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Novo em Folha 40ª turma
14/02/2006

Entrevista: Nicolao Dino de Castro e Costa Neto, presidente da Associação Nacional os Procuradores da República

DA EQUIPE DE TREINAMENTO

Principais trechos da entrevista com o presidente da Associação Nacional os Procuradores da República, Nicolao Dino de Castro e Costa Neto.

Folha - O presidente da Federação Nacional dos Delegados da Polícia Federal, Armando Rodrigues Coelho Neto, afirma que as operações da Polícia Federal cresceram, mas nem tanto. O que houve, no entender dele, é que a Polícia Federal passou a receber o reconhecimento pelas ações, o que segundo ele, deu maior visibilidade à instituição. Ele diz que se trata de uma nova estratégia da corporação para reaver o crédito de ações que antes eram atribuídas ora ao Ministério Público Federal, ora a algum político integrante de uma CPI [Comissão Parlamentar de Inquérito]. Qual é a sua avaliação sobre essa afirmação?

Nicolao Dino de Castro e Costa Neto - A Associação [Nacional os Procuradores da República] não está preocupada com créditos. Estamos preocupados com resultados. Ficamos muito satisfeitos com os resultados positivos do trabalho da Polícia Federal. Isso é importante para toda operação conjunta, para um conjunto de esforços no combate à criminalidade, sobretudo ao crime organizado e do colarinho branco. Nós não entramos nesse debate sobre créditos. Não há essa preocupação no que se refere a angariar os eventuais louros por resultados, que são do Poder Público, pertencem à sociedade civil. Estamos mais interessados na efetividade desse esforço conjunto. Que bom que existem resultados positivos satisfatórios. Isso é sinal que o Poder Público como um todo está trabalhando em benefício da sociedade.

Folha - Como está o trabalho conjunto entre a Polícia Federal e o Ministério Público Federal?

Costa Neto - Ao longo de dois anos nós temos dito isso: o importante para a sociedade brasileira é que as instituições trabalhem de forma conjugada, compartilhada, não apenas Ministério Público e Polícia Federal, mas os órgãos do Poder Executivo, como a CGU [Controladoria Geral da União], a Receita Federal, o Banco Central, enfim, todo o Poder Público concatenado com o objetivo único que é o de combate ao crime organizado. O objetivo é um só. Não há um porquê de haver um trabalho isolado.

Folha - Como o senhor avalia o trabalho de investigação da Polícia Federal realizado nas operações?

Costa Neto - As operações devem ser avaliadas caso a caso. Há situações cujo conjunto probatório que vem para análise de formação de convencimento do procurador é suficiente, é bom. Porém há situações em algum ponto do país em que, em função, por exemplo, de um retardamento, de uma demora longa na tramitação de um inquérito policial com um, três, cinco anos, haverá casos que essa produção de provas deixa a desejar. Não dá para comentar de forma absoluta, nem para o bem, nem para o mal.

Folha - Entre 2003 e 2005 o senhor notou que houve uma melhor qualificação dessas provas com os investimentos realizados pelo governo federal, ou não?

Costa Neto - Eu acredito que houve uma melhora sim. Particularmente, nós pudemos observar nesses dois últimos anos uma atuação de um órgão novo, que foi a Controladoria Geral da União, com o papel que vem sendo desempenhado no contexto da regularidade da aplicação dos recursos públicos. Tem havido sim uma preocupação mais efetiva do governo federal nesse campo.

Folha - É possível, então, afirmar que o trabalho da Polícia Federal está sendo satisfatório para o Ministério Público?

Costa Neto - Eu não tenho elementos para lhe dar essa informação com segurança porque sou um procurador afastado do exercício da função por conta de um mandato classista. Então, essa é uma avaliação que depende de inúmeros fatores que estão ligados à atuação do Ministério Público em todo o país.

Folha - Uma outra explicação dada para o sucesso das operações da Polícia Federal é que a instituição passou a priorizar a investigação científica. Integrantes da corporação dizem que estão tendo mais paciência para produção de provas e com isso chegam a resultados mais satisfatórios. Como o Ministério Público trabalha com essas informações da corporação e com o enfoque da polícia na prova material?

