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26/07/2005 - 20h26

Turista gay em São Paulo tem de visitar a rua Frei Caneca

da Folha de S. Paulo

O corretor de imóveis J.C.S. descobriu que a velocidade das vendas de um prédio na rua Frei Caneca, na região central de São Paulo, duplicava quando fazia propaganda não em supermercados e academias de ginástica, como sempre fez, mas em bares, boates e saunas gays.

O sucesso da estratégia do corretor tem uma razão simples: a região da Frei Caneca converteu-se numa área GLS (iniciais de gay, lésbica e simpatizantes), cujo epicentro é o shopping homônimo e se estende até a avenida Paulista e parte dos Jardins. Na subcultura GLS, em que tudo e todos têm apelido, o shopping virou "Gay" Caneca ou Frei "Boneca".

Mais do que ponto de encontro, o shopping impulsionou um "boom" imobiliário na região: depois que foi anunciada a sua construção, no início do ano 2000, foram lançados mais de 40 projetos imobiliários num raio de até dez minutos a pé em torno do centro comercial. Desses, só cinco não estão prontos, segundo pesquisa da administração do shopping.

"A gente não tem preconceito, mas eu nunca tinha visto uma clientela como essa: mais da metade dos compradores são gays ou travestis", diz outro corretor. Outros quatro corretores entrevistados têm uma estimativa parecida, de que cerca da metade dos novos moradores são GLS.

Mais liberdade

Não é novidade que shoppings quase sempre provocam uma explosão imobiliária. Também não há nada de novo no fato de gays morarem no centro de São Paulo --isso ocorre pelo menos desde o final do século 19, segundo o historiador americano James Green, autor do livro "Além do Carnaval", sobre a história da homossexualidade masculina no Brasil.

Àquela época, eles frequentavam a região do vale do Anhangabaú; depois, foram migrando para a praça da República e para a Vieira de Carvalho, onde vivem até hoje.

A psicóloga Adriana Nunan, que estuda preconceito contra gays, diz que é comum que pessoas com o mesmo estigma se juntem para viverem longe dos preconceitos mais comezinhos. Foi o que ocorreu no Village, em Nova York, em bairros de San Francisco ou em parte de Ipanema, no Rio.

"O positivo desses lugares é que eles significam mais liberdade. Ali, eles fazem coisas que não fariam em outra parte da cidade", diz.

O que está ocorrendo na Frei Caneca é um fenômeno duplo: 1) como há muitos gays, há mais aceitação de comportamentos que não são aceitos por todos, como dois homens andando de mãos dadas; 2) com a construção de prédios mais caros e a vinda de moradores com um pouco mais de dinheiro, o perfil da região está mudando.

A Frei Caneca, paralela à rua Augusta, é um corredor de ligação entre uma área mais degradada, próxima ao centro, e a avenida Paulista. A porção mais pobre é ocupada há duas décadas, pelo menos, por travestis, prostitutas e gays --é o lado mais selvagem da rua. A inauguração do shopping, em maio de 2001, trouxe uma população diferente para a área.

Mais dinheiro

"A Frei Caneca mudou", diz Celina Oliver, "a miss São Paulo" dos travestis, como ela anuncia. "Agora, só vem bicha rica para cá."

Os lançamentos imobiliários justificam a impressão de Celina: apartamentos com um dormitório na região custam cerca de R$ 100 mil; os de dois, chegam a R$ 150 mil. Os gays que compram são de classe média, segundo os corretores.

O perfil dos frequentadores do shopping confirma a impressão de mudança. Eles têm idade média de 32 anos e renda familiar de R$ 4.900 (a média na cidade é de R$ 1.900); 65% têm curso superior, 60% têm computador em casa e 36% são solteiros.

O perfil do shopping ajuda a explicar a escolha dessa tribo. O Frei Caneca tem umas das melhores salas de cinema de São Paulo, exposições de fotos e uma escola de teatro, entre outras atrações culturais.

Piscina

Em que lugar um travesti pode tomar banho de sol na piscina do prédio sem ser importunado?, pergunta Celina Oliver. "Só na Frei Caneca", ela responde. Em que lugar um travesti pode andar de mãos dadas com seu marido e ninguém fica olhando?, ela quer saber. "Só no shopping Frei Caneca."

É por isso que Oliver diz que só troca a rua Frei Caneca pela Itália, um paraíso para os travestis brasileiros não exatamente pela falta de preconceito, mas pela possibilidade de juntar dinheiro rápido. "Só saio daqui para ir para a Itália", avisa.

Os travestis bem-sucedidos na Itália, na Espanha ou na França são quase que uma lenda na rua. Um corretor disse ter vendido 20 apartamentos num prédio de 174 para travestis que fizeram dinheiro na Europa.

Elas formam uma espécie de casta superior. Moram nos prédios mais novos, andam com carros do ano e passam seis meses na Europa. Nesta época do ano, é inútil procurá-las na Frei Caneca. "Estão todas na Itália. Elas ganham muito mais no verão de lá", conta Fabíola Mebarak.

A Frei Caneca, segundo Oliver, virou também o endereço dos gays e travestis que se deram bem no mercado de sexo. Ela, por exemplo, diz faturar de R$ 4.000 a R$ 5.000 mensais.

O tipo de discriminação na região é diferente, diz Oliver: "O problema é gay discriminando travesti e sapatão discriminando gay." Tem até cabeleireiro gay que não aceita travesti como cliente.

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