Jarbas Gonçalves Passarinho

11.jan.1920 -

 

Ministro do Trabalho


"Às favas, senhor presidente, neste momento, todos os escrúpulos de consciência." A frase, que foi modificada na ata sem prejuízo de sentido (as "favas" foram trocadas pela conjugação verbal "ignoro"), foi dita pelo então ministro do Trabalho e da Previdência Social Jarbas Passarinho durante a reunião do AI-5, em 1968.

 

Apesar de afirmar em entrevistas que, no papel de ministro, interferiu nos sindicatos apenas em questões de corrupção, no período de vigência do AI-5, mais de cem dirigentes sindicais foram destituídos dos cargos durante sua gestão.

 

Passarinho nasceu em Xapuri (AC) em 1920, participou da articulação do golpe de 64 e, no mesmo ano, assumiu o governo do Pará, indicado pelo presidente Castello Branco.

 

Com a posse de Emilio Garrastazú Medici, assumiu a pasta de Educação em 69. Passarinho, que entrou na Escola Militar do Realengo 30 anos antes, implantou sistema de créditos, ciclos básicos de disciplina e um novo regime de cátedras, na reforma universitária brasileira conhecida como MEC-Usaid, por causa do apoio do governo norte-americano.

 

Em 77, três anos após ter voltado ao Senado, defendeu na tribuna a substituição do AI-5 por um instrumento que garantisse ao Estado sua defesa contra minorias subversivas e a atribuição ao STM (Superior Tribunal Militar) de julgamentos políticos.

 

Em 80, Passarinho foi eleito presidente do Senado, casa que deixou três anos depois após perder a eleição no Pará para o candidato do MDB. No mesmo ano, assumiu o Ministério da Previdência e Assistência Social no governo de João Batista Figueiredo.

 

Foi senador constituinte, ministro da Justiça do governo de Fernando Collor de Mello (de 1990-1992) e presidente da CPI que investigou a "máfia do orçamento". Passarinho, que já havia sido cronista e redator em jornais na década de 40, deixou o Senado em 1995.

 

Tornou-se articulista do Estado de S. Paulo, onde criticava abertamente as ações do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra).

 

Continuou com as críticas mesmo depois de ter sido nomeado pelo ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso em 96 como consultor do Programa Nacional de Direitos Humanos.

 

Em manifestações recentes sobre o pagamento de indenizações relativas ao período militar, Passarinho, que hoje tem 88 anos, se posicionou publicamente contra o pagamento a perseguidos pelo regime.

 

Para ele, se fosse o feito o pagamento, que houvesse o mesmo tratamento com as famílias de militares mortos pelo movimento armado da esquerda.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Ouça o áudio

 

 

Senhor presidente, não, não entendi propriamente nas, nas sábias e judiciosas palavras do ilustre senhor vice-presidente da República uma discordância irremovível com a decisão a tomar de uma retomada da revolução. Parece-me até que sua excelência se referiu à institucionalização da revolução de março de 64, que não poderia agora abrigar um ato que na verdade representasse um retrocesso e a desfigurasse.

 

Mas Sua Excelência falou claramente também, na sua bela oração, na possibilidade da retomada da revolução. Ou, para desgraça do paralelo, para Regis Debray, que usou o título "A Revolução Dentro da Revolução". Parece que Sua Excelência sente igualmente, porque enfatizou esse fato, que nós estamos diante de uma contingência, de uma contingência imperativa. Necessidade, portanto, da retomada da revolução como contingência do momento histórico nacional. Por isso, suponho de muito... minha parte, senhor presidente, muito interessante que o conselho considere a possibilidade de compatibilizar as restrições, que ouvi e que me pareceram mais de forma de fazer, que oferece o senhor vice-presidente com seu pensamento, quando admite uma nova revolução para ir direto às origens da primeira.