Costa Neto - É importante que haja realmente esse cuidado no levantamento do material de provas porque hoje a criminalidade está muito sofisticada no que se refere ao modo de como opera. Há crimes de natureza transnacional, crimes que são realizados em um Estado e com repercussão em outras unidades da União, crimes praticados em nosso território com reflexo em outros países, fraudes de extrema complexidade que exigem por parte daquele que investiga um maior aprofundamento no conhecimento e instrumental a serem realizados. A formação científica, portanto, tem de crescer na exata proporção que o crime organizado fica mais complexo. Certamente é positivo que a polícia invista nesse tipo de especialização. A área de perícia para a parte científica da polícia tem de se aprimorar, com certeza, porque só assim nós teremos condições de estabelecer uma paridade ao que se refere à forma com que o crime tem se organizado e tem assumido proporções complexas.

Folha - Críticos do trabalho da Polícia Federal dizem que a instituição está utilizando mais escutas telefônicas -claro, dentro da lei- e que isso seria uma espécie de sintoma do sucateamento do órgão. Agentes da corporação negam que haja sucateamento, afirmando que a prática está dentro do contexto de busca de provas materiais. Qual é a sua avaliação sobre essa questão?

Costa Neto - É um meio de prova legalmente previsto na Constituição. Existem determinadas infrações que assumem uma complexidade tal que só é possível desvendá-las com efetividade a partir da utilização de novos mecanismos de obtenção de provas, entre os quais se inclui a interceptação telefônica. É um instrumento de investigação contemporâneo. Estamos no século 21 e, claro, que os órgãos de investigação têm de se valer do conhecimento tecnológico disponível para o desempenho das suas atividades. É perfeitamente normal e compreensivo o uso de instrumentos de investigação como a interceptação telefônica, à medida que ela seja necessária, e, evidentemente, atendendo às balizas fixadas, ou seja, interceptações com base em autorizações judiciais. Essa é a normalidade dos fatos. As interceptações que têm sido feitas pela polícia e que são destinadas ao Ministério Público para fins de promoção de ação penal são todas interceptações que atendem perfeitamente às exigências legais. Não há nisso nenhum tipo de impasse, de embaraço, pelo contrário, é necessário e desejável que cada vez mais esses meios de investigação se aprimorem para que possamos desvendar esses crimes mais complexos com maior grau de êxito.

Folha - Quando o inquérito produzido pela Polícia Federal chega ao Ministério Público, quais são os prazos do Ministério Público Federal para dar continuidade a esse trabalho?

Costa Neto - Temos no Brasil um problema sério que é do modelo investigatório. Aí a gente já está falando em modelos e não do funcionamento direto das instituições. O modelo investigatório no nosso país está necessitando de uma reformulação. Tanto é que existem projetos de lei tramitando no Congresso Nacional visando exatamente isso: a modernização do nosso sistema de investigação porque ele remonta a 1941. Nós estamos, portanto, com praticamente mais de 60 anos de um modelo de investigação que está em descompasso com os avanços tecnológicos que também foram verificados na própria forma de agir do mundo do crime organizado. O nosso modelo de investigação é praticamente, eu diria, esquizofrênico porque ele pressupõe uma investigação feita pela polícia num inquérito policial. Depois o resultado da investigação vai ao Ministério Público que, convencido da existência do crime e da autoria, apresenta uma ação penal ao juiz e na fase judicial toda aquela prova que foi produzida terá de ser repetida sob o crivo do contraditório e da ampla defesa. Há, às vezes, uma repetição de procedimentos. Na maioria dos casos há uma repetição de momentos de produção de provas e isso demanda tempo. E o tempo nesse caso milita em favor do infrator. Quanto mais demorados forem uma investigação e uma instrução processual, mais rapidamente ocorrerá prescrição do crime. Então, nós temos de mudar o nosso modelo de investigação para tornar a atuação da polícia na fase investigatória mais simplificada, como ocorre, por exemplo, no modelo norte-americano, em que há uma investigação feita de forma sumária por meio de investigadores e policiais que colhem dados, apresentam relatórios e aquilo vai para o promotor, que, dirigindo a investigação, obtém a prova necessária para apresentação ao juiz. No Brasil não é assim. Há uma longa tramitação do procedimento pré-processual, que é o inquérito policial, e depois uma longa tramitação numa fase judicial, ou seja, há uma repetição de fases.

Folha - E isso é o que o senhor acha que deve ser modificado?

Costa Neto - Isso tem de ser modificado, racionalizado porque se ganha tempo. E tempo nesse caso é o último sentido da efetividade do processo penal. Então, qual é a idéia que norteia os projetos de modernização do processo penal brasileiro? Simplificar a investigação, esse momento do inquérito policial, torná-lo mais ágil, com a participação mais direta do destinatário dessa prova, que é o Ministério Público, e depois iniciar a fase
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