Treinamento Folha   Folha Online
   
Novo em Folha 42ª turma
28/06/2007

Nova aduana estrangula comércio de "sacoleiros"

SILAS MARTÍ
WILLIAN VIEIRA
da EQUIPE DE TREINAMENTO

Aperto da fiscalização na ponte da Amizade provoca desemprego, aumenta criminalidade e alimenta crise diplomática entre Brasil e Paraguai; políticos das cidades afetadas nos dois lados se articulam para pressionar Mercosul

Willian Vieira/Folha Imagem
Mototáxi traz passageiro para o lado brasileiro; ao fundo, motoqueiros aguardam clientes em fila para atravessar ponte
Mototáxi traz passageiro para o lado brasileiro; ao fundo, motoqueiros aguardam clientes em fila para atravessar ponte

Não há mais lâmpadas no teto de um dos guarda-volumes no lado brasileiro da ponte da Amizade. Não fazem falta. Os galpões de concreto e madeira não funcionam mais à noite e as prateleiras aguardam vazias os "sacoleiros" que não vêm mais.

A construção de uma nova aduana no fim do ano passado e o aperto da fiscalização na ponte estrangularam o comércio na fronteira mais movimentada do Brasil, secando a fonte de renda de pelo menos 45 mil pessoas. Elas passaram a buscar alternativas _dentro ou fora do contrabando.

Quase não há estatísticas, já que a maior parte do comércio afetado é informal e órgãos oficiais não têm dados. Mas a crise levou políticos de cidades nos dois lados da fronteira a criar uma espécie de "mini-Mercosul" para exigir uma solução dos governos federais.

O problema não aparece em gráficos, mas é visível nas ruas. No lado brasileiro, mais de cem mototáxis aguardam passageiros. Acabaram os congestionamentos de até três horas na ponte, que já foi símbolo do comércio binacional. No lado paraguaio, caiu 60% o movimento das lojas e 5.000 delas fecharam desde 2002, segundo autoridades locais.

A maior loja de computadores da cidade demitiu metade dos funcionários. Estavam vazias na hora do almoço numa sexta-feira as 200 mesas da praça de alimentação do Shopping Vendôme, onde o movimento caiu cerca de 80%. "Se o brasileiro não comprar mais aqui, não tem jeito", diz a dona de restaurante Oralina da Silva, uma dos 8.000 brasileiros que trabalham em Ciudad del Este, segundo associações locais.

Em Foz, a Câmara Municipal estima uma perda de R$ 18 milhões ao mês no comércio na ponte. Perderam clientes os hotéis e pousadas dos "sacoleiros". Na entrada do Québec, ainda se ouve o barulho de fita crepe embalando as caixas, mas o movimento caiu. Três dos 20 quartos estavam vagos e o pátio usado como armazém, vazio. "Antes tinha até fila pra entrar", lembra Dora, caixa da padaria em frente à pousada.

Até 2005, apenas 5% dos que passavam pela ponte eram fiscalizados, alimentando comboios de até 300 ônibus com mercadorias, que ultrapassavam de longe a cota máxima de US$ 300 por pessoa. Com a nova aduana, passaram a fiscalizar 100% do fluxo. Nenhum ônibus foi apreendido na ponte em cinco meses.

"Atravessadores"
Novas rotas, porém, surgiram para contornar a aduana, especialmente pelo rio Paraná. No mês passado, 81% das apreensões aconteceram fora da ponte, grande parte no rio _alimentando um mercado de "atravessadores", contratados pelas galerias de Ciudad del Este para entregar o produto no Brasil. "Por 5% do valor a gente passa um computador", diz um motoqueiro. Segundo a Receita, 70 veículos foram apreendidos em maio na ponte, a maioria táxis e mototáxis.

Quando o carregamento é maior, o contrabando é feito por barcos. "Dia de chuva é mais fácil", conta uma vendedora que traz mil jaquetas por viagem. "A gente volta com lama até as coxas".

Problemas na fiscalização

Silas Martí/Folha Imagem
Vista atual da ponte da Amizade, com movimento fraco em horário de pico; engarrafamento caiu de até 5 horas para 20 minutos
Vista atual da ponte da Amizade, com movimento fraco em horário de pico; engarrafamento caiu de até 5 horas para 20 minutos

"Fiscalização no rio mesmo quase não há. Não há pessoal suficiente", diz o delegado da Receita em Foz, Gilberto Tragancin. "Se tivesse policiamento, com certeza se estrangularia o problema."

O efetivo dobrou em três anos, mas as prioridades são outras. "Nosso foco é inteligência. Não corro atrás de Monza cheio de cigarro", explica o delegado da Polícia Federal em Foz, Alessandro de Mattos.

Com a ponte fechada para o contrabando, ganham força o tráfico de drogas e os acertos de contas. Segundo estudo da prefeitura, a cidade atingirá esse ano a taxa de 1 homicídio por 1.000 habitantes _média quatro vezes maior que a nacional.

Tráfico e violência marcam a família de Solange. Sua irmã Elza foi presa atravessando a fronteira com maconha. Deixou cinco filhos, mantidos com os R$ 75 que recebe do Bolsa Família. "Se eu tivesse força traficava também. Não dá para ver criança passar fome."

Segundo o Ministério do Desenvolvimento Social, o número de cadastrados no programa em Foz aumentou 55% _15% acima da média nacional.

BLOG

BATE-PAPO PRÊMIOS ESPECIAL
Patrocínio

Content on this page requires a newer version of Adobe Flash Player.

Get Adobe Flash player


Philip Morris
AMBEV


Copyright Folha de S. Paulo. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress (pesquisa@folhapress.com.br).