 

Não se trata de vestir, talvez, uma roupa usada e sim de fazer um novo figurino. De minha parte, senhor presidente, quero, já que estamos em uma sessão histórica, quero me referir às vezes que ouvi de Vossa Excelência, não só coletivamente, como individualmente em despacho, palavras remarcadas de absoluta sinceridade, pois Vossa Excelência não estava, em nenhum momento, sendo menos sincero do que é agora, neste instante, quando Vossa Excelência, inclusive, aqui mesmo neste palácio, no dia do seu aniversário, chamou a atenção para o peso da responsabilidade da ditadura sobre os ombros dos homens, mesmo que fosse um triun... um triunvirato, que fosse um colegiado.

 

Sei que a Vossa Excelência repugna, como a mim, e creio que a todos os membros deste conselho, enveredar para o caminho da ditadura pura e simples, mas parece que claramente é esta que está diante de nós. Eu seria menos cauteloso do que o próprio ministro das Relações Exteriores, quando diz que não sabe se o que restou caracterizaria a nossa ordem jurídica como não sendo ditatorial, eu admitiria que ela é ditatorial.

 

Mas, às favas, senhor presidente, neste momento, todos, todos os escrúpulos de consciência.

 

E quando nós encontramos a necessidade de tomar uma decisão fundamental, tudo aquilo que fundamental é em condições normais, passa a ser secundário em condições anormais. Eu creio que nós estamos aqui pagando uma penitência, que foi a penitência do auto... da autolimitação, com o açodamento que a revolução de março de 1964 se impôs. O meu caso, no Pará, como governador de um Estado que surgiu com a revolução (e não me parece que aqui houvesse um caso similar, pois que eu saí do quartel direto para o cumprimento dessas obrigações) é muito ilustrativo, mas não vou me demorar na sua análise.

 

Claro que, num determinado aspecto do que aqui se contém neste ato, esta questão me feriria mais de perto como, por exemplo, o do enriquecimento ilícito e o ônus de prova que coube a um governador revolucionário de provar que um governador que utilizava dinheiro do jogo do bicho e utilizava negócios escusos de marcações mentirosas, do... de movimento de terras do Departamento de Estradas de Rodagem, repito, coube a mim o ônus de provar isso, que não tinha mais capacidade de provar.

 

Vejo, com uma certa alegria, que aqui se fala na possibilidade de confiscar os bens daqueles que enriqueceram ilicitamente. E me parece que se deveria, neste ponto, repetir a revolução de 1930, quando deu a esses homens o ônus de provar que os bens lhe pertenciam de direito. Sei bem, como sabem os homens de artilharia que há dois limites, sobretudo, a que os canhões se submetem: um que eles resistem bem, que é o da elasticidade; e o outro, que não podem mais resistir quando atingem, que é o limite da rutura.

 

Tenho a impressão, senhor presidente, que Vossa Excelência chegou ao limite de rutura e este governo também. Não me importa que neste instante a democracia seja definida apenas pelo texto de uma Constituição. O que me importa é que tenhamos a coragem histórica de retomar o processo, sabendo o ônus que vamos carregar e que principalmente Vossa Excelência carregará, para que tenhamos a possibilidade de corrigir os erros que nós antes cometemos e que tenhamos a coragem, maior ainda, de tirar lições desses erros, não deixando que, no momento em que vossa excelência tem a nação à sua mercê e deste governo, estes erros sejam confundidos e pretextos menos nobres sejam utilizados.

 

Com toda a minha vocação libertária e não liberticida, eu acho também, que, cumprindo um dever para comigo, um dever para com meu país eu aceito uma nova revolução.

 

 

 

 

 

 

 

O ministro do Trabalho, Jarbas Passarinho, aproveitou a reunião do AI-5 para usar frases de efeito que parecia guardar para uma ocasião especial.

 

Passarinho mandou "às favas todos os escrúpulos de consciência", comparou a "revolução dentro da revolução" a um novo figurino e disse acreditar ter chegado o momento de realizar a ruptura com "coragem histórica", mesmo sabendo do ônus que iria carregar.

 

Durante sua fala, ele ainda tentou abrandar a o discurso aparentemente opositor do vice-presidente Pedro Aleixo e usou as palavras de Magalhães Pinto, ministro das Relações Exteriores, como escada para afirmar que "seria menos cauteloso" ao assumir o caráter ditatorial do governo.