São Paulo, sábado, 13 de outubro de 2001
 

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Cassetete de policiais faz discriminação

DA EQUIPE DE TRAINEES

A razão da violência policial ser maior com negros do que com brancos tem origem há quase dois séculos, na visão do delegado aposentado e ex-chefe de Polícia Civil do Rio de Janeiro, deputado estadual Hélio Luz (PT-RJ), 56.
No dia 10 de maio de 1808, um alvará de D. João 6º criou a Intendência Geral de Polícia -ancestral da Polícia Civil- como uma força voltada para o Estado, de forma a protegê-lo. Oitenta anos e três dias depois, foi assinada a abolição da escravatura. O foco da polícia, porém, não mudou. O negro, antes escravo, continuava suspeito a priori.
Segundo pesquisa do Iser (Instituto Superior de Estudos da Religião) de 1999, em confrontos com a polícia os negros e pardos (70,2%) morrem mais que os brancos (29,8%). No período pesquisado (1993 a 1996), os negros representavam 8,4% e os pardos 31,6% da população. Os brancos correspondiam a 60% dos moradores das cidades de Rio de Janeiro e São Paulo, alvos do estudo.
"A função básica desse aparelho [polícia" era controlar o escravo urbano e proteger o rei e a corte. Ela faz isso até hoje: o escravo urbano se chama favelado, excluído; o rei e a corte se chamam presidente, governador, prefeito e elites", afirma o deputado petista.
Para o antropólogo Luis Eduardo Soares, 47, consultor da Prefeitura de Porto Alegre e ex-subsecretário de segurança pública do Rio de Janeiro, a "luta contra o racismo é uma luta contra a polícia corrupta e violenta".
"A transformação da instituição policial, no sentido da psicologia individual vai exigir uma geração de qualificação de formação que não vai se dar independentemente das mudanças na sociedade brasileira", diz, ressaltando que somente no eixo Rio-São Paulo o contingente das polícias é de quase 150 mil pessoas.
O consultor insiste que a violência policial contra o negro pode ser interrompida rapidamente, pois seria uma mudança de comportamento. "Independente da cabeça truculenta, podemos frear a violência", afirma.
Segundo o coronel reformado da PM de São Paulo José Vicente, pesquisador do Instituto Ferdinand Braudel, a violência policial deve ser freada como um todo.
E isso deveria ser feito através de "procedimentos relativos ao uso adequado, moderado da força".
Dados de pesquisa Datafolha de 1997 revelam que 38% das pessoas revistadas pela polícia foram ofendidas e 19%, agredidas fisicamente. Outro ponto ressaltado por Vicente é tornar a polícia mais técnica e profissional.
Os três especialistas convergem na solução do problema: "É necessário haver muita pressão da opinião pública", diz Vicente. "Para mudar esse quadro, devemos democratizar o Estado brasileiro, ou seja, fazer com que ele se volte exclusivamente para a população como um todo", acrescenta Hélio Luz.
"Se [essas mudanças" estão postas na agenda política como prioridade, temos grandes chances de alterar o comportamento", completa Luis Eduardo. (ID)


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