos na rede pública: "Fui posta em disponibilidade entre 64 e 79. Levei um choque quando retomei e fui dar aulas para o 2º grau. Procurei saber o que estavam estudando, para aplicar um exame. Fiz uma prova que daria para o 1º grau. O diretor falou: ‘Muda, senão vai todo mundo tirar zero’. Os alunos não sabiam nem ler nem escrever. A justificativa é que estavam tentando fazer uma educação de massa. Como se educação de massa e de qualidade fossem opostos".

Para João Batista Oliveira, que concebeu o Se Liga --programa do Instituto Ayrton Senna para alfabetização--, a situação é conseqüência da ampliação da oferta de ensino sem universalização da qualidade das escolas. "Ainda não havia sido universalizado o ensino em quatro séries e passamos para oito, por volta de 1970. Mal passamos para oito, com muita repetência, e querem passar para 11, universidade para todos e universalizar pré-escola. Há uma cultura inflacionada."

Oliveira cita países desenvolvidos como exemplo a seguir. "Alemanha, França e Inglaterra ficaram até as décadas de 40 e 50 consolidando o ensino primário e passaram os anos 50 e 60 universalizando o ensino médio."

A importância que o mundo desenvolvido dá ao ensino básico pode ser vista nos dados da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico). A organização avalia sistemas de ensino em países do mundo todo. O último relatório foi feito em 2003, com alunos de 15 anos. Na habilidade "leitura", o Brasil ficou em 37º lugar, de 40 países. A Finlândia teve as melhores notas nas duas últimas avaliações.

A comparação de gastos em nível fundamental e em nível superior deixa mais clara a prioridade de cada país. O Brasil gasta anualmente US$ 832 por aluno de 1ª a 4ª série e a Finlândia despende US$ 4.708 (dados de 2001, convertidos por paridade de poder de compra). No ensino superior, o Brasil gasta US$ 10.306 por aluno, contra US$ 11.143 da Finlândia. A França, 17ª no mesmo ranking de leitura, gasta US$ 4.777 com o correspondente às séries de 1ª a 4ª e, com o ensino superior, menos do que o Brasil: US$ 8.689.

A falta de qualidade nas séries iniciais é responsável por outros problemas da escola pública: repetência e abandono escolar. Em 2002, a taxa de abandono, nos níveis fundamental e médio, foi 9,88% (dados do MEC). Dos 39 milhões de matriculados, 3,86 milhões não terminaram. Em escolas particulares, o índice foi 1,03%.

A diretora da Faculdade de Educação da USP, Selma Garrido Pimenta, ressalta outra causa de abandono: "A própria condição econômica da família, porque muitas vezes a criança precisa começar a trabalhar". Em seguida, dá voz ao coro pela qualidade da base do ensino: "Outro fator é que a ampliação de quantidade de vagas não foi como deveria ter sido: com qualidade da educação".

O economista Gustavo Ioschpe, 28, autor de "A Ignorância Custa um Mundo", acrescenta: "As crianças não saem da escola porque não têm vaga ou porque não têm escola, mas porque a escola é ruim. A permanência de uma criança na escola é como uma luta constante da escola com o mercado de trabalho". Ele sugere um esforço por qualidade da alfabetização já na primeira série. Assim, a criança terá base boa para aprender, "porque ela precisa ler e escrever para poder aprender".
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