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Prédios cansam do progresso e fogem da civilização em novo livro

'O Dia em que Meu Prédio Deu no Pé' mostra mundo com valores diferentes

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São Paulo

Quando fez livros para adultos, Estevão Azevedo falou de pedras, mulheres e de outros escritores como ele. Agora que ele decidiu que era hora de criar uma história para crianças, o tema definido foi “prédios”. Acontece que os prédios de Estevão não são daquele tipo comum, com andares e janelas, sempre parados na mesma rua —esses prédios aqui são móveis e cheios de vontades.

Estevão confessa que não teve essa ideia maluca sozinho. Ele contou com a ajuda de Iolanda, sua filha de seis anos. Uma noite, quando estava se preparando para dormir, ela começou a tagarelar na cama, morrendo de sono, e de repente disse: “Papai, os prédios fugiram do Brasil!”.

Como todo bom contador de histórias, Estevão percebeu que, embora fosse uma sugestão de uma pequena dorminhoca, aquela imagem era muito boa e podia virar um livro. Nasceu, assim, “O Dia em que Meu Prédio Deu no Pé”, que a editora Companhia das Letrinhas acaba de lançar.

As pessoas da história só se dão conta do problema quando somem os edifícios mais ricos - Divulgação

Na cabeça de Estevão, os prédios fujões vão embora do país um por um até não restar mais nada de pé. “Em vez de ser como hoje, que as pessoas dizem que vão para Miami, Lisboa dizendo que desistiram do Brasil, aqui é o progresso que desiste das pessoas”, conta.

“É como se a civilização desistisse de nós. Porque, no fundo, quem transforma o mundo em algo difícil somos nós”, explica o autor.

Estevão diz que, no livro e na vida, prédios simbolizam o progresso. “Mas é um progresso que trouxe coisas ruins, como a escalada da violência e a falta de justiça. Os prédios viraram símbolo de coisas que o progresso não consegui garantir”, completa.

Para ele, a humanidade avançou muito na tecnologia e no seu modo de viver, mas esqueceu que a natureza provê e ensina tudo que precisamos saber. “A tecnologia não traz alegria e felicidade. Esquecemos como viver em comunidade. Aqui, é como se a gente pudesse começar tudo de novo sabendo o que deu errado e reconstruindo.”

Depois que os prédios do livro vão embora, o mundo se torna um lugar melhor. Mas as pessoas só se dão conta de que toda essa revolução está acontecendo quando somem os edifícios mais ricos. Por que será?

“A mensagem é de que quase sempre as populações ficam invisíveis se são de uma classe social mais baixa. Parece que o que acontece com elas tem menos importância, mas são vidas como quaisquer outras. Na hora que atinge os ricos, aí todo mundo começa a se importar.”

Quem dá forma e cores à ideia é Rômolo D’Hipólito. Quando começou a pensar nas ilustrações que faria para “O Dia em que Meu Prédio Deu no Pé”, ele estava hospedado em São Paulo, “essa cidade cheia de prédios”, como ele define.

“Após ler o texto, saí para a varanda e fiquei por um tempo observando um a um com uma certa curiosidade. Eu me perguntava: ‘Se eles pudessem fazer as malas e partir, para onde cada um deles iria?’. Aquele pequenino prédio de azulejos azuis de três andares espremido no meio dos outros, será que se mudaria para um lugar onde pudesse contemplar o horizonte?”, lembra Rômolo.

O ilustrador mora em Curitiba, no Paraná, e descreve seu bairro: “Um lugar onde prédios baixinhos e casinhas antigas convivem entre si. De vez em quando aparece um prédio alto e novinho pra se juntar ao grupo”.

Entre os prédios fujões do livro estão o Museu Nacional, o Teatro Amazonas e a Igreja do Bonfim, da Bahia. Também vão embora o Palácio do Planalto, o Congresso Nacional e a Catedral de Brasília, todos eles construções ligadas à política brasileira —por isso, Estevão chama estes três de “elefantes brancos”, expressão usada para falar de algo que custou muito dinheiro, mas não tem utilidade.

O livro traz uma surpresa no final, quando o leitor descobre o verdadeiro tempo em que a história sem prédios se passa. Mas, o que já dá para adiantar é que os humanos, ao se verem sem estes símbolos do progresso, acabam se conectando com outras coisas e valores.

O ilustrador Rômolo resume com um sentimento seu uma das mensagens que o livro deixa. “Acredito, sim, em uma sociedade mais justa onde todos os prédios saibam coexistir, independente de suas diferenças. E que nenhum prédio se sinta vazio ao ponto de querer ir embora.”

O Dia em que Meu Prédio Deu no Pé

  • Preço R$ 49,90 (40 páginas)
  • Autor Estevão Azevedo e Rômolo D’Hipólito
  • Editora Companhia das Letrinhas

